
Da proteção de um dos ativos climáticos mais importantes do planeta, a Amazônia, à construção de seu mercado regulado de carbono, o Brasil está moldando como será a próxima fase da liderança climática global.
O país já é um dos maiores fornecedores de créditos de carbono do mercado voluntário global e agora se posiciona para usar seu novo Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) como impulsionador da descarbonização de setores-chave da economia – ao mesmo tempo canalizando financiamento para soluções climáticas baseadas na natureza.
O potencial de impacto é enorme, visto que mais de 75% das emissões brasileiras se concentram em poucos setores: uso da terra, agricultura e indústria. O SBCE atuará regulando diretamente as emissões industriais, mas também permitirá o uso de créditos de carbono de metodologias certificadas para compensar as emissões restantes.
Por meio dessas metodologias, o Brasil já explora sua maior oportunidade de mitigação climática: os ecossistemas naturais, com destaque para suas florestas. Uma das formas mais eficazes de manter as florestas em pé são os projetos de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal).
No Brasil e no mundo, as florestas sofrem pressão constante de atividades como desmatamento ilegal, mineração, avanço da fronteira agrícola e expansão de infraestrutura — atividades que frequentemente prometem lucros imediatos superiores à conservação. O REDD, no entanto, inverte essa lógica econômica: em vez de o desmatamento ser a opção mais rentável, ele atribui valor financeiro à floresta preservada.
Hoje, existem 120 projetos REDD+ certificados pela Verra sob seu programa Verified Carbon Standards (VCS). Um em cada cinco deles está localizado no Brasil. Os projetos brasileiros são pioneiros na implementação das mais avançadas metodologias de REDD+, incluindo a nova VM0048, da Verra.
Essa nova abordagem substitui as linhas de base estabelecidas projeto a projeto por um mapeamento do risco de desmatamento em escala jurisdicional, realizado em colaboração com provedores de dados independentes.
Trata-se de um processo altamente técnico, mas necessário.
Ele combina dados históricos de desmatamento da última década com mapas de cobertura florestal, preditores espaciais e modelagem avançada para projetar o risco de desmatamento nos próximos seis anos.
Com base nisso, são criados mapas que alocam o risco em toda a paisagem, indicando os locais mais ameaçados. Os desenvolvedores de projetos usam essas informações para estabelecer linhas de base críveis e calcular as emissões evitadas por meio das atividades de conservação.
O Brasil é um dos primeiros países a ter acesso a esses novos dados. Mapas de risco finais já estão disponíveis para os Estados do Pará e do Mato Grosso, e Amazonas, Rondônia e Acre contam com versões provisórias.
Além da liderança em REDD, o país tem a oportunidade de implementar práticas agrícolas mais eficientes e sustentáveis em milhões de hectares de áreas degradadas. Isso pode ser feito por meio de projetos de Florestamento, Reflorestamento e Revegetação (ARR) e de Manejo de Terras Agrícolas (ALM).
Projetos ARR são ideais para áreas desmatadas que não se regeneraram naturalmente nos últimos dez anos — um cenário que, segundo o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), corresponde a 12 milhões de hectares no Brasil.
O setor agrícola, voz ativa no debate sobre o sistema de emissões, tem grande potencial para gerar créditos de carbono. Metodologias modernas de manejo de terras agrícolas são ferramentas essenciais para viabilizar essa participação, especialmente com o amadurecimento do mercado regulado no país.
Finalmente, para além do foco no uso da terra, o Brasil possui um vasto potencial inexplorado em energias renováveis. Após consultas públicas sobre o tema, stakeholders brasileiros demonstraram claro interesse em adotar metodologias que permitam o desenvolvimento de mais projetos de energia renovável conectada à rede, visando expandir a geração de eletricidade limpa no país.
Todos esses pontos convergem para um objetivo claro: fazer dos projetos de carbono no Brasil uma ferramenta central no combate às mudanças climáticas. Se o país conseguir integrar um sistema de comércio de emissões (ETS) de alta integridade com projetos cientificamente rigorosos (como REDD, ARR, ALM e outras abordagens), ele provará que o mercado de carbono pode ser um pilar da descarbonização global.
Seria uma vitória para o Brasil e para o planeta. O futuro do nosso clima pode depender desse sucesso.
* Mandy Rambharos é CEO da Verra.