Heróis do clima, manguezais são poderosas soluções baseadas na natureza

Manguezais são ecossistemas singulares, formações costeiras únicas e, acima de tudo, ainda oferecem um vasto potencial econômico, climático e social. Em meio à emergência global do clima, essas florestas se apresentam como uma solução baseada na natureza bastante tangível, pronta para colaborar com a agenda central da COP30, em Belém, no Pará.  

O Brasil, com a segunda maior cobertura de manguezais do mundo, está em posição única para liderar essa pauta. Ações recentes, como a inclusão dos manguezais no Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) e o lançamento do Programa Nacional para a Conservação e o Uso Sustentável dos Manguezais (ProManguezal) em 2024, reforçam essa liderança.

Os manguezais protegem as zonas costeiras contra tempestades, erosão e inundações, enquanto sustentam atividades econômicas essenciais como pesca, aquicultura e turismo, especialmente em países em desenvolvimento. Formam uma barreira natural contra o avanço do mar, protegendo mais de 18 milhões de pessoas e cerca de US$ 65 bilhões em infraestrutura costeira — de portos e rodovias a aeroportos e cidades inteiras. 

Estima-se que 80% das populações globais de peixes e 30% das pescarias comerciais dependam de manguezais saudáveis. Investir na conservação e restauração dos manguezais é investir na resiliência econômica, comunitária e humana.

Além do papel essencial na promoção da resiliência costeira, os manguezais são também verdadeiros heróis climáticos. Esses ecossistemas exercem um impacto amplificado no cumprimento da agenda climática. Cada US$ 1 investido em conservação e restauração de manguezais gera US$ 3 em benefícios para as comunidades. 

Embora cubram apenas 0,7% da superfície terrestre, estudos indicam que 43,5 milhões de toneladas de CO2 podem ser absorvidas pela biomassa dos manguezais, com outras 189 milhões de toneladas armazenadas no solo — um impacto que supera as emissões anuais da Espanha.

Desafios e soluções

Se investir em manguezais oferece um triplo benefício — reduzir emissões, fortalecer a resiliência costeira e proteger sistemas alimentares e a biodiversidade  —, ampliar o investimento nessa solução baseada na natureza é também um desafio. 

Para garantir o futuro dos manguezais, serão necessários mecanismos econômicos de longo prazo que tornem essas florestas mais valiosas de pé do que destruídas. Será necessário ir além do financiamento tradicional da conservação e adotar um modelo mais diversificado de capital, incluindo fontes públicas, filantrópicas e privadas.

Foi neste contexto que nasceu o Mangrove Breakthrough, uma iniciativa que desempenha um papel catalisador ao dar aos manguezais a atenção e o investimento que merecem.

Ao reunir sociedade civil, setor privado — com empresas como a Salesforce — e governos, como o do Brasil, o Mangrove Breakthrough busca mobilizar US$ 4 bilhões até 2030 para proteger e restaurar 15 milhões de hectares de manguezais em todo o mundo. Atingir essa meta exigirá superar grandes desafios e aproveitar novas oportunidades — demonstrando como finanças, parcerias e tecnologia podem gerar impacto mensurável.

O desenvolvimento de empreendimentos sustentáveis orientados pelo mercado pode gerar retorno financeiro ao mesmo tempo em que protege os manguezais. Projetos comunitários de restauração podem gerar créditos de carbono azul, negociados em mercados voluntários. Empresas como a Salesforce compram esses créditos para compensar emissões residuais em seus caminhos rumo ao net zero

Em 2024, a Coalizão Symbiosis, um grupo de compradores corporativos, sinalizou forte demanda por créditos de carbono de alta qualidade, com um compromisso antecipado de até 20 milhões de toneladas até 2030. A coalizão planeja lançar uma chamada de propostas em 2026, que incluirá projetos de manguezais, entre outros de soluções baseadas na natureza.

Outros modelos — como ecoturismo, pesca e aquicultura sustentáveis, e seguros ambientais que valorizam os serviços prestados pelos manguezais — reforçam ainda mais os incentivos econômicos. Juntos, esses mecanismos podem liberar o capital necessário para proteger e restaurar manguezais em escala global.

Falta de dados

Os manguezais também permanecem sub-representados em plataformas globais de dados sobre a natureza, o que limita a capacidade das instituições financeiras de avaliar riscos e interdependências ligados a esses ecossistemas críticos. 

Embora ferramentas como o Global Mangrove Watch ofereçam dados quase em tempo real, os investidores ainda carecem de informações detalhadas que orientem o capital para resultados positivos em prol dos manguezais.

Para reduzir essa lacuna, o Mangrove Breakthrough, em parceria com a Global Mangrove Alliance e a Restor, está lançando uma nova plataforma global para rastrear, mapear e destacar oportunidades de investimento que gerem resultados mensuráveis para os ecossistemas de manguezais e as comunidades que deles dependem. 

Ao cruzar informações sobre ecossistemas e portfólios de investidores, a plataforma ajudará instituições financeiras a identificar riscos, destravar novas oportunidades e fortalecer a resiliência diante de choques climáticos e ambientais.

Os manguezais estão entre as soluções baseadas na natureza mais poderosas do planeta. Garantir que recebam a atenção e o investimento que merecem exige cooperação contínua entre governos, setor privado e sociedade civil. 

A COP30 será um momento decisivo para reafirmar que proteger e restaurar os manguezais é essencial — para as pessoas, para a economia, para o clima e para a natureza.

* Ignace Beguin Billecocq é diretor executivo do Mangrove Breakthrough Hub, e Tim Christophersen é vice-presidente de Ação Climática da Salesforce, apoiadora da Mangrove Breakthrough