Num mundo mergulhado em incertezas, Larry Fink está longe de ter as respostas.
Mas soube como poucos formular a pergunta de milhões de vidas e trilhões de dólares: como vamos combinar compaixão com pragmatismo para enfrentar a pandemia?
O CEO da BlackRock, maior gestora de recursos do mundo com US$ 7 trilhões em ativos, não acredita que teremos uma vacina ou antiviral para conter o avanço do coronavírus nos próximos meses. E que, por isso, os governos e as empresas terão que tomar decisões difíceis.
“Precisamos entender como as sociedades vão navegar o pragmatismo de reabrir a economia, sabendo que 99% da população ficará bem e teremos uma economia mais dinâmica. Mas como vamos viver com nós mesmos sabendo que haverá uma porcentagem maior de mortes e especialmente entre os mais pobres?”, disse em uma live promovida pelo Banco Santander Brasil.
Nesse cenário, disse ele, mais do que nunca, “é hora de as grandes empresas terem compaixão”.
Referência no mundo financeiro, Fink ocupou um novo espaço nos últimos anos ao levantar a bandeira da integração da agenda de sustentabilidade aos investimentos, trazendo a questão para o foco das suas cartas anuais aos CEOs das investidas.
Direto de sua casa de campo, no subúrbio de Nova York, um Fink descontraído, de camisa polo e com alguns problemas para ajustar o som, foi entrevistado pelo presidente do Santander Brasil, Sergio Rial via teleconferência.
O executivo da BlackRock elogiou os pacotes de resgate feito pelo governo americano — do qual a gestora é uma das operadoras —, que foram bem sucedidos em trazer liquidez e reativar os mercados de dívida e de ações.
Mas está preocupado com o abismo que separa Wall Street e suas grandes corporações e a chamada ‘Main Street’, formada pelos pequenos e médios negócios.
Segundo ele, parte dos empregos que estão sendo eliminados durante o período de isolamento podem desaparecer para sempre, tornando a crise muito mais prolongada e demandando uma agenda de estímulo mais pragmática por parte dos governos.
“Tem lições que podemos aprender sobre como os governos estabilizaram as economias em 1920 e 1930: precisaremos de programa de estímulo de emprego, voltados para infraestrutura”, afirmou. “A maior parte do capital pode vir do setor privado”.
Uma transformação geracional
Questionado por Rial sobre o Brasil, que agora enfrenta um cenário inédito de juros baixos, Fink pontuou brevemente que o real desvalorizado torna o investimento no país mais atrativo.
Mas fez um apelo:
“Eu realmente acredito que o Brasil vai ter que focar sustentabilidade, e todo o mundo emergente”, disse. “E os mercados desenvolvidos vão ter que ajudar os mercados em desenvolvimento porque eles estão em estágios diferentes”.
Segundo Fink, a pandemia da covid-19 vai mudar de forma permanente a forma como a população, especialmente os mais jovens, pensam o mundo — aumentando a pressão pelo combate à mudança climática.
“Os jovens que estão entrando no mercado de trabalho agora nos Estados Unidos nasceram no 11 de setembro, viveram a grande recessão quanto tinham oito ou nove anos e, agora que estão na faculdade, estão passando pela crise da covid”, pontua. “Enquanto eu cresci houve algumas crises, mas nada perto disso. Isso será monumental na mente dessa geração.”
Essa demanda já vem encontrando eco nos investimentos.
No primeiro trimestre deste ano, os ETFs da BlackRock ligados a sustentabilidade tiveram “o crescimento mais rápido da história”, de acordo com Fink. E a performance vem superando a dos índices tradicionais em “centenas de pontos-base” neste ano.
Mais recentemente, a comparação se tornou menos justa por conta da queda brutal no setor de energia, que tem baixo peso nas carteiras sustentáveis, pondera o executivo. Mas o médio prazo confirma a tendência: a performance superior já ocorre há mais de dois anos.
Cooperação e cooperação
Num momento em que as pessoas e as economias estão se voltando para dentro, Fink acredita que falta cooperação entre os governos para que possam sair mais rápido da crise.
“Falamos menos sobre protocolos entre países do que sobre a guerra comercial”, argumenta. “Se há uma época para colaboração internacional, em que os líderes mundiais se juntam e dizem ‘estamos juntos’, é essa”, aponta.
Esse pode ser, inclusive, o próximo tema da sua carta aos CEOs. “Como nós tentamos estimular essa cooperação e fazer as coisas funcionarem?”