Com Casas Bahia, Brasil tem default em dívida ESG

Em recuperação extrajudicial da rede de varejo, emissão com meta ambiental feita em 2021 também entrou na renegociação das dívidas

Com Casas Bahia, Brasil tem default em dívida ESG
A A
A A

Com a recuperação extrajudicial do Grupo Casas Bahia, antiga Via Varejo, pela primeira vez o Brasil tem uma dívida ESG em default, de pouco mais de R$ 1 bilhão.

A empresa anunciou uma renegociação de algumas debêntures e cédulas de crédito bancário (CCB) com seus dois principais credores, o Banco do Brasil e o Bradesco, num total de R$ 4,1 bilhões. Os dois bancos são credores de mais da metade dessa dívida, o que garantiu o quórum necessário para que a varejista entre com um pedido de recuperação extrajudicial. Diferentemente da recuperação judicial, que abarca todas as dívidas, a extrajudicial tem escopo limitado; assim, dívidas trabalhistas e com fornecedores ficam de fora e continuam sendo pagas.

O pacote de quatro debêntures repactuadas inclui os papéis da 6ª emissão, que foi ofertada há 4 anos, em maio de 2021, e que saíram com um rótulo ESG. A emissão de R$ 1 bilhão hoje tem um valor em aberto (mais juros) de R$ 1,064 bi.

Na ocasião, a rotulagem dos papéis foi bastante criticada e até hoje é lembrada como um exemplo de títulos atrelado a metas pouco ambiciosas e relevantes para esse tipo de dívida.

As debêntures foram caracterizadas como um sustainability-linked bond, ou seja, uma papel de dívida que tem taxa de juros atrelada ao cumprimento de metas ESG. Foi o primeiro SLB emitido no mercado doméstico a ser vendido no mercado a investidores (e não carregado no balanço dos bancos emissores).

A meta que a empresa estabeleceu na ocasião foi aumentar o uso de energia renovável em suas operações — que incluem lojas, centros de distribuição e escritórios – de 30% para 50%, em 2022, e para 90% até 2025. O compromisso foi considerado fraco porque o setor de varejo é pouco intensivo em consumo de energia.

Embora a dívida financeira da empresa esteja sendo repactuada com anuência dos credores detentores de mais da metade dela, os títulos hoje no mercado terão seu vencimento antecipado por conta da recuperação extrajudicial e, serão considerados em estado de ‘selected default’ pelas agências de rating. Esses papéis darão lugar a outra dívida, com as novas condições. Pelo acordo, o prazo de pagamento será alongado e os juros, reduzidos.

No caso específico da debênture ESG, o Bradesco não é credor e o BB tem apenas R$ 10 milhões em balanço. As gestoras de recursos dos dois bancos, no entanto, têm R$ 250 milhões dos papéis em seus fundos de investimento, segundo material divulgado hoje pela empresa. A maior parte dos papéis, ou R$ 804 milhões, está nas mãos de outras assets e investidores que não participaram das negociações e terão que aceitar os termos compulsoriamente.

A participação das gestoras dos dois bancos no acordo divulgado pela empresa tem causado certa polêmica no mercado. Isso porque, a rigor, as gestoras são independentes dos bancos ao qual pertencem para decidir esse tipo de questão. “O ideal seria as gestoras votarem dentro das assembleias de debenturistas a respeito do tema para não terem risco de serem questionadas pelo regulador ou pelos investidores”, diz um gestor de fundos.