Que a proliferação de compromissos net zero por parte das empresas tem sido terreno fértil para a prática de greenwashing não é grande novidade para os mais atentos.
Para tentar separar o joio do trigo, um painel de 17 especialistas em meio ambiente e finanças formado pela ONU fez um pente fino no desigual universo das promessas de descarbonização.
Em documento entregue ontem na COP27, em Sharm el-Sheik, no Egito, o grupo define dez recomendações principais para tornar os compromissos comparáveis, críveis e – mais importante – efetivos na corrida para conter o aquecimento global.
“Nosso roteiro fornece padrões e critérios claros que devem ser seguidos ao desenvolver compromissos net zero. Neste momento, o planeta não pode permitir atrasos, desculpas ou mais greenwashing”, disse a ex-ministra do Meio Ambiente do Canadá, Catherine McKenna, que liderou o painel. Joaquim Levy, ex-secretário do Tesouro e ministro da Fazenda no governo Dilma, foi um dos especialistas envolvidos.
Há diretrizes diretas, aplicáveis não só aos compromissos assumidos por empresas, mas também por cidades e Estados. E também recomendações mais amplas, que dizem respeito ao ambiente regulatório.
A primeira delas define os parâmetros do que é um compromisso net zero ideal já na largada: ele deve ser anunciado publicamente, deve conter metas de descarbonização intermediárias (incluindo metas para 2025, 2030 e 2035), deve trazer um plano efetivo de ação alinhado aos parâmetros científicos para conter o aquecimento global, além de prever um corte de 50% das emissões líquidas até 2030 e a chegada ao net zero em 2050 ou antes.
Outra recomendação diz respeito ao uso de créditos de carbono para abater emissões, o chamado offsetting. O documento enfatiza que a prioridade absoluta deve ser reduzir as emissões de toda a cadeia de valor, ou seja, incluindo fornecedores e clientes; e que só depois desses esforços de mitigação é que créditos de carbono de alta qualidade podem ser usados para ajudar a fechar a conta.
Especificamente para instituições financeiras, a política deveria ser de não investir ou financiar negócios ligados ao desmatamento e eliminar de suas carteiras ativos conectados com desmatamento provocado por commodities agrícolas.
O documento também conclui que os compromissos de net zero não fiquem mais relegados a organizações voluntárias, mas que se tornem obrigatórios, com regras claras definidas por reguladores. A sugestão é que se comece por regular emissores corporativos carbono intensivos.
“O relatório não cria nada muito novo, mas é um endosso político importante aos padrões definidos pelo SBTi [Science-Based Targets initiative] e outras iniciativas semelhantes de padronização de compromissos de descarbonização”, diz Gustavo Pimentel, sócio da consultoria Nint.
Quanto à recomendação para que os compromissos passem a ser regulados, Pimentel diz que, embora seja desejável, “só será exequível quando existir um acordo vinculante de net zero no âmbito dos países, com um mercado global de carbono associado”.
Leia o relatório completo aqui.