Governo cria linhas para atrair capital estrangeiro para projetos verdes. Entenda

Com US$ 3 bi do BID e do Banco Mundial, serão criadas quatro linhas para reduzir o custo de capital e ampliar o retorno dos investimentos

Anúncio do programa de incentivo ao investimento estrangeiro realizado em São Paulo
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O governo anunciou na manhã de hoje um programa inovador para tentar alavancar a atração de capital estrangeiro privado para financiar a economia verde no Brasil, batizado de Eco Invest Brasil.

Segundo o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, o objetivo do programa é remover obstáculos para que o Brasil aproveite a chance de ser um provedor de soluções para a transição para uma economia de baixo carbono, entre eles, a baixa participação de capital privado nos investimentos e a volatilidade da moeda. 

Ainda de acordo com ele, no Brasil, apenas 6% dos recursos para empreendimentos verdes vêm do setor privado. Nos outros países emergentes, a porcentagem é de 14% e, nos países desenvolvidos, de 81%.

“Nas economias emergentes estão as grandes oportunidades de reduções de emissões [de gases de efeito estufa], portanto é imperioso atrair o capital privado”, afirmou Ceron. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não pôde participar do anúncio após ser diagnosticado com covid-19.

No passado, o alto custo do hedge cambial era “resolvido com investimentos menores, mas não temos mais essa opção nem podemos dizer que o problema não tem solução”, dados o tamanho do desafio e a urgência da crise climática, afirmou o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn.

“Se funcionar, e acho que vai funcionar, será um exemplo para o mundo”, disse Goldfajn. “Esse é um problema global e, se [a iniciativa] tiver tração aqui será replicada no mundo.”

Parte do programa, no valor de US$ 3,4 bilhões, já havia sido anunciada na COP28 e diz respeito à oferta de instrumentos de proteção contra a variação cambial pelo BID para investimentos verdes no Brasil. 

A ideia aqui é aproveitar o risco “Triplo A” do BID para trazer para o Brasil diversas opções de hedge cambial a um custo mais acessível. Esses instrumentos, contratados pelo BID junto a bancos estrangeiros, serão repassados ao Banco Central, que os repassará a instituições financeiras locais. O Banco Central não incorrerá em riscos e nem usará recursos do seu balanço ou das reservas internacionais do país, esclareceu o presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Mas o programa vai além. BID e Banco Mundial emprestarão US$ 2 bilhões e US$ 1 bilhão, respectivamente, para reforçar o Fundo Clima. Esses recursos – que poderão se somar a outros aportes feitos pelo governo no futuro – serão destinados a quatro novas linhas de crédito que serão criadas para reduzir o risco dos investimentos em projetos no Brasil e melhorar a relação risco-retorno para o capital privado estrangeiro.

As soluções miram diferentes fases dos projetos, desde a estruturação, passando por riscos de liquidez pontuais durante a execução do projeto e até fornecendo proteção cambial de longo prazo. 

  • A primeira delas é uma linha de blended finance. Nela, os recursos aportados no Fundo Clima poderão ser acessados para complementar captações feitas no mercado internacional para financiar projetos verdes, permitindo a redução do custo de capital do projeto. Terão acesso a essa linha as instituições financeiras que tiverem capacidade de alavancar o maior volume de recursos privados internacionais a partir dela. Para a empresa tomadora final da linha, haverá o benefício da redução do custo médio do empréstimo e também menor risco cambial, uma vez que os financiamentos serão denominados em reais. São elegíveis projetos ‘green field’ alinhados à transformação ecológica, em especial nas áreas de adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e infraestrutura verde e adaptação. A linha tem prazo de até 25 anos e carência de até 5 anos. A taxa de juros ainda será definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
  • A segunda é uma linha emergencial de liquidez, para resolver problemas de caixa temporários dos projetos, decorrentes de variações cambiais. Essa solução se aplica especialmente a empreendimentos que contam com uma receita futura previsível indexada à inflação, como os de infraestrutura, mas que podem sofrer choques de liquidez momentâneos por causa do câmbio. 
  • A terceira linha visa fomentar o desenvolvimento de produtos de hedge cambial de longo prazo para financiamento e investimento de capital em projetos verdes pelas instituições financeiras locais (além daqueles que serão fornecidos pelo BID). Aqui, a ideia é que a linha de crédito seja usada pelo banco local para reduzir seu custo de capital e requerimento  de provisão de capital por risco das operações ao oferecer instrumentos de proteção cambial (swaps e opções) para investimento em projetos verdes. Grosso modo, o banco poderá tomar esses recursos a custo reduzido e investi-los, usando o rendimento desse investimento para criar uma reserva que ajudará a cobrir seus custos e riscos, inclusive de inadimplência do tomador da operação. 
  • A quarta e última linha visa aumentar o pipeline de projetos verdes de qualidade no país. Os bancos que criarem produtos para financiar a estruturação de projetos poderão usar essa linha de crédito como funding. O prazo para pagamento é de até 12 anos, com até 7 de carência e a taxa de juros ainda será definida pelo CMN.

Quem pode acessar

Segundo Rogério Ceron, as quatro linhas têm potencial para desembolsos anuais somados entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões.

Serão elegíveis a essas linhas projetos que estejam alinhados ao Plano de Transformação Ecológica, segundo Rogério Ceron. Como o Fundo Clima será o veículo para repasse dos recursos, os projetos terão que atender aos critérios do fundo. A Fazenda ainda trabalha no desenvolvimento de uma taxonomia de ativos sustentáveis para o Brasil.

A governança criada para as linhas prevê que os projetos beneficiados passarão por uma verificação prévia e também por verificações dos impactos alcançados. 

Medida provisória

O programa será criado por uma medida provisória, que deve ser editada nos próximos dias. Ela vai mexer na estrutura do Fundo Clima, que será a fonte das linhas de crédito, e permitir o uso de derivativos cambiais para mitigação de riscos financeiros.

A secretaria do Tesouro será responsável pela regulamentação das linhas de crédito, pela definição do processo de alocação de recursos e pelo monitoramento e prestação de contas.

Além do BID e do Banco Mundial, o governo britânico também participou do anúncio. O país vai arcar com US$ 1 milhão para a contratação de uma instituição que fará a verificação independente do monitoramento e dos resultados do programa.