COP30: Tanques de guerra, comércio animado e muito trânsito em Belém

Belém – A poucos dias do início da COP30, Belém virou um mosaico de paisagens distintas: o trânsito está mais pesado que o normal no centro da capital paraense e impactando a rotina dos moradores que precisam ir e voltar do trabalho.

Na região do Parque da Cidade, sede da conferência, o cenário é inverso. Sete quilômetros distante do centro, a área ainda não vê sinais de engarrafamento – as vias dos arredores, sempre cheias de carros, foram fechadas para veículos até o dia 21. 

Se em bairros da periferia o clima é de vida normal, os pontos turísticos da cidade, como a Estação das Docas, já estão lotados de visitantes. E a cena animada de bairros como Nazaré e Umarizal, cheios de bares e restaurantes, contrasta com tanques e carretas militares do Exército Brasileiro, parte do reforço da segurança do evento.

No principal pavilhão do Parque da Cidade, que abriga a Blue Zone, onde ocorrem as negociações diplomáticas, a distribuição de credenciais aos participantes já atraía um bom fluxo de pessoas na tarde de segunda-feira (3), mas tudo transcorria com rapidez e sem filas, o que tende a mudar nos próximos dias.

Ajustes finais ainda estão sendo feitos no local: é possível ver equipamentos, andaimes e telas de construção, além de trabalhadores finalizando instalações elétricas e de infraestrutura. O controle de segurança da entrada, com uma fileira de aparelhos de raios-x, está montada, mas ainda não em funcionamento. 

Também não faltam viaturas das polícias civil e militar pelas ruas da cidade. A feirante Maria Antônia Santos, que trabalha no bairro da Pedreira, diz se sentir mais segura para andar nas ruas, em especial de noite: “Deveria ser assim sempre, independentemente do evento”.

Segurança

O policiamento reforçado não impediu incidentes. Dois jornalistas estrangeiros, uma argentina e um chileno, foram vítimas de um assalto à faca no Mercado Ver-o-Peso, na tarde de domingo, em Belém. Ninguém ficou ferido, e os pertences foram recuperados e devolvidos aos donos, mas o fato dominou o noticiário local. 

Desde terça-feira (2), militares estão em peso no Pará por conta do decreto de Garantia de Lei e Ordem (GLO) assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Oito mil militares irão reforçar a segurança tanto da capital quanto de cidades-chave para o fornecimento de energia, como Altamira e Tucuruí.

A presença militar durante a COP30 ocorre em um contexto de tensão após a ação policial contra a facção Comando Vermelho, que terminou com 121 mortos na semana passada, no Rio de Janeiro. A operação prendeu 32 paraenses, já que o Estado abriga uma das principais células do CV. A GLO segue em vigor até dia 23 de novembro.

Mobilidade urbana 

Os trajetos das linhas de ônibus urbanos foram alterados para se adequar aos bloqueios e mudanças do trânsito e para liberar as principais vias da cidade. As alterações ainda geram confusão para os usuários regulares. Em um ponto de ônibus na avenida Nazaré na noite de segunda-feira (3), a maioria dos usuários de transporte público tentava decifrar no Google Maps por onde e a que horas os ônibus passariam. 

A criação de 15 linhas de ônibus exclusivas para os participantes credenciados da conferência – algo que sempre acontece nas COPs – também tem gerado alguma confusão. “Nem adianta fazer sinal para esses ônibus novos, eles não param”, reclamou a moradora Carla Neves. Ao parar no semáforo, o motorista de um deles abriu a porta para explicar a situação. “Nossa, eu não sabia. Poderiam informar melhor essas coisas pelas redes sociais, né?”, disse ela à reportagem. 

Até o momento, o aplicativo Mapas, dos telefones da Apple, assim como o Google Maps, não estão atualizados com os ônibus da Linha COP, mas já mostram boa parte dos desvios e das vias interditadas. Um aplicativo da conferência, chamado “COP30: App do passageiro”, já está disponível para download.

Quem se locomove de carro também está sendo impactado. A fisioterapeuta pediátrica Thamires Otero percorre 13 quilômetros em uma hora para chegar ao hospital onde trabalha. Com as principais vias dedicadas aos ônibus da COP desde o dia 1º de novembro, ela agora leva duas horas para terminar o trajeto. 

“O jeito é sair mais cedo e buscar rotas alternativas. Como trabalhamos na assistência ao lado do leito dos pacientes, evitamos nos atrasar para não atrapalhar as rotinas dos outros colegas”, diz.

Para o funcionário público Ricardo Rodrigues, o que já era ruim só piorou. “O tempo de deslocamento aumentou muito, o que causa mais estresse para todos. Mas é um mal necessário, pois é preciso garantir a segurança das autoridades e demais participantes”.

A partir desta semana e até o dia 21 de novembro, escolas e universidades entram em férias para aliviar o trânsito, e alguns órgãos públicos terão expediente em home office.

Vida noturna

Apesar da vida noturna intensa, Belém costuma ser bem morna entre segunda e quarta-feira. Mas o cenário está mudando, segundo o garçom Gabriel Faria. Atendendo em um bar na noite da última segunda-feira, ele conta que não tem mais dia tranquilo. Faria estava morando no Rio de Janeiro e aproveitou a COP para voltar ao Pará. “Não tem mais isso de dia e horário mais movimentado. Tem gente o tempo todo, tanto que até café da manhã estamos servindo”, diz. 

Além de jornalistas e integrantes de algumas delegações, que já estão na cidade por conta da Cúpula dos Líderes que inicia dia 6, antes da conferência, há muitos funcionários de empresas responsáveis pelas montagens de espaços de eventos paralelos. É o caso de Rafaella Freitas, que mora em Palmas, no Tocantins. “A montagem encerra na sexta-feira e volto para casa. Adorei Belém, é super agradável. Se eu soubesse, teria pedido para ficar mais tempo.”

Outros estabelecimentos precisaram tomar decisões difíceis. O Ôvibe, conhecido pelos shows de música ao vivo e drinques autorais, não vai realizar festas durante a COP30. O local também é um hostel, que foi ampliado para receber uma organização não-governamental. 

“Não teremos almoços, nem jantar e nem festas. Pulamos de 18 para 26 leitos, colocamos contenções de segurança, reformamos e pintamos alguns pontos. Foi uma decisão difícil. Serão duas semanas fora do radar de eventos, mas o valor cobrado levou isso em consideração também. E nossa operação será mais enxuta”, diz o sócio Daniel Carrera. Ele avalia que conferência mudou a realidade de Belém, pois garantiu o aperfeiçoamento dos empreendimentos e serviços da cidade, com investimentos e capacitação. 

“Todo mundo do setor privado teve que elevar o padrão para um público mais exigente, que está acostumado com experiências de muita qualidade fora daqui. Isso também é um legado que fica.”