Quase dois meses após o início do mandato, começa a se desenhar o organograma da questão climática no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na esplanada, o tema ganhou mais protagonismo nas estruturas: dos 37 ministérios, ao menos oito — além do próprio Ministério do Meio Ambiente, que agora também inclui a Mudança do Clima no nome — têm secretarias ou subsecretarias específicas dedicadas à pauta ambiental ou do clima, segundo levantamento feito pelo Reset.
Na linha de frente da pauta, foi bem recebida a nomeação de Ana Toni, ambientalista com passagens por diversas ONGs e que comandava o Instituto Clima e Sociedade (ICS), como Secretária Nacional de Mudança Climática do Meio Ambiente.
Na sexta-feira, o diplomata Luiz Alberto Figueiredo Machado, que foi chanceler no primeiro mandato de Dilma Rousseff, foi indicado pelo Itamaraty como ocupante do cargo de embaixador especial para mudança do clima. Ele ficará responsável por divulgar o trabalho de clima no exterior e recuperar a imagem do país, deteriorada durante a gestão Bolsonaro.
Ainda no Ministério das Relações Exteriores, a Secretaria de Clima, Energia e Meio Ambiente ficará a cargo do embaixador André Aranha Corrêa do Lago.
Outro movimento aguardado na governança nacional do clima é a criação da Autoridade Climática, órgão técnico vinculado ao MMA e que vai assessorar, monitorar e acompanhar o cumprimento das metas de descarbonização.
A ideia é que sirva como uma espécie de “banco central”, para fiscalizar o quanto as políticas públicas adotadas pelas diversas áreas do governo atuam de acordo com as metas apresentadas dentro do Acordo de Paris.
A expectativa é que a proposta para criação da nova autarquia seja enviada ao Congresso Nacional até o próximo mês. O nome mais cotado para assumir a autoridade — e tido quase como certo por pessoas próximas a Marina Silva — é o de Tasso Azevedo, criador do MapBiomas e um dos maiores especialistas em emissões de gases de efeito estufa do país.
“Transversalidade?”
Trazendo a agenda ambiental e a climática de volta ao foco, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se comprometeu a tratar essas questões de forma transversal em toda a economia.
Se em menos de dois meses de mandato ainda é cedo para se ver resultados mais concretos, a estrutura dos ministérios dá sinais de que o tema entrou no foco.
Entre as secretarias que foram criadas fora da estrutura do MMA, aquele que parece ter contorno mais transversal e parrudo é a Secretaria de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria, que ficará abaixo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), comandado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.
A recém-criada secretaria será liderada pelo ex-governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), derrotado nas eleições estaduais deste ano.
No Ministério de Minas e Energia, a Secretaria de Planejamento, que será comandada pelo ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) Thiago Barral, incluiu “Transição Energética” no nome, numa sinalização de que o planejamento da matriz terá um olhar para a descarbonização.
Houve forte pressão do setor de biocombustíveis para que houvesse uma secretaria dedicada apenas a energias renováveis, mas a ideia não foi adiante.
O Ministério do Turismo também passou a contar com a Secretaria de Sustentabilidade, Desenvolvimento Territorial e Infraestrutura e o secretário é Carlos Henrique Menezes Sobral.
No Ministério dos Transportes há a Subsecretaria de Sustentabilidade, ligada diretamente à secretaria-executiva da pasta, mas o líder da área ainda não foi definido.
Já o Ministério da Fazenda conta com a Subsecretaria de Política Agrícola e Negócios Agroambientais e o subsecretário Gustavo Sampaio de Arrochela Lobo.
Por fim, a Advocacia-Geral da União (AGU) também passou a contar com a Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, ligada diretamente ao gabinete do titular Jorge Messias.
Os principais objetivos são assegurar a segurança jurídica das políticas públicas focadas no desenvolvimento sustentável, assessorar membros da AGU em relação às pautas climáticas, acompanhar demandas judiciais e propor uniformização de entendimento jurídicos em relação ao tema.
Novos ministérios – e espaço para lobbies
Algumas pastas criadas no governo, como a do Ministério dos Povos Indígenas e do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, essa última desmembrada do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), já têm em sua gênese ligação com os temas climático e ambiental.
A valorização dos povos indígenas está intrinsecamente ligada à proteção de floresta e de vegetação nativa e, no ministério, há uma secretaria voltada à gestão ambiental e territorial indígena.
Da mesma forma, no MDA, que cuida de políticas voltadas à agricultura familiar e orgânica, por exemplo, há uma secretaria de governança fundiária e desenvolvimento territorial e socioambiental.
Se, em teoria, a criação de órgãos específicos dentro dos ministérios dá mais protagonismo ao tema, por outro, ela dá espaço para indicações políticas — e abre mais portas para lobistas.
“Os lobistas estão ávidos com todas essas secretarias para tratar do tema e uma aparente descentralização. Porque, se uma demanda não é bem recebida em uma, será possível recorrer a outras”, diz um observador que conhece bem a máquina do lobby de Brasília.
O que vai determinar se a existência de tantas instâncias servirá para acelerar a agenda climática ou aos lobistas será a governança a ser criada para coordenar o trabalho entre elas dentro do governo.