Como a Bridgewater incorpora ESG em seu novo fundo — de ações a commodities

All Weather Sustainability, da gestora de Ray Dalio, chegou ao Brasil com tíquete mínimo a partir de R$ 500

Como a Bridgewater incorpora ESG em seu novo fundo — de ações a commodities
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Chegou este mês ao mercado brasileiro a versão ESG do All Weather, a renomada estratégia da Bridgewater — gestora americana com mais de US$ 150 bilhões de patrimônio liderada por Ray Dalio — que se propõe a navegar bem a despeito dos cenários econômicos.   

Com tíquete inicial a partir de R$ 500, embora ainda esteja restrito a investidores qualificados (com mais de R$ 1 milhão aplicados), o Bridgewater All Weather Sustainability traz uma porta de entrada mais democrática que seu irmão tradicional, disponível no país apenas para investidores profissionais e com tíquete mais elevado. 

Mas qual a diferença entre os dois fundos? 

A resposta curta é: enquanto o All Weather olha apenas as métricas clássicas de risco e retorno, o All Weather Sustainability incorpora também a dimensão de impacto, procurando alinhar os ativos aos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. 

Esses objetivos vão desde a erradicação da pobreza até o combate às mudanças climáticas e dão um ponto de partida para incorporar os aspectos sociais e ambientais à análise. 

Como a teoria é convertida em prática, no entanto, demanda uma explicação mais longa. 

A premissa básica da estratégia All Weather é construir uma carteira diversificada entre ativos e geografias. Mais do que acertar para onde vai a economia mundial, a Bridgewater desenvolveu um método para chegar a uma carteira descorrelacionada que entregue retornos consistentes em cenários de maior ou menor crescimento econômico e mais ou menos inflação. 

Incorporar a análise de sustentabilidade a esse mar de ativos, que vai de ações a commodities, passando por títulos soberanos, é uma tarefa bastante complexa. 

Dados, dados, dados

Assim como na análise financeira, a gestora decidiu adotar uma postura sistemática, com uma incorporação da análise de grandes volumes de dados para chegar ao resultado. 

Uma queixa frequente em relação a fatores ESG é a discrepância entre avaliações e a dificuldade de achar dados consistentes para fazer a análise.  

Mas, para a líder de sustentabilidade da gestora e uma das co-gestoras do fundo, Karen Karniol-Tambour, essa crítica é válida para várias outras bases de dados — e o mercado já encontrou formas de lidar bem com elas quando o aspecto é financeiro. 

“As pessoas falam sobre a bagunça que são os dados ESG o tempo todo. Também há uma grande confusão nos outros dados com os quais lidamos. Os dados da China, por exemplo, são caóticos e construímos processos para lidar com esses dados e triangulá-los, tornando-os tão confiáveis quanto eles poderiam ser. A nossa experiência em lidar com dados de forma sistemática ajuda muito”, disse em entrevista à Institutional Investor na semana passada.

No portfólio de ações, o All Weather Sustainability leva em conta dois aspectos, talvez numa estratégia mais comum no mercado: a sustentabilidade dos setores e dos produtos vendidos e também como a empresa lida com as questões ESG dentro do seu próprio negócio.

Já no portfólio de títulos de dívida, entram ativos de países com políticas alinhadas aos ODSs, além de títulos de bancos de desenvolvimento e green ou social bonds. 

A estratégia para commodities 

Mas uma das classes de ativos mais complexas do ponto de vista social e ambiental, e para a qual poucas casas de gestão desenvolveram métodos de análise sob a ótica ESG, também tem um papel importante na carteira do All Weather. 

As commodities são vistas como uma forma de se proteger contra a inflação, adicionando uma camada que normalmente falta em fundos globais tradicionais, com portfólios focados apenas em ações e títulos. 

Na estratégia sustentável, elas também entram — e filtrar o que faz sentido dentro de um portfólio que busca impacto positivo é talvez um dos principais quebra-cabeças que a gestora precisa montar na nova estratégia. 

A extração de commodities como um todo continua sendo uma grande contribuidora para as emissões de gases de efeito estufa.  Além disso, algumas commodities também estão associadas a violações de direitos humanos e condições de trabalho análogas à escravidão. 

No fim das contas, o All Weather Sustainability mantém na carteira metais preciosos e metais industriais, e deixa de fora combustíveis e commodities agrícolas. “Com isso temos um tipo de diversificação no qual os metais preciosos vão muito bem em períodos de mais inflação monetária e os metais industriais ajudam com as pressões da inflação da economia mais real”, afirma Karniol-Tambour em podcast da própria Bridgewater

Em um paper, a gestora explica a lógica por trás da alocação. Primeiro, avalia a sustentabilidade da produção da commodity em geral, como pegada ambiental e social, e em segundo lugar a sustentabilidade no consumo: para que ela é usada hoje e como pode ser seu uso no futuro. 

“Por exemplo, metais preciosos são altamente recicláveis e raramente descartados (a maior parte do ouro que é comprada e vendida já está em circulação), e não tem alternativas sustentáveis claras”, diz a gestora no paper.  

Além disso, as avaliações são feitas no nível de produtor e, em alguns casos, no nível da mina de produção. A Bridgewater examina mais de 70 indicadores de 19 commodities e 600 produtores, tirados de um conjunto de fontes setoriais, acadêmicas e intergovernamentais e cobrindo a produção e o consumo globais.

“A mudança de alocação de commodities menos sustentáveis para mais sustentáveis pode ser feita via futuros e derivativos ou no nível intra commodity, via contratos ‘verdes’ específicos (que capturam uma fatia sustentável da produção global). Nos últimos anos, houve uma melhora nas certificações de cadeias de fornecimento sustentáveis, e o apoio dos investidores a essas iniciativas são essenciais para que se desenvolvam”, afirma a gestora no paper.  

Uma estratégia na sua infância 

O Bridgewater All Weather Sustainability ainda é um produto jovem: foi lançado globalmente no fim de junho com uma captação de US$ 2 bilhões, de acordo com a Institutional Investor. Ainda não há dados sobre desempenho da carteira.

Karniol-Tambour afirma que o portfólio tem muitas similaridades com o All Weather tradicional, mas admite que o universo do produto sustentável é mais restrito. 

“Uma vez que você está escolhendo ativos para sustentabilidade, corre riscos levemente mais altos relativos ao retorno porque a habilidade de diversificação cai um pouco”, explica ela numa entrevista à gestora francesa Lyxor, que operacionaliza a estratégia do All Weather Sustainability .

“Nossa visão, contudo, é que isso tem um efeito muito pequeno. Por exemplo, quando se trata de ações, a mudança de milhares para várias centenas de companhias não é tão significativa em termos de diversificação.”

No Brasil, o fundo está disponível nas plataformas de Itaú, Bradesco, Safra, XP, BTG Pactual e BNP Paribas, normalmente em duas versões, com e sem hedge cambial, e tíquetes mínimos que começam em R$ 500. A taxa de administração é de 1,45%, sem taxa de performance.