O secretário executivo da UNFCCC, Simon Stiell, discursa na pré-COP30

Os novos planos nacionais de descarbonização apresentados à ONU são os mais ambiciosos e abrangentes desde o estabelecimento do Acordo de Paris, apesar de ainda estarem aquém do necessário para evitar consequências mais graves da mudança climática.

Esta é a conclusão do Relatório Síntese das NDCs, publicado hoje pela Convenção do Clima da ONU, a UNFCCC. Mas a análise deve ser acompanhada de uma ressalva fundamental: ela cobre apenas um terço das emissões mundiais.

“Este conjunto limitado de dados não permite conclusões globais abrangentes”, afirma o documento. “Ainda assim, o relatório destaca várias lições sobre o progresso que vem sendo obtido e os grandes desafios à frente.”

Foram analisados os planos dos 64 países que submeteram seus planos até 30 de setembro. Alguns dos maiores poluidores do mundo – incluindo China, Índia e União Europeia – estão atrasados na entrega.

As Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês) são um dos pilares do Acordo de Paris. O conjunto desses planos nacionais permite estimar o avanço da cooperação climática internacional.

Um dos objetivos declarados pelo Brasil, presidente da COP30, era obter compromissos ambiciosos para as novas NDCs, que têm as metas de descarbonização entre 2031 e 2035.

Em discurso na ONU, há um mês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um apelo para que os atrasados divulgassem seus compromissos o quanto antes. “A apresentação de Contribuições Nacionalmente Determinadas não é uma opção, como deixou claro a Corte Internacional de Justiça: é uma obrigação”, afirmou Lula. 

O Brasil foi um dos primeiros a apresentar seu plano, durante a COP29, em novembro passado. O prazo inicial para os outros países venceu em fevereiro. A data foi postergada para setembro.

A China, responsável por cerca de um terço das emissões mundiais, anunciou sua meta há um mês, mas o documento detalhando como pretende ainda não foi publicado e, por isso, não foi contabilizado no relatório apresentado hoje.

Distante da meta

O relatório analisou as NDCs submetidas por 64 países. Houve “progresso tangível nas ações climáticas nacionais”, e houve melhora de “qualidade, credibilidade e escopo econômico” nos planos.

Mas eles ainda não são suficientes para limitar o aquecimento global a 1,5°C em comparação com a era pré-industrial.

“Por meio da cooperação climática promovida pela ONU e de esforços nacionais, a humanidade está, pela primeira vez, claramente conseguindo reduzir a curva de emissões, embora ainda não na velocidade necessária”, afirmou em nota o secretário-executivo da UNFCCC, Simon Stiell.

 Eis as principais conclusões do levantamento:

  • Se forem completamente cumpridas, as 64 NDCs apontam uma redução de 19% a 24% nas emissões de gases estufa em 2035, ante o ano-base de 2019, para os países analisados. Segundo o painel científico IPCCC, elas teriam de ser 60% menores para conter o aquecimento a 1,5°C;
  • O pico de emissões dos países analisados deve ser registrado antes de 2030, “uma virada significativa na trajetória coletiva”;
  • Mantido o ritmo prometido nas NDCs, esse grupo de países alcançaria uma redução de 55% nas emissões em 2050 – ainda assim, a metade do necessário para a meta de 1,5°C;
  • 44% das partes estabeleceram metas quantitativas para aumentar a capacidade de energia renovável, embora as NDCs ainda não reflitam o total dos compromissos anunciados previamente;
  • 47% dos países indicaram metas para reduzir a participação de combustíveis fósseis não-mitigados (aqueles em que não há captura de CO2) na geração de eletricidade, e 13% relataram metas para diminuir gradualmente o uso de térmicas a carvão não-mitigado.

Correção de rumo

Um dos aspectos positivos destacados pelo relatório-síntese é a resposta ao Balanço Global do Acordo de Paris (GST). Aprovado na COP28, em Dubai, o GST apontou recomendações para esta rodada de NDCs.

Entre os planos analisados, 88% indicam ter levado em conta o resultado do GST, e 80% com ações específicas. O Balanço Geral menciona, por exemplo, a necessidade de triplicar a capacidade de energia renovável e a “transição que se afasta dos combustíveis fósseis”.

O levantamento também aponta um aumento nas NDCs que cobrem todos os setores da economia. Trata-se de um avanço importante, já que esta é uma decisão que cabe a cada país. O Acordo de Paris é baseado em ações voluntárias e não impõe obrigações sobre o que cada plano deve contemplar.

Na rodada anterior, que cobria o período até 2030, 81% das NDCs levavam em conta a economia inteira do país. Este ano, o percentual subiu para 89%. 

Financiamento climático

Os recursos para colocar em prática o que dizem as NDCs foram indicados em três de cada quatro planos, diz o relatório – na maior parte das vezes como a necessidade de financiamento.

Foram apresentadas estimativas de custo de cerca de US$ 1,97 trilhão até 2035. Deste total, US$ 1,34 trilhão correspondem a mitigação (redução de emissões) e US$ 560 bilhões para adaptação.

As negociações de carbono entre países previstas no Artigo 6 do Acordo de Paris, uma das medidas de transferência de recursos do Norte para o Sul Global, também apareceram com mais frequência.

Nove entre dez planos mencionam essa cooperação, um aumento significativo em relação às 64% que planejavam aderir ao mecanismo na rodada anterior.