Diplomatas do mundo inteiro passaram as duas últimas semanas em Bonn, na Alemanha, numa reunião preparatória para a próxima Conferência do Clima da ONU, que acontece em dezembro em Dubai.
Os resultados – ou a falta deles – foram sombrios. Todos os sinais apontam para mais uma COP dominada pela tensão entre os países ricos e o mundo em desenvolvimento a respeito de quem deve pagar a conta.
Essa queda-de-braço se soma à controvérsia sobre a influência das empresas de petróleo sobre a conferência, que será presidida por Sultan Al Jaber, CEO da estatal petroleira dos Emirados Árabes Unidos.
“É um sinal muito ruim para a COP, que já vai começar tensa por causa da desconfiança [em relação a Al Jaber]”, diz Claudio Angelo, coordenador de comunicação e política climática do Observatório do Clima, uma organização que reúne mais de cem ONGs brasileiras.
Em tese, o encontro tradicionalmente realizado em junho na Alemanha trataria de temas mais técnicos com o objetivo de preparar o terreno para ministros e chefes de Estado na conferência.
O clima em Bonn costuma ser cordial, afirma Angelo, mas este ano esteve “contaminado pela política meses antes da COP, que é onde esse tipo de discussão costuma acontecer”.
A agenda oficial da reunião de duas semanas só foi aprovada no penúltimo dia, evitando o fracasso histórico de que todas discussões fossem invalidadas por um problema regimental.
O motivo do impasse foi uma tentativa da União Europeia de inserir nas discussões um novo programa com o objetivo de forçar os países a ir além em seus compromissos de redução de emissões.
Já os países em desenvolvimento – entre eles o Brasil – argumentam que esse é um exercício inútil se não houver dinheiro para financiar as medidas de mitigação.
Em uma sessão particularmente tensa, o paquistanês Nabeel Munir, um dos líderes da negociação, afirmou que os diplomatas presentes estavam se comportando como crianças de escola primária: “Por favor, acordem, o que está acontecendo é inacreditável”.
Mesmo com o acordo de última hora, não há dúvidas de que o clima belicoso será retomado assim que for batido o martelo da sessão inaugural da COP28. Os países em desenvolvimento devem repetir a estratégia do ano passado para colocar o dinheiro na pauta.
Um dos temas fundamentais da conferência será o desenho do fundo que vai compensar os países vulneráveis que já sofrem as consequências da mudança climática.
No passado, os países ricos fizeram promessas que não foram cumpridas. Agora, diz o especialista em negociações do clima Bruno Toledo à Radio France Internacional, o mundo em desenvolvimento vai querer saber como esses recursos serão viabilizados nem que seja necessário tomar o processo como refém.
Medindo o progresso
O outro grande tema da COP28 será a urgência da descarbonização. Em Dubai vai acontecer o primeiro global stocktake, como é chamado o levantamento do progresso em relação às metas nacionais estabelecidas no Acordo de Paris, firmado em 2015.
O mundo precisa reduzir as emissões de gases do efeito estufa em cerca de 45% até o fim desta década (em relação a 2019) para limitar a 1,5°C o aquecimento global em 2100 e evitar as piores consequências da mudança do clima, de acordo com o mais recente sumário da ciência compilado pela ONU.
De acordo com uma análise feita no ano passado pelo World Resources Institute, os atuais compromissos assumidos pelos países levarão a uma redução de somente 7% até 2030.
Além da pressão sobre governos nacionais, os ativistas querem que a indústria dos combustíveis fósseis também faça sua parte. O setor é responsável por 75% das emissões de gases que causam o efeito estufa.
Com um executivo de petroleira conduzindo as discussões, entretanto, não há muita esperança de avanços.
Em Bonn, Al Jaber afirmou que uma “redução gradual dos combustíveis fósseis é inevitável”. Mas a declaração deixou de fora uma informação crucial: o prazo.
As gigantes do setor, privadas e estatais, seguem com planos de manter a produção nos níveis atuais ou até mesmo aumentá-la.
A promessa dos anfitriões é uma COP “transformacional, de ação”, mas a cinco meses do início das discussões paira sobre a conferência um clima de pessimismo.