Marfrig testa suplemento para reduzir metano no arroto do boi

Aditivo pode ser parte importante do plano do frigorífico para reduzir seu impacto climático em 33% até 2035

Animais confinados na fazenda MFG, fornecedora da Marfrig
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O frigorífico Marfrig, representante de um dos segmentos de mais complexa descarbonização da economia brasileira, vai começar um piloto com um suplemento alimentar para reduzir suas emissões de metano.

O gás é produzido naturalmente na digestão dos bovinos e é um dos principais responsáveis pelo aquecimento global – seu efeito é até 20 vezes mais danoso que o CO2.

A fermentação entérica – ou o arroto dos bois – é de longe a maior responsável pelas emissões diretas do setor agropecuário.

A fazenda MFG Agropecuária, em Tangará da Serra (MT), iniciou um piloto com o Silvair, produto da americana Cargill que é misturado à ração dos animais na fase da engorda.

O Silvair é um composto bioquímico que “recolhe” parte do hidrogênio gerado na ruminação e o combina com o carbono. O resultado prático disso é a produção de amônia em vez do metano. A amônia não tem impacto climático.

O suplemento pode gerar uma redução de 10% até 30% nas emissões do rebanho, diz Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade da Marfrig. Nessa primeira fase do programa piloto, cerca de 350 animais receberão a suplementação.

Esse número inicial é uma parte ínfima perante as 280 mil cabeças de gado da MFG, que pertence aos controladores da Marfrig. O frigorífico abateu em média 28 mil animais por dia no ano passado.

Em seis meses a empresa espera ter dados que possam estabelecer o benefício ambiental e também o custo extra para os produtores. “É um produto extremamente inovador”, afirma Pianez.

Apesar de comprovado cientificamente e aprovado para uso comercial, esse tipo de intervenção ainda não é usada em larga escala em nenhum lugar do mundo.

Mas a Marfrig e todos os outros frigoríficos sabem que toda e qualquer ajuda será necessária na redução da pegada de carbono da carne bovina, e isso é especialmente verdade no Brasil.

O impacto da produção de alimentos no desmatamento foi objeto de um novo estudo divulgado esta semana pelos chamados “campeões do clima” da ONU. O tema deve ser um dos destaques nas discussões da COP27, que acontece em novembro, no Egito.

Cortando as emissões

A nutrição é um dos pilares do plano de descarbonização da Marfrig. A empresa é uma entre somente 13 companhias brasileiras que receberam o rigoroso selo da iniciativa Science-Based Targets, que valida os compromissos à luz da ciência.

E a promessa da Marfrig ainda não prevê o chamado net zero, ou seja, a neutralidade das suas emissões líquidas. Se tudo correr como o esperado, até 2035 o frigorífico terá reduzido em 33% a intensidade das emissões para cada animal abatido.

A meta envolve corte efetivo das emissões. O número não inclui compensações com créditos de carbono. E isso depende em grande parte do ciclo de vida dos animais nas fazendas de seus milhares de fornecedores.

No Brasil, a companhia tem relacionamento ativo com 10 000 criadores de animais, e cada um deles tem os seus fornecedores próprios.

Olhando só para os gases emitidos na digestão, o desafio é extremamente complexo. A qualidade do pasto varia muito de fazenda para fazenda, por exemplo, e cada animal pode passar por várias delas ao longo de sua vida.

O suplemento que reduz a produção de metano será aplicado somente na fase de engorda, que costuma durar cerca de três meses, de um ciclo que varia de 24 a 30 meses, em média.

Apesar da curta duração, trata-se de um período em que o animal mais come, afirma Pianez. “É quando ele está mais robusto, maior, e portanto emite mais.”

O custo também não está inteiramente calculado, mas Pianez afirma que não será possível repassá-lo para o bife vendido no supermercado.

“O consumidor final não vai pagar mais por isso. A gente entende que esse custo adicional vai ser diluído por toda a cadeia”, diz o executivo.

O desafio agora é justamente entender o cálculo econômico nesse piloto inicial. “Vamos balizar como levar o suplemento para toda a MFG e depois para todos os outros confinadores”, diz Pianez.Outro suplemento para a ração bovina, o Bovaer, da holandesa DSM, também já está aprovado para uso comercial no Brasil desde meados do ano passado.