Na Califórnia em chamas de 2020, os fazendeiros não precisarão apenas rezar por chuva. Em breve, eles terão uma forma de se proteger se as preces não forem atendidas.
A CME, que opera a bolsa de derivativos de Chicago, quer lançar ainda neste ano o primeiro contrato futuro do mundo ligado ao preço da água.
Se o produto vingar, grandes consumidores — como fazendeiros e indústrias — terão mais transparência de preço num mercado hoje opaco e poderão fazer hedge nos custos de uma matéria-prima cada vez mais escassa. O instrumento pode servir ainda como proteção contra a inflação e mudança climática.
Os contratos terão por base o Nasdaq Veles California Water Index (NQH20), índice criado em outubro de 2018 para acompanhar as transações de compra e venda de água no estado.
A volatilidade é alta.
Desde o começo do ano, o NQH20 subiu mais de 100%, em meio a uma seca histórica no inverno do Hemisfério Norte, que resultou no fevereiro mais seco dos últimos 100 anos. Tomando por base o início do verão, no entanto, os preços já recuaram cerca de 25%.
Por se basearem num contrato de índice do mercado de água na Califórnia, os instrumentos servirão especialmente para proteção de empresas e investidores com negócios no estado. Embora estejam abertos a todo tipo de investidor.
Mas, no comunicado ao mercado em que anunciam a criação do contrato, a CME e a Nasdaq afirmam que o problema da escassez hídrica não é exclusivo da região e que o produto pode servir de exemplo para outros mercados
“Com quase dois terços da população mundial sujeito a desabastecimento de água até 2025, a escassez de água apresenta um risco crescente para negócios e comunidades ao redor do mundo, particularmente para o mercado de água de US$ 1,1 bilhão da Califórnia”, disse Tim McCourt, executivo global de índices e produtos alternativos de investimento da CME, em nota.
Um risco para o sistema financeiro
A negociação do ativo ainda depende de aprovações regulatórias.
Mas, em entrevista ao Financial Times, um alto executivo da Commodity Futures Trading Comission (CFTC), o órgão que regula o mercado de derivativos americano, já disse aprovar a ideia.
“Ter um mercado robusto e transparente de futuros pode ajudar a alinhar de maneira mais eficiente a oferta e a demanda desse recurso vital”, disse Rostin Behnam ao FT, acrescentando que os derivativos ajudarão empresas e investidores a gerenciar o cada vez mais dramático risco de mudança climática.
Um comitê do CFTC liderado por Behnam divulgou neste mês um relatório afirmando que eventos climáticos extremos, como os incêndios florestais da Califórnia, são um risco para a estabilidade financeira dos Estados Unidos, no primeiro alerta do tipo feito por um regulador americano.
O relatório da CFTC pediu por mais inovação nos derivativos para “pensar como esses produtos são estruturados e como incorporar questões ligadas a sustentabilidade”.
Como em todo produto financeiro, o sucesso efetivo do derivativo e a efetividade do sinal de preço vai depender da adesão e da liquidez.
Hoje, contratos futuros relacionados a questões ambientais são um mercado de nicho.
A CME oferece derivativos climáticos, que permitem que os investidores se protejam contra variações de temperatura, há duas décadas.
Eles são usados por companhias do setor elétrico e produtores rurais para proteger contra mudanças bruscas no clima. Mas atualmente há apenas 4000 posições em aberto na bolsa.