
O Tesouro Nacional anunciou nesta quarta-feira (8) a estrutura financeira e os setores prioritários do terceiro leilão do Eco Invest, programa do governo para atrair recursos privados estrangeiros para financiar projetos verdes brasileiros.
Os recursos serão destinados à aquisição de participação acionária (equity) em startups que atuem com transição energética, infraestrutura verde, bioeconomia e economia circular – nos dois primeiros leilões, o financiamento foi via dívida.
Em um complexo e inovador arranjo, os bancos que receberem os recursos subsidiados do Tesouro devem oferecer benefícios tanto para os fundos de investimento em participações (FIPs), por meio de um capital catalítico para absorver perdas; quanto para o investidor estrangeiro final, com proteção contra a volatilidade cambial.
“Esse leilão traz solução para superar uma dor histórica de mercados emergentes, que é a volatilidade cambial”, disse Rogério Ceron, secretário do Tesouro. “A ideia é trazer segurança para quem investe e capital para quem transforma.”
A expectativa é que este leilão movimente entre R$ 2 bilhões e R$ 4 bilhões, a depender da demanda dos bancos e dos investidores.
Desse valor, um quarto virá do Tesouro e os outros três quartos os bancos e fundos devem captar junto a investidores estrangeiros e nacionais. Ou seja, no melhor cenário, o Tesouro entra com R$ 1 bilhão e os investidores com R$ 3 bilhões – uma alavancagem de três vezes.
O volume é substancialmente menor do que o mobilizado nos dois primeiros leilões, de R$ 46 bilhões e R$ 30,2 bilhões, respectivamente. “Os leilões anteriores eram para alavancar dívida, que tem valores maiores. O equity naturalmente envolve valores menores e instrumentos mais complexos, com mais variáveis”, afirmou Ceron.
O secretário indicou que uma medida de sucesso da concorrência seria viabilizar a constituição de três ou quatro fundos exclusivos ou dedicados ao programa, cada um com capital entre R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão, o tamanho médio de fundos deste tipo no mercado.
Setores para investimento
Os bancos serão o elo da cadeia que fará o dinheiro dos investidores e do Tesouro chegar às empresas investidas.
No leilão, eles têm até 19 de novembro para enviar suas propostas ao Tesouro, que dará prioridade para quem oferecer maior alavancagem e maior alocação em fundos de capital semente – que investem em empresas em estágio inicial de desenvolvimento. A alocação mínima exigida em fundos de capital semente é de 20% dos recursos.
Um outro critério é que pelo menos 20% dos recursos captados sejam com investidores estrangeiros.
Com o dinheiro em caixa, os fundos devem investir em participação de startups em 15 cadeias definidas pelo leilão, divididas em quatro eixos:
1) Transição energética: combustíveis de baixo carbono (SAF e biobunker); hidrogênio de baixa emissão de carbono; e-fuels; biogás e biometano; veículos elétricos, baterias e minerais críticos; baterias de armazenamento;
2) Infraestrutura verde para adaptação: soluções tecnológicas para construção sustentável; tecnologias de adaptação e monitoramento;
3) Bioeconomia: biofertilizantes e bioinsumos; biosaúde e superalimentos.
4) Economia circular: química verde e novos materiais circulares; gestão e valorização de resíduos sólidos; gestão e valorização de resíduos industriais e reciclagem de baterias.
O Tesouro listou três tipos de empresas elegíveis para investimentos: startups (faturamento anual de até R$ 20 milhões), empresas em expansão e spin-offs corporativos (ambas com receita de até 1 bilhão ao ano).
Estrutura
O ponto de partida do leilão é a estrutura de blended finance vista nos anteriores, em que o capital subsidiado entra para reduzir custos ou mitigar riscos, atraindo recursos privados em maior escala. Assim, o Tesouro vai emprestar aos bancos os recursos ao custo de 1% ao ano.
A partir daqui, o desenho da concorrência traz novidades que vão exigir complexas contas das tesourarias das instituições financeiras.
Esse dinheiro subsidiado deverá ser usado para estruturar dois mecanismos de incentivo: (1) mitigação de risco cambial para os investidores; e (2) mitigação de risco de performance, ou seja, capital catalítico para o fundo.
Proteção cambial
No caso do investidor, o banco precisa emitir uma opção de compra de um tipo de “seguro cambial” assim que o fundo de investimento chamar o capital.
A curva NDF (Non-Deliverable Forward) foi definida como base para reduzir o risco cambial. NDF é um tipo de contrato futuro de câmbio em que duas partes (uma empresa e um banco) acordam hoje uma taxa de câmbio para uma data futura determinada. No vencimento, se calcula a diferença entre a taxa contratada e a taxa de câmbio real. A diferença é paga em uma moeda conversível, geralmente o dólar americano.
De forma prática, a curva de NDF representa como o mercado projeta a taxa de câmbio em diferentes horizontes de tempo.
O leilão definiu que os bancos precisam oferecer, no mínimo, 10% de proteção acima da curva NDF para um prazo mínimo de cinco anos.
Isso garantiria que o investidor receba, em dólar, pelo menos metade do retorno em real do investimento, caso a moeda brasileira se desvalorize, explicou Mario Gouvea de Almeida, coordenador do Eco Invest no Tesouro Nacional.
“O investidor de fora sabe que, entrando por essa estrutura do Eco Invest, em qualquer cenário de câmbio que ocorra ele garante uma rentabilidade ainda acima de um título de renda fixa no exterior, bastante competitivo”, explicou.
Proteção contra perdas
Para o fundo, o banco poderá repassar o dinheiro subsidiado pelo Tesouro de duas formas: (1) por meio de um empréstimo com custo máximo de 5% ao ano; ou (2) compra de cotas numa classe segregada das dos investidores, em que o retorno máximo será limitado também a 5% ao ano.
Ao chegar no fundo, esse recurso catalítico tem a função de incremento de rentabilidade e mecanismo de absorção de primeiras perdas.
“Dado que o fundo vai tomar esse recurso [a um custo subsidiado] e vai aplicá-lo a uma taxa de mercado, significa que tem um ganho financeiro que é apropriado pela estrutura do fundo”, diz Almeida.
“Isso permite que o gestor seja mais ousado, que possa trazer projetos com maior risco, porque ele sabe que tem um suporte de performance. E o investidor tem mais esse mitigador, esse incentivo.”