Discretamente, o fundo de impacto da Vinci Partners fechou seu primeiro investimento no fim do ano passado. Foram cerca de R$ 60 milhões numa participação minoritária relevante na Pró Infusion, empresa especializada no fracionamento de medicamentos que fatura cerca de R$ 200 milhões.
A informação do investimento consta de material publicitário da distribuição de cotas do fundo para investidores de alta renda da XP, que levantou R$ 300 milhões.
A oferta para o varejo, encerrada no fim de dezembro, foi um dos fatores a alavancar a captação total da carteira, batizada de Vinci Impacto e Retorno IV, que se aproxima de R$ 1 bilhão, superando a previsão inicial da gestora de atingir entre R$ 600 e R$ 800 milhões.
A Vinci não comenta sobre o fundo. Está em período de silêncio porque a captação segue em aberto e também porque a gestora está em vias de um IPO.
Com sede em São Paulo, a Pró Infusion faz o fracionamento de medicamentos para tratamento de câncer e também de nutrientes para alimentação parental de pacientes em terapia intensiva.
A lógica é porcionar e distribuir as doses exatas, reduzindo o desperdício e aumentando a eficiência da cadeia.
Grandes hospitais, com escala, têm capacidade de comprar grandes quantidades dos insumos necessários e fazer eles próprios o mix para ministrar aos pacientes. Mas, para hospitais e clínicas menores, essa equação é complexa.
Muitos componentes têm vida útil de poucos dias e, em geral, a conta do desperdício chega ao paciente, encarecendo tratamentos. Nos Estados Unidos e na Europa, o fracionamento é muito comum, mas no Brasil ainda é pouco difundido.
Com os recursos injetados pelo fundo, a empresa, que hoje só atua na Grande São Paulo, vai acelerar seu plano de expansão nacional, primeiro para Curitiba e Rio de Janeiro. Também vai investir em novos segmentos de medicação fracionada, como o oftalmológico.
O dinheiro servirá ainda para executar um plano de levar o fracionamento de quimioterapia para Santas Casas do interior do país.
Atualmente, há um piloto desse projeto em São Gabriel, no Rio Grande do Sul. Sem escala para montar sua própria área de infusão, antes a Santa Casa precisava deslocar os pacientes em tratamento para Porto Alegre, com os custos de transporte e hospedagem pagos pela prefeitura. Com o fracionamento, mais pacientes têm sido atendidos na própria cidade, com o mesmo dinheiro.
Os planos da Pró Infusion são de chegar a 10 a 15 Santas Casas nos próximos três anos.
Impacto com intenção
O Vinci Impacto e Retorno está sob a gestão de José Pano, conhecido no mercado como ‘Pepe’, um veterano que já foi Pactual e UBS e CEO da Cecrisa. Na Vinci, foi o responsável pelas carteiras no Nordeste.
No total, o fundo deve fazer de nove a 11 investimentos em empresas com faturamento entre R$ 50 milhões e R$ 400 milhões por ano. Do valor captado, 35% devem ser alocados para negócios na região Nordeste.
Trata-se da primeira estratégia da gestora com a intenção de gerar impacto ambiental e social positivos com os investimentos desde a concepção.
De certa forma, o fundo é uma continuação de dois fundos de private equity para investimento no Nordeste geridos pela gestora. No último deles, a casa passou a medir indicadores de desenvolvimento socioambiental por conta própria, mas ainda não existia o componente da intencionalidade.
Na nova estratégia, a ideia foi ir além.
Para que a intenção constasse desde a concepção, a Vinci contratou a consultoria da Sitawi para construir a estratégia. O ponto de partida é uma lista de exclusão de setores que não podem entrar na carteira e funciona como um primeiro filtro.
No sentido contrário, há uma lista de setores preferenciais: saúde, educação, varejo especializado, ‘serviços de valor agregado nos quais a tecnologia seja um pilar chave’, tecnologia de informação e alimentação saudável.
Dentro dos setores escolhidos, é pré-requisito que a empresa 1) não tenha acesso a capital para executar sua estratégia ou 2) no caso de ter acesso a capital, que seja uma empresa que gera impacto no seu negócio e que possa alavancar esse impacto com o capital do fundo.
No caso da Pró Infusion, por exemplo, a empresa tinha acesso a capital, mas a avaliação foi que a entrada do fundo poderia alavancar o impacto social do negócio.
A gestora também avalia se o empreendedor, que continuará à frente do negócio, tem consciência do impacto que gera e se isso é importante para ele. E, por último, se há receptividade por parte da investida de incorporar métricas de acompanhamento do desempenho socioambiental e transformá-las em componentes da política de remuneração da diretoria.
De ‘A’ a ‘D’
Foi criado um índice de impacto, que leva em conta fatores ESG. Por meio de um questionário, com perguntas quantitativas e qualitativas, a empresa recebe uma nota, que pode variar de ‘D’ a ‘A’.
Sempre que a Vinci tem uma empresa em vista, a Sitawi faz a due diligence de impacto para chegar à avaliação. A Pro Infusion, por exemplo, é um ‘C+’ na escala, sinalizando que há bastante a avançar, principalmente no atendimento à população de baixa renda.
No momento de levar a empresa ao comitê de investimentos, além do pacote normal de retorno e crescimento, também é apresentada a tese de impacto. Uma vez aprovado o investimento, os compromissos de impacto são formalizados nos contratos, e a evolução é monitorada pela equipe da Sitawi durante todo o ciclo de vida do fundo.
Para os mais puristas, o resultado é um fundo de impacto que não é considerado um ‘puro sangue’. Mas numa matriz de investimentos sustentáveis, ele certamente está um passo à frente de um fundo ESG.
Um grande desafio deverá ser a estratégia de saída dos investimentos: não fica claro se a gestora aceitará ou não vender sua participação para uma empresa ou investidor não alinhado à ideia de manter a geração de impacto.
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