SulAmérica quer captar R$ 1,5 bi em dívida ESG com meta polêmica de acesso a saúde mental

Emissão gera questionamento por causa do desenho da meta, que inclui ações de conscientização e tratamento, para clientes e por meio de ações sociais

SulAmérica quer captar R$ 1,5 bi em dívida ESG com meta polêmica de acesso a saúde mental
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A seguradora SulAmérica acaba de colocar na rua uma emissão de R$ 1,5 bilhão em debêntures com compromisso ESG que promete ser polêmica por causa do indicador e meta escolhidos.

O KPI é promover o acesso à saúde emocional e a meta é alcançar 30 mil pessoas até dezembro de 2024 e 150 mil pessoas até dezembro de 2026. A tese da empresa — e também o novo posicionamento da marca desde o fim de 2020 — é que é necessário tratar a saúde integral dos segurados, o que inclui a saúde mental, e que essa ainda é uma área que demanda ações específicas.

Que saúde mental é um problemão — ainda mais com o mundo emergindo de uma pandemia com uma epidemia de ansiedade e depressão — ninguém tem dúvida. Que existe um grande tabu para que as pessoas aceitem o problema e busquem tratamento, idem.

Mas, na sequência do road show feito pela companhia na tarde de hoje, em que muitos gestores ainda não tinham tido acesso aos documentos da oferta, a grande dúvida apontada por investidores e especialistas em ESG é o quanto o indicador e a meta são de fato relevantes no contexto da seguradora.

Aos detalhes: a SulAmérica diz que a metas poderão ser cumpridas por meio da oferta de ações de conscientização, diagnóstico ou tratamento. 

Dentro do quesito conscientização cabem palestras, oficinas, treinamentos técnicos e workshops, em que os participantes, desde que devidamente registrados, contarão para compor o número. Como diagnóstico ou tratamento, contarão não apenas consultas propriamente, mas também acesso a ferramentas como questionários e avaliações ou a orientações realizadas por profissionais de saúde emocional.

São coisas que exigem esforços e investimentos distintos e que também causam impactos completamente diferentes e, no entanto, a empresa considera todos juntos, sem metas específicas para cada um dos itens.

A referência oferecida aos investidores é que em 2020 a companhia impactou 3 mil pessoas com ações relacionadas a saúde mental, sendo 1 mil em projetos sociais e cerca de 2 mil em ações de mapeamento de transtornos mentais entre segurados.

Pessoas próximas `à empresa dizem que o desenho das ações foi feito a partir da experiência passada da própria seguradora em tentar ampliar os cuidados com a saúde emocional. Por causa do tabu existente em torno da saúde mental, partir diretamente para o tratamento não funciona e, portanto, é preciso uma ação mais ampla de conscientização.

Outra coisa que trouxe certo incômodo a investidores foi o fato de que no máximo 30% da meta será cumprida dentro da atuação comercial da seguradora, com clientes atuais e potenciais clientes, e no mínimo 70% virá de programas sociais, ou seja, ações filantrópicas. Incluir investimentos sociais nas metas de dívidas ESG não é algo que agrade aos investidores, que preferem metas relacionadas ao core do negócios das emissoras.

A oferta conta com parecer independente da consultoria Bureau Veritas, que atestou a adesão da operação às regras de autorregulação para ofertas ESG, e considerou o indicador e metas ‘suficientemente materiais, abrangentes, confiáveis e desafiadores’.

Recompra antecipada

Também desagradou gestores o fato de a companhia ter a opção de recomprar antecipadamente os papéis dos investidores em novembro de 2024, antes da aferição da primeira meta ESG. “No limite, a empresa faz o marketing e se livra da obrigação do compromisso”, diz um gestor de fundos.

As debêntures serão vendidas numa oferta pública com esforços restritos, para até 50 investidores profissionais, ou seja, com ao menos R$ 10 milhões aplicados.

Os papéis terão duas séries, ambas de R$ 750 milhões. Na primeira, o prazo é de 5 anos e a taxa máxima será de CDI mais 1,5% ao ano. Na segunda série o prazo é de 7 anos e a taxa parte de CDI + 1,7% ao ano. A taxa final será definida no processo de bookbuilding, dependendo do apetite dos investidores.

A meta ESG passará por duas verificações. Se falhar em cumprir o compromisso de 2024, a taxa de juro paga pela companhia subirá em 0,125%. Na verificação de 2026, o step up da taxa também é de 0,125%. Se cumprir a primeira meta e falhar na segunda, a taxa sobe 0,25%. O encerramento da oferta acontecerá dentro de um mês.

Mesmo considerando que a SulAmérica é um empresa do setor financeiro, o prêmio dos papéis foi considerado baixo por gestores para uma emissão com rating ‘A’. Outras ofertas de companhias de menor risco, com rating ‘AA’ e ‘AAA’, estão pagando taxas semelhantes atualmente. “Esperaria algo acima dos 2% mais o CDI”, diz um outro gestor.