
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) lançou nesta terça-feira (22) uma iniciativa para liberar espaço no balanço dos bancos, para que eles façam novos empréstimos para projetos de mitigação e adaptação climática.
Isso seria feito a partir da securitização das carteiras de crédito existentes hoje. O desenho da iniciativa é, de fato, inédito, mas para sair do papel terá que contar com o poder de articulação de diversos atores: bancos, gestoras, seguradoras, reguladores de mercados de capitais e investidores. O BID não vai colocar capital para a compra das carteiras, atuando como facilitador.
Batizado de ReInvest+, a proposta é adequar a demanda de capital para os requisitos que os investidores globais pedem.
“Até agora, pedimos aos investidores institucionais que mudassem seu apetite por risco para investir em projetos em países em desenvolvimento. Essa abordagem se mostrou cara e difícil de escalar”, afirma Ilan Goldfajn, presidente do Grupo BID. “Com o ReInvest+, estamos mudando a lógica. Os projetos devem ir aonde o dinheiro está.”
A ideia é transformar carteiras de empréstimos de bancos comerciais em títulos financeiros com grau de investimento, ou seja, com menor risco de crédito, de câmbio e político. Se tornariam, assim, ativos elegíveis para grandes investidores globais, que buscam títulos de elevada qualidade de crédito e em moeda forte.
Ao vender esses ativos lastreados na carteira dos bancos, o mecanismo retira esses empréstimos dos balanços dessas instituições, abrindo espaço para a concessão de crédito novo. Isso criaria um efeito multiplicador do financiamento climático, daí a ideia de reinvestimento contida no nome da iniciativa.
O programa é global, mas vai começar pela América Latina e Caribe. É estimado que os países em desenvolvimento, exceto a China, precisem de pelo menos US$ 1,3 trilhão por ano para financiar a mitigação dos eventos climáticos e reduzir emissões.
Propostas
Uma chamada pública foi lançada para parceiros interessados em apresentar propostas de securitização – ou seja, soluções para empacotar as carteiras de crédito (e seus recebíveis) em um veículo de investimento. Bancos comerciais e internacionais podem enviar suas propostas até 24 de outubro. Os selecionados e seus planos serão apresentados pelo BID na COP30, em novembro.
O BID não vai entrar com capital, mas como facilitador com as experiências que acumula tanto com setor privado quanto público. Ele vai definir critérios de compra de ativos, garantir transparência e oferecer estruturas financeiras para mitigar riscos, como o cambial.
“Vamos atuar como um organizador e co-criar com aqueles que vão realmente fazer o negócio, que são bancos e gestores de ativos. Buscar os estruturadores para trabalharmos juntos nas oportunidades e nos desafios de cada operação e cada país”, diz Anderson Caputo, chefe da divisão de conectividade, mercados e finanças do BID. “O objetivo é chegar em um formato em que os investidores entrariam.”
A chamada pública pede que sejam apresentados planos para aquisição de carteiras de créditos nos próximos 12 meses após a seleção. Um estudo encomendado pelo BID estima que na América Latina e Caribe há cerca de US$ 500 bilhões em empréstimos elegíveis, cifra que chegaria a US$ 3 trilhões globalmente.
“Para vender esse produto, normalmente os estruturadores criam tranches, com uma cota sênior e uma júnior, com diferentes níveis de riscos. É esse tipo de desenho que devemos receber nas propostas, com mecanismos de como eles pretendem administrar os riscos”, diz Caputo.
Serão definidas condições de elegibilidade com parâmetros de sustentabilidade para aquisição de carteiras. Isso é importante para que os ativos estejam enquadrados na demanda por ativos verdes de investidores institucionais.
Do outro lado, haverá critérios para que os empréstimos sejam comprados apenas se os bancos vendedores se comprometerem a reinvestir os recursos em setores alinhados com os planos nacionais de descarbonização de seus países (NDCs, na sigla em inglês). O Brasil, por exemplo, apresentou em julho o plano de como pretende obter as reduções de emissões de carbono prometidas em sua NDC.
Segundo o BID, isso criaria um ciclo auto sustentável de capital, com o dinheiro institucional fluindo para projetos, empregos locais e crescimento sustentável.
Riscos
Para transformar ativos de maior risco em grau de investimento serão necessários diversos mecanismos para mitigação dos riscos.
O BID prevê soluções de seguros de carteira para riscos políticos e cambiais, precificados comercialmente, ou seja, sem subsídio. “As estruturas vão envolver muito a indústria de seguros, vamos identificar quem são os players que podem oferecer essas coberturas”, diz Caputo.
Segundo ele, nem todas as operações vão envolver risco de câmbio, uma vez que parte dos portfólios de bancos comerciais já está em dólar, diferentemente do Brasil, onde a maior parte dos empréstimos é feita em moeda local.
Nestes casos, também estão previstas soluções de derivativos como as que o BID já está desenvolvendo para outras iniciativas, como o Eco Invest – programa do governo federal brasileiro para atrair recursos privados estrangeiros para financiar projetos verdes locais.
Quanto ao risco de crédito, Caputo diz que ele deve ser atenuado pelo perfil dos projetos que compõem as carteiras de empréstimos de bancos comerciais. “São projetos já em execução, que estão performando, com um histórico comprovado”, afirma.