No Web Summit Rio, empreendedor é cortado por falar em português

Guilherme Barbosa, CEO da startup climática ECO55, teve sua apresentação interrompida e precisou concluir em inglês

No Web Summit Rio, empreendedor é cortado por falar em português
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No Web Summit Rio, um empreendedor teve sua apresentação interrompida por falar em português para um público majoritariamente brasileiro. 

Guilherme Barbosa, CEO da startup de clima ECO55, participava na tarde de ontem do painel Building a Sustainable Future, em que 15 startups tinham apenas dois minutos para vender seu peixe – ou fazer um pitch, para ficar no jargão startupeiro em inglês.

Barbosa era o sétimo empreendedor a se apresentar. Antes dele, todos haviam falado em inglês, seguindo estritamente a recomendação dos organizadores do evento.

Mas ele resolveu divergir e falar em português.

Estava no meio de sua fala quando o mestre de cerimônias, um brasileiro, entrou no palco e cortou sua apresentação, repreendendo-o em inglês e advertindo que ele deveria seguir em inglês ou parar ali mesmo.

Barbosa foi aplaudido pela plateia e concluiu, em inglês, sua fala.

“A pauta climática é tão difícil de ser compreendida que tomei a decisão de torná-la mais acessível em português”, afirma.

Nas contas do CEO da startup, pelo menos 300 pessoas acompanhavam o evento e, estima ele, 90% do público era de brasileiros. Segundo a organização, nesta edição, o número de participantes totaliza 34.397 pessoas, vindas de 102 países. Quem circula pelo evento encontra investidores de diferentes partes do mundo.

“Eu já tinha planejado que iria falar em português porque eu preciso fazer com que o brasileiro entenda, meu público é o brasileiro. Não estou buscando investidores, estou buscando gente para tomar ação climática aqui.”

A Eco55 é uma plataforma de conteúdo e ferramentas para auxiliar na jornada de descarbonização dos negócios.

Em duas edições anteriores do evento, no Web Summit Lisboa 2022, e no Web Summit Rio do ano passado, Barbosa já havia tomado a mesma decisão, sem ter sido repreendido.

Na edição carioca, a participação dos empreendedores faz parte do programa Startup Showcase. Barbosa pagou R$ 1.147,50 por um pacote com direito a três ingressos, um stand no evento e um pitch.

“A maturidade do brasileiro na pauta climática é tão baixa que exige que eu faça esse pitch em português. Não posso perder nenhuma oportunidade de dizer para vocês que nós temos menos de dez anos para reduzir as emissões de nossas empresas para que a gente tenha a chance de net zero em 2050”, disse ao começar sua apresentação.

Ele conta que, ao descer do palco, cerca de 20 pessoas o esperavam para parabenizá-lo pela atitude. “A TV chinesa me chamou para uma entrevista, e investidores americanos acharam interessante a iniciativa.”

Barbosa diz que não vê problemas no fato de o evento ser falado em inglês, por contemplar, dessa forma, os tomadores de decisão. Mas faz uma ponderação.

“Quando falamos de inovação, também falamos de diversidade e inclusão. Só 4% dos brasileiros falam inglês fluentemente, então, o evento deixa de ter uma premissa que a inovação exige: a inclusão.”

O empreendedor diz que o evento poderia tornar opcional o uso da língua inglesa.

O que diz o Web Summit

Procurada pela reportagem, a organização do Web Summit afirmou incorporar “a cultura de cada uma de nossas cidades-sede ao nosso evento de diversas maneiras.”

“No geral, 20% das nossas palestras são conduzidas em português. Também temos traduções ao vivo em quase todos os palcos, traduzindo todas as palestras do inglês para o português e do português para o inglês, para garantir que todos os participantes se sintam confortáveis ​​no evento.”

Em relação ao episódio envolvendo a startup, a organização afirmou que falou com o fundador da ECO55 após a situação e que, “embora soubesse que o Startup Showcase é em inglês, ele queria fazer a sua palestra em português para transmitir a sua mensagem sobre as alterações climáticas ao seu mercado local.”

“Respeitamos isso e esperamos tê-lo novamente no Startup Showcase em eventos futuros”, finalizou a organização em resposta por e-mail.

Barbosa diz que dois representantes do Web Summit o abordaram no começo da tarde desta quinta-feira para falar sobre o que havia acontecido. “Eles entenderam, mas não houve um pedido de desculpas e nem propuseram alguma compensação ou retratação.”