O número de brasileiros que utilizam tratamentos com cannabis medicinal no país cresceu 56% no último ano. São hoje 672 mil pacientes, segundo o 3º Anuário da Cannabis Medicinal no Brasil, divulgado nesta terça-feira (26) pela Kaya Mind, startup especializada em dados e inteligência de mercado no segmento.
O mercado de medicamentos à base de canabidiol – ou CBD – movimentou R$ 853 milhões este ano, um aumento de 22% em relação a 2023. A projeção da startup é que esta marca chegue a R$ 1 bilhão antes do fim de 2025.
O canabinóide é usado no tratamento de diversas patologias, entre elas epilepsia, depressão, Alzheimer, Parkinson e autismo.
Ainda que lentos, alguns suportes regulatórios contribuíram para este crescimento. No último dia 13, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou juridicamente possível a concessão de autorização sanitária para plantio, cultivo e comercialização do cânhamo industrial – uma variação da cannabis – por pessoas jurídicas, para fins exclusivamente medicinais e farmacêuticos.
“Foi um avanço jurídico importante, mas ainda é muito pouco”, diz Maria Eugênia Riscala, CEO da Kaya. Para ela, o crescimento do setor em 2024 tem a ver com o que batizou de “momento Brasil”.
“Falou-se muito sobre cannabis, para o bem ou para o mal. Foi o ano com o maior número de eventos do segmento. E, além da decisão do STJ, teve a do STF, igualmente importante.”
Em junho, o tribunal descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal e estabeleceu a quantidade de até 40 gramas ou seis plantas fêmeas como limite para diferenciar usuário e traficante.
Cannabis via SUS
Este ano também começou, em junho, 18 meses após a norma ser sancionada pelo governador paulista Tarcísio de Freitas, a distribuição de medicamentos à base de extrato de CBD isolado pelo SUS em São Paulo. Foi a maior licitação para fornecimento de canabidiol via sistema público no país, vencida pela mineira Ease Labs.
Atualmente, cerca de 15 Estados já têm leis que preveem o fornecimento do canabidiol pelo SUS. Mas a falta de um marco regulatório federal ainda onera os cofres públicos e encarece os produtos.
Como a planta não pode ser plantada no país – a decisão do STJ ainda depende de regulamentação a ser editada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela União –, a produção tem de acontecer com insumos importados. Para conseguir os medicamentos gratuitamente, a única saída para muitos pacientes ainda é o processo judicial.
Segundo o anuário da Kaya Mind, em 2024 o Brasil gastou mais de R$ 100 milhões com a judicialização de produtos derivados da cannabis. A regularização abriria um caminho seguro para o desenvolvimento de uma indústria nacional, com portfólios mais diversificados e acessíveis.
Cerca de 2180 produtos de cannabis medicinal estão disponíveis atualmente no mercado brasileiro, em diferentes formas farmacêuticas, como óleos, cápsulas, sprays e tópicos.
Hoje há 413 empresas internacionais exportando produtos à base de cannabis para o país. A importação ainda é a principal via de acesso – em 2024, 47% foram obtidos por este meio, 31% em farmácias e 22% via associações. As associações têm autorização judicial para cultivar a planta e produzem o canabidiol desde a semente.
“A regulamentação segue a passos muito lentos”, diz Riscala. “A RDC 327 é de fim de 2019, de antes da pandemia, quando o país vivia sob outro governo. É preciso que ela seja atualizada.” A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 327 trata de procedimentos para a concessão de autorização sanitária para a fabricação e a importação da cannabis medicinal no Brasil.