Com dez anos de estrada, o fundo de ações Neo Future sempre se manteve fiel à fórmula de investir em poucas empresas, com as quais cultiva um relacionamento próximo, com cabeça de sócio. Desde o ano passado, a interação com as investidas inclui um ingrediente novo.
Para cada uma das sete empresas do portfólio, a equipe do fundo passou a identificar os temas ambientais, sociais e de governança relevantes para pautar a agenda de engajamento com as companhias. Com a lente de identificar riscos e oportunidade para os negócios, a cada ano são selecionados um ou dois tópicos por empresa.
“O objetivo do fundo é o retorno financeiro, não é um fundo de impacto. O mandato é buscar resultado. Mas é um fundo que integra ESG ao processo de gestão”, diz Andrea Bottcher, líder ESG do fundo.
Fundada há quase 20 anos, a gestora tem R$ 5 bi em ativos sob gestão e funciona como uma holding de várias assets. Cada um dos cinco produtos, que tem equipe própria, agora levar em conta critérios ESG, o que está refletido na primeira carta sobre o tema que a Neo acaba de divulgar.
Mas foi o Neo Future, com sua política de atuação próxima das companhias que recebem investimento, que entrou no radar de investidores que buscam ativos ESG, como a Wright Capital.
Para o gestor do Future, Henrique Alvares, considerar fatores ESG no processo de investimento conversa com a essência do fundo. “A gente se vê como responsável pelo que as empresas fazem. Temos papel relevante de apoio e cobrança e temos visão proprietária de longo prazo. Só investimos onde queremos ficar pelos próximos dez anos.”
Na carteira de R$ 700 milhões estão os papéis de Alpargatas, Camil, GPS, Hapvida, Localiza, Petz e Vivara.
Com a locadora de carros Localiza, por exemplo, a ênfase tem sido grande no pilar ambiental e também no de inovação.
Como os quase 300 mil carros da frota são grandes emissores de gases de efeito-estufa, no começo do ano passado o fundo iniciou conversas sobre a importância de a companhia realizar o inventário das emissões do chamado escopo 3, que incluem o uso dos veículos pelos clientes.
O inventário foi concluído no ano passado e será divulgado no próximo relatório de sustentabilidade da Localiza. “Claro que não fomos os únicos protagonistas disso. Houve demanda de outros investidores”, diz Bottcher. A companhia ainda não tem metas de descarbonização.
O fundo também tem provocado a empresa a olhar para as tendências futuras que vão desafiar o status quo do setor, como a eletrificação de frotas.
Outro exemplo que ela cita é da rede de joalherias Vivara. O foco é na cadeia de valor e na origem dos insumos, muito suscetíveis a problemas sociais e ambientais. Hoje, o ouro vem de um único fornecedor certificado, a mineradora AngloGold Ashanti.
A próxima fronteira, diz Bottcher, é implementar um sistema de auditoria. “Não basta ser certificado. A meta é ter 100% da cadeia auditada para condições trabalhistas e ambientais.”
Para ajudar a identificar o que é relevante em cada empresa, o Neo Future se baseia na metodologia do padrão internacional do Sustainability Accounting Standards Board (Sasb). “As empresas ainda estão perdidas, e é importante as gestoras se unirem nessa agenda de materialidade para ajudá-las. E o Sasb ajuda a mapear os riscos para cada setor”, diz Bottcher.
Ela afirma que a maioria das empresas ainda tende a confundir ESG com filantropia. “Nós tentamos mostrar como isso pode gerar valor para as companhias e estar inserido no modelo de negócios.”
ESG e geração de alpha
O Neo Future exibe um retorno anual de 24% ao ano desde o lançamento.
Quando comenta sobre como o ESG se encaixa na geração de alpha (retornos acima dos de mercado), Henrique Alvares deixa claro que o fundo não adota a filosofia de buscar as empresas ‘best in class’.
“O que já está na mesa, num conceito de mercados eficientes, já está precificado. É o que a gente vai conseguir agregar e a companhia vai conseguir entregar que fará com que a gente seja bem sucedido no investimento”, diz ele.
No esforço para trazer o ESG para a equação, uma das grandes dificuldades encontradas pela gestora é a falta de padronização e disponibilização de informações pelas empresas.
“Usamos scores ESG disponíveis no mercado, embora sejamos céticos quanto à profundidade”, diz Bottcher. Além disso, para complementar a análise, a gestora contrata o serviço de verificação de controvérsias da consultoria Sitawi. E o CDP entra com o banco de dados de emissões de carbono.
A gestora também construiu um score card ESG próprio para acompanhar a evolução das informações divulgadas pelas companhias. “É um sistema que atribui notas de 1 a 5 com base no nível de disclosure. Ele não avalia as políticas em si”, diz a executiva.
Além da recém-publicada carta ESG, a Neo criou um plano de ação de três anos. Uma das decisões é medir ainda neste ano a pegada de carbono dos portfólios dos fundos. A ideia, por ora, é medir e entender, sem fixar metas ou compromissos.
“Não adianta a gente se engajar com as empresas e não fazer o dever de casa”, afirma Bottcher.