A Vox Capital, mais conhecida por seus fundos de venture capital de impacto, e a securitizadora Vert, estão trabalhando num fundo de financiamento à recuperação de pastagens degradadas e estímulo a modelos de produção agrícola sustentável na Amazônia e no Cerrado.
Além de uma linha de crédito de mais longo prazo, pequenos e médios agricultores vão receber assistência técnica para transicionar para um modelo mais verde. O principal diferencial, contudo, ficará por conta de um seguro de renda, que terá por base o volume de produção obtido nos últimos anos via o modelo tradicional de manejo.
É uma forma de dar segurança para fazer a transição, diminuindo a resistência inicial de que a mudança possa causar variações na receita auferida.
“O fundo deve ser um facilitador de crédito para o produtor rural, com transferência do uso do solo”, conta o sócio e CIO da Vox, Gilberto Ribeiro.
O produto é também mais um capítulo na recente história da Vox no mundo agro. A estruturação de um modelo de dívida também é uma alternativa para diversificação da gestora, focada em venture capital, em um momento de aperto dos mercados.
Batizado de Vox Vert Land Transition Fund, o fundo foi uma das soluções inovadoras para soluções climáticas selecionadas para participar do programa de aceleração do Global Innovation Lab for Climate Finance, o Lab, financiado pelo Governo Britânico. Serão sete meses no programa, para análises, testes e definições.
Os parceiros ainda estão desenhando a estrutura da iniciativa, que vai ter um modelo de blended finance – em que recursos filantrópicos ou a fundo perdido entram para reduzir o risco e permitir a entrada de capital comercial, em mais escala.
“Podemos entrar por exemplo com um modelo de FIDC, com cotas subordinadas, com mais risco, e seniores, com menos risco”, afirma a vice-presidente da ESG da Vert, Paula Peirão.
Outro mecanismo em estudo é um fundo garantidor, formado por capital concessional e que correrá em paralelo ao de transição, para financiar garantia de renda ao produtor.
O plano é captar ao menos US$ 100 milhões, com um primeiro fechamento de US$ 50 milhões até meados do próximo ano. A captação, no entanto, deve começar apenas em setembro, durante a Semana do Clima em Nova York.
A expectativa é que, com o uso do crédito, ao menos 100 mil hectares nos dois biomas escolhidos sejam impactados. O tamanho das produções atendidas deve variar de 500 a 5 mil hectares, a depender da área de atuação.
O fundo poderá dar crédito para recuperação de áreas degradadas com produção de grãos, manejo sustentável do gado associado a aumento de produtividade, implementação de sistemas integrados com diferentes espécies agrícolas, agrofloresta e reflorestamento e financiamento da bioeconomia.
“É impossível fazer essa transição sem assistência técnica. Ao receber a linha de crédito, a assistência já deve ser disponibilizada”, diz Peirão. “E, caso dê algo errado, o produtor ainda terá o seguro”.
Para estar apto a receber o financiamento, o produtor terá de atender a critérios mínimos, como desmatamento zero em sua propriedade desde 2020 e práticas de proteção à floresta e ao ecossistema de acordo com o Código Florestal.
Esses critérios estão em linha com a iniciativa Inovação Financeira para Amazônia, Cerrado e Chaco (IFACC), capitaneada por The Nature Conservancy (TNC), Tropical Forest Alliance (TFA) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e que visa acelerar empréstimos e investimentos para a produção de carne bovina e soja nesses biomas.
Transição na ponta
Investir na produção agrícola sustentável é uma das ações necessárias para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e contribuir para a economia com menor impacto sobre o planeta.
Uma análise do MapBiomas mostra que a maior parte dos solos convertidos no Brasil são dedicados a pastagens, com 154 milhões de hectares – o equivalente a todo o Estado do Amazonas. Metade dessa área tem algum nível de degradação.
O Lab recebeu cerca de 150 inscrições ao redor do mundo, diz Phillipe Kafer, que lidera a iniciativa no Brasil. No país, foram 16 projetos, todos voltados para lidar com o desmatamento ou uso da terra – principais responsáveis pelas emissões de gases do efeito estufa brasileiras.
O país é campeão na exportação de soja e carne bovina, mas o custo ambiental também tem acompanhado as cifras. A pecuária é responsável por cerca de 93% do desmatamento na Amazônia e 70% no Cerrado, estima a TNC. Mais de 25% das pastagens do Brasil estão na Amazônia e 33%, no Cerrado.
Kaffer diz que o fundo da Vox e da Vert chamou a atenção dos avaliadores por ser atrativo também para o produtor rural e, através do seguro de renda, promover um mecanismo de transição que dá segurança entre eles.