A maioria dos hospitais brasileiros imobiliza capital próprio na compra de caros equipamentos. A Clean Medical quer mudar essa realidade e acaba de receber um aporte de aproximadamente R$ 70 milhões para escalar seu modelo de aluguel de aparelhos hospitalares.
O dinheiro veio da GEF Capital Partners, gestora de private equity com temática de sustentabilidade, numa aposta de que a locação não só libera capital para os hospitais, como aumenta a vida útil das máquinas, eleva a oferta de leitos hospitalares, faz a tecnologia chegar a hospitais menos abonados e ainda reduz o lixo eletrônico.
“Saindo dos grandes centros, o nível tecnológico e de gestão dos hospitais cai muito”, diz Lucas Meneguetti, CEO da companhia. “Acreditamos que esse investimento vai nos ajudar a expandir o modelo de aluguel e a aproveitar as oportunidades no país inteiro.”
A Clean Medical cresceu muito durante a pandemia, e em agosto contratou a assessoria financeira da JK Capital para encontrar um sócio investidor.
Sob a gestão da família Meneguetti há pouco mais de uma década, a Clean Medical tem atualmente mais de 3.000 equipamentos alugados em 280 hospitais. “Estamos falando de máquinas importadas”, diz Meneguetti. “Em alguns casos os consertos podem demorar até dois meses.”
Na cidade de São Paulo, principal mercado da Clean Medical, os chamados de assistência são atendidos em até quatro horas. Caso não seja possível resolver o problema na hora, a empresa repõe o equipamento.
Ou seja, a locação amplia a disponibilidade dos equipamentos.
A ociosidade representa receita perdida para os hospitais e, é claro, menos leitos hospitalares – um assunto que vem dominando o noticiário global há quase dois anos, por causa da pandemia.
Mais capilaridade
Os principais produtos oferecidos pela Clean Medical são ventiladores pulmonares e monitores multiparâmetros, ambos equipamentos essenciais em UTIs.
Hoje, a regra é que os hospitais – dos mais tecnologicamente sofisticados dos grandes centros aos regionais e de menor porte – comprem e tenham de lidar com a manutenção.
E essa é só uma parte do problema. Quando chega a hora de fazer um upgrade, o hospital não pode passar o equipamento adiante. As opções são fazer um trade-in com o fabricante ou então descartá-lo.
Mas muitas vezes os aparelhos descartados estão em perfeitas condições de uso, só não são de última geração.
Alguns desses esquipamentos acabam no mercado negro, seja para o uso das peças ou mesmo em outros hospitais. Mas a prática é ilegal, e obviamente não há nenhum tipo garantia do fabricante.
A Clean Medical aposta que o modelo de aluguel pode permitir uma vida muito mais longa para esses equipamentos.
“Queremos medir na vírgula esse ganho na eficiência do uso desses recursos e também a longevidade dos equipamentos”, diz Tiago Gomes, vice-presidente da GEF. “Acreditamos num impacto social importante, pois vamos chegar a hospitais em regiões do país que talvez não tivessem esse acesso de outra maneira.”
Outro impacto esperado pela gestora é a redução do lixo eletrônico. Existem regras estritas para o descarte desses equipamentos, mas a realidade é que elas raramente são cumpridas fora dos hospitais de ponta.
“A Clean Medical tem políticas claras para evitar o aumento do e-waste e para a reciclagem com os fabricantes”, afirma Estevan Taguchi, diretor do GEF.
Vendendo a ideia
O dinheiro será utilizado em duas frentes. A primeira é a expansão da força comercial.
O mercado potencial é de 2.400 hospitais, considerando somente os privados, que são o foco da companhia. (Ao todo, o país tem cerca de 5.500 hospitais.)
O objetivo é expandir a presença em todo o território nacional, o que deve exigir também a criação de centrais regionais para a prestação de assistência técnica ágil.
Parte do trabalho será vender a ideia. “Muitos hospitais nem sabem que existe a opção de aluguel”, diz Meneguetti. “Encontramos equipamentos em uso há 30 anos.”
O outro foco é ampliar o menu de produtos, oferecendo máquinas de mamografia ou ultrassom, por exemplo. Meneguetti afirma que, nos Estados Unidos, quase a totalidade dos hospitais aluga seus equipamentos. Lá, uma das principais referências é a Agiliti Heath, que fez seu IPO em abril do ano passado e tem consolidado o mercado.
Com o tempo, a expectativa é que haja um fluxo constante de equipamentos mais antigos – mas não obsoletos – dos grandes centros para os hospitais regionais.
A chegada do GEF Capital também deve acelerar o processo de profissionalização da Clean Medical.
A empresa nasceu quase por acidente. Julio Eduardo Meneguetti tinha uma gráfica, mas os negócios começaram a ficar difíceis depois do estouro da bolha imobiliária, em 2008.
Foi quando, por meio de um amigo, ele soube da existência da RD Medical, então uma pequena startup de aluguel de equipamentos hospitalares.
“Meu pai comprou os 45 aparelhos e a carteira de clientes”, diz Lucas.
Julio vai assumir a presidência do conselho de administração. Paola, a irmã de Lucas, também trabalha na companhia. A empresa já trouxe dois diretores de mercado para acelerar a transição.