Nos últimos anos, os fundos da XP Asset se destacaram com a postura ativista em diversos casos relevantes de turnaround e batalhas por melhorias de governança nas empresas investidas, a ver Qualicorp, Via Varejo e Sanepar — apenas para ficar em exemplos mais notórios.
Agora, aos poucos, a gestora quer levar seu engajamento também para questões sociais e ambientais.
O primeiro passo é o lançamento do XP Investor ESG, um fundo de ação long only que acaba de ser lançado e que marca a estreia da XP na gestão ativa de produtos rotulados como ESG. A plataforma já vinha oferecendo produtos de outras casas e de gestão passiva, como o Trend ESG, que segue índices sustentáveis globais.
“A gente sempre gostou de ter uma postura colaborativa com as empresas e acreditamos que, só de manter um diálogo e mostrar que uma companhia está mal ranqueada em alguns aspectos, ela já começa a repensar o que está fazendo”, diz Marcos Peixoto, sócio e gestor de portfólio responsável por R$ 5 bilhões em fundos de ações na XP.
Ele reconhece que o caminho está apenas no começo e que ainda há muito a aprender, especialmente, quando se trata do E e do S.
No Investor ESG, as 100 empresas que estão no universo de cobertura do XP Investor, o flagship da casa, foram submetidas a um ranking ESG elaborado pela consultoria Sitawi. Ficam de fora do universo passível de receber investimentos aquelas que estão no quartil de menor pontuação. O tamanho das demais posições é ajustado de acordo com o score ESG.
Na prática, a posição em Suzano, que representa 7% do fundo tradicional, ganhou uma alocação de 15% na versão ESG por conta do seu bom desempenho em fatores ambientais, sociais e de governança. Da mesma forma, Natura, que responde por 5% do fundo original, tem o dobro de participação na versão sustentável.
Na contramão, Vale e Marfrig, que têm lugar no XP Investor, ficaram de fora do novo veículo.
A abordagem é dinâmica e não há lista de exclusão setorial. As empresas são reavaliadas a cada seis meses para capturar eventuais melhorias ou pioras no desempenho ESG.
“No critério ESG, acho que a Vale pode estar apta a entrar no fundo daqui a três anos ou de repente até menos. Ela vem apresentando melhorias em direção às melhores práticas do setor — de uma forma reativa, é claro, o que não é o ideal. Mas só com o tempo vai dar pra ver o que efetivamente mudou e ver se ela se tornou apta a entrar”, diz Peixoto.
A gestora também está refinando a análise e trabalhando no desenvolvimento de um ranking proprietário a partir da metodologia desenvolvida pela Sitawi. A ideia é que ao menos parte dele já esteja pronto até o meio do ano.
De acordo com informações disponíveis na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em janeiro, quando o fundo ESG começou a rodar, faziam parte da carteira também Via Varejo, B2W, Cesp, Eletrobras, Qualicorp, Pão de Açúcar, Hypermarcas, B3, Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, Lojas Renner e Multiplan.
Transição gradual
Para além dos produtos rotulados, a XP vem trabalhando na integração ESG para toda a asset, que gere R$ 99 bilhões em estratégias que vão de ações e renda fixa a produtos alternativos, passando por infraestrutura e imobiliário.
“Construímos uma política de investimento responsável na XP Asset como um todo, com anexos dedicados a cada uma das estratégias. Cada uma está num momento diferente, com um grau de maturidade específico na temática”, diz Manuella Passini, chefe comercial da XP Asset.
No caso da renda variável, a integração vem se refletindo numa mudança na forma de abordar as taxas de desconto ou os prêmios atribuídos às empresas de acordo com os riscos ESG.
“Se a empresa tem um score positivo de ESG, eventualmente, a gente sabe que o mercado pode pagar múltiplos mais altos por ela”, diz Peixoto. “Sempre atribuímos taxas de desconto a estatais por governança, por exemplo, mas no E e no S não fazíamos de forma efetiva antes, para ser honesto.”
Ele volta ao exemplo da Marfrig. O setor de frigoríficos, que sempre negociou a múltiplos de seis a sete vezes o Ebitda, hoje está negociando mais próximo de quatro.
“É coincidência ou oportunidade? Não sei cravar. Mas tem um desconto no mercado para o risco ESG do setor que é difícil quantificar e não vou esperar chegar ao que seria meu preço-alvo para vender a posição.”
Engenheiro de formação, Peixoto reconhece que tem dificuldade de lidar com a falta de padronização nas métricas socioambientais. Mas afirma que, nesse sentido, ter um fundo rotulado é essencial para avançar nas análises e na agenda.
“O fato de ter um fundo dedicado ajuda a gente na gestão dos outros fundos, força a ter uma regra mais restrita, pensar nisso de forma mais dedicada. Só isso já paga a conta”, diz.
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