Com dinheiro do Fundo Verde, a Magik JC vai escalar moradia popular no centro de SP

Ambição é lançar 20 prédios nos próximos 4 a 5 anos — e o dinheiro para os três primeiros acaba de ser assegurado junto à gestora de Luis Stuhlberger

Com dinheiro do Fundo Verde, a Magik JC vai escalar moradia popular no centro de SP
A A
A A

Nos últimos seis anos, a incorporadora Magik JC testou a tese de erguer edifícios residenciais populares na região central da Cidade de São Paulo, num modelo pouco usual: um Minha Casa Minha Vida (hoje Casa Verde e Amarela) sem arquitetura massificada — e com design. 

Foram seis prédios entregues e outros oito em obras ou em fase de lançamento até agora, nos bairros de Vila Buarque, Santa Cecília e Bixiga, sendo um dos últimos assinado por Isay Weinfeld.

Agora, numa ponte entre a Faria Lima e o Centro, sem paradas, uma estrutura financeira foi posta de pé para escalar a oferta de moradia popular próxima à estrutura de trabalho e de faculdades.

A ambição é lançar 20 prédios nos próximos 4 a 5 anos — e o dinheiro para os três primeiros acaba de ser assegurado junto ao Fundo Verde, de Luis Stuhlberger.

“Concluímos que chegou a hora de a perenização e a escala do nosso propósito de contribuir para a redução do déficit habitacional, com qualidade e arquitetura, passar pelo mercado de capitais”, diz o engenheiro André Czitrom, o CEO da Magik.

O Verde foi o único comprador de uma emissão de  Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRIs) no valor de R$ 5 milhões, estruturado pela securitizadora Gaia Impacto, para bancar os três primeiros lançamentos. 

A emissão é um piloto de uma série de outras já programadas, numa espécie de linha de produção, que deve ser acompanhada pelo Verde.

“A priori a ideia é financiar 100%”, diz Luiz Parreiras, sócio da Verde Asset e gestor da estratégia multimercado. “Percebemos que a Magik tem um negócio único, difícil de se achar: uma equação risco e retorno muito boa para o investidor e incrível do ponto de vista de propósito, que pode ser transformacional.”

Esse primeiro CRI tem prazo de 3 anos e paga taxa prefixada de 10% ao ano, mas com direito a um prêmio ao investidor por performance de venda: o juro vai a 12% se mais da metade das unidades for vendida no primeiro ano do lançamento, taxa que a Magik tem superado. “Não estamos deixando retorno na mesa por ser um projeto com impacto social”, diz Parreiras.

Czitrom diz que a ideia foi desenhar a estratégia inicial de 20 prédios, a ser fatiada em uma média de cinco lançamentos por ano, para criar um volume interessante para o mercado de capitais. “Mas, na verdade, não queremos parar no vigésimo. A carência habitacional é muito grande.”

“Criamos uma esteirinha para financiar projetos de impacto no Centro de São Paulo, uma tecnologia financeira que viabiliza CRIs de qualquer tamanho”, diz João Pacífico, fundador da securitizadora Gaia, que virou referência em emissões para projetos com impacto socioambiental positivo, destacando que trata-se do menor CRI já estruturado pela empresa.

Moradia como alavanca

Os três prédios bancados pelo CRI sairão nos bairros de Vila Buarque e Santa Cecília, com apartamentos de um e dois dormitórios, com preços que variam de R$ 165 mil a R$ 240 mil. 

A Magik opera nas faixas 1,5 e 2 do programa Minha Casa Minha Vida, rebatizado como Casa Verde Amarela pelo atual governo.

“A média dos moradores ganha entre R$ 3,2 mil e R$ 3,6 mil. Temos um público jovem, com cerca de 80% abaixo dos 30 anos de idade e a maioria morando sozinha”, diz Czitrom.

Além do acompanhamento da performance financeira, a Verde Asset receberá também relatórios do impacto social dos projetos. 

Um dos efeitos mais palpáveis deverá ser a redução do tempo gasto no trânsito pelos moradores, que hoje se deslocam de bairros periféricos para chegar ao trabalho ou à faculdade na região central.

A Din4mo, consultoria especializada em estruturas financeiras para negócios de impacto, calculou que, na média, serão economizadas 40 horas por mês no trânsito, o equivalente a 40 dias num ano.

“É um enorme ganho de qualidade de vida”, diz o sócio da Din4mo, Marco Gorini. “Mas o elemento central do projeto é o habitat como alavanca da mobilidade social. A qualidade de moradia cria outros vetores de transformação que nem conseguimos monitorar.”

Incorporadora B

A Magik foi fundada em 1972 por Josef Czitrom, empreendedor de origem romena e pai de André, e durante quatro décadas operou de forma tradicional no segmento da incorporação imobiliária, fazendo prédios comerciais e residenciais de padrões variados.

A virada para o segmento de habitação popular começou a se dar em 2014, pelas mãos de André, parte por conta de uma oportunidade de mercado e parte por uma mudança em convicções pessoais. 

“Embora nosso negócio seja num setor tradicional, a gente aborda ele de forma diferente, com impacto, pensando na cidade. A ideia é respeitar as pessoas, respeitar heranças culturais e arquitetônicas da região”, diz o CEO da Magik, uma empresa certificada pelo Sistema B, que reconhece negócios que aliam impacto socioambiental positivo ao lucro. 

“No nosso mercado se faz o que está vendendo bem: uma hora a moda é fazer prédio espelhado, outra hora é fazer cozinha gourmet. E ninguém nunca volta no prédio para ver se as pessoas estão felizes. Quem disse que as pessoas usam cozinha gourmet? Ela está lá vazia…”

Hoje, em vez de replicar a última moda, a Magik encomenda projetos arquitetônicos únicos para cada novo empreendimento.

No caso do Bem Viver Marquês de Itu (na imagem acima), que fica em frente ao Elevado João Goulart, o escolhido foi o badalado arquiteto Isay Weinfeld, numa parceria que Czitrom apelidou de ‘perde-perde’: “Ele cobrou menos do que costuma cobrar e eu paguei mais do que costumo pagar”, brinca. 

A ‘mágica’ das margens 

Enquanto as empresas que operam com projetos de médio e médio alto padrão trabalham com Valor Geral de Vendas (VGV) de R$ 50 a R$ 60 milhões, nos edifícios populares a Magik tem VGVs bem menores, entre R$ 20 milhões e R$ 40 milhões, o que impõe desafios para atingir margens satisfatórias.

“Hoje conseguimos uma fórmula em que a margem líquida [lucro/VGV] fica entre 25% e 30%, comparável com projetos de padrão médio e médio alto”, diz Czitrom.

O segredo está numa eficiência de obra muito azeitada, diz o CEO. Por conta da proximidade dos prédios, a empresa desenvolveu, por exemplo, uma inteligência para compra conjunta de material. Da mesma forma, a equipe de campo consegue visitar todos os canteiros no mesmo dia. 

“Ganhamos também muita eficiência em vendas, porque o conceito se tornou referência na região e isso diminui o nosso custo de aquisição do cliente”, diz. 

Outra medida que faz a conta ficar favorável é não realizar a venda enquanto o cliente não tem o crédito aprovado. Isso diminui a velocidade inicial das vendas, mas no médio e longo prazos reduz a incidência de distratos, que consomem tempo e caixa da empresa.

LEIA MAIS

Primeiro fundo imobiliário verde vai bancar prédios de madeira da construtech Noah

Como a Vivenda mudou seu negócio para dar escala a reformas de moradias populares

Como esse family office brasileiro criou negócios de moradia popular nos Estados Unidos e na Inglaterra 

Terra Nova leva lógica empresarial ao (velho) problema de regularização das favelas