O ESG está “no DNA” do seu processo de investimento? Pense bem: você pode ter que provar.
A Securities and Exchange Comission (SEC), procuradores americanos e o regulador alemão abriram uma investigação para avaliar a denúncia de que a DWS, gestora de ativos controlada pelo Deutsche Bank, estaria exagerando nas credenciais ESG de seus produtos.
Os papéis da gestora, que vinha fazendo uma guinada forte em direção a investimentos sustentáveis, caem mais de 12% na bolsa alemã com a notícia, no maior tombo desde o estouro do coronavírus, em março do ano passado.
A investigação acontece após uma reportagem do The Wall Street Journal mostrar que a DWS estaria floreando seus esforços na frente ambiental, social e de governança, citando documentos internos e a ex-head de sustentabilidade Desiree Fixler.
No relatório anual de 2020, divulgado em março, a companhia disse que mais da metade dos seus US$ 900 bilhões em ativos eram investidos usando um sistema no qual as companhias eram avaliadas com base em critérios ESG.
Uma avaliação interna a que o Journal teve acesso, feita um mês antes, mostrava que apenas uma fração dos produtos disponíveis na prateleira de investimentos aplicava o processo de integração. Segundo a apresentação e emails trocados na época, classes de ativos consideradas chave dentro da DWS ainda não estavam submetidas ao processo.
No mesmo mês, Fixler — que havia sido contratada em setembro como primeira chefe de sustentabilidade da asset — fez uma apresentação ao board dizendo que a casa não tinha uma ambição ou estratégia clara, nem políticas para carvão, por exemplo.
A executiva foi demitida no dia 11 de março, um dia antes de o relatório anual ser apresentado. Ela alega que sua demissão ocorreu porque estava sendo “muito vocal” sobre os problemas — e já abriu um processo trabalhista contra a DWS na Alemanha.
Desde o ano passado, a DWS vem reforçando sua prateleira de produtos que diz considerar sustentáveis e os fundos que rotula como ESG responderam por 40% da captação de 21 bilhões de euros registrada na primeira metade deste ano.
Um porta-voz da DWS disse ao WSJ que confirma as informações que constam no seu relatório anual, que é revisado pela KPMG. A gestora afirma que os padrões para definir ativos ESG estão evoluindo constantemente e que é vista no mercado como mais conservadora que a maior parte de seus competidores na definição.
Na mira dos reguladores
As investigações na DWS são o exemplo mais recente do maior escrutínio dos reguladores em relação à transparência ESG. No começo deste ano, a SEC estabeleceu uma força-tarefa voltada a investigar alegações enganosas de credenciais ESG por assets, assessores de investimento e empresas públicas.
Na Europa, a indústria de gestão de recursos já teve que remover o rótulo ESG de cerca de US$ 2 trilhões em ativos entre 2018 e 2020, na medida em que regulações mais restritas sobre o que constitui um investimento sustentável começam a entrar em ação.
O Sustainable Finance Disclosure Regulation (SFDR) europeu, que começou a valer em março, requer que as gestoras justifiquem as alegações de sustentabilidade nos seus portfólios, em meio a esforços da região para direcionar capital para ativos que contribuam para conter o aquecimento global.
“Tenho alertado em todas as minhas apresentações sobre disclosures ESG do risco de que a informação não seja correta, verdadeira, completa e suficiente e que induza o investidor a erro”, afirma Alexei Bonamin, sócio do Tozzini Freire Advogados.
Segundo ele, a questão já levou o xerife do mercado de capitais americano a abrir alguns processos sancionadores e alguns participantes já estão sendo processados judicialmente.
“Em alguns casos não se trata nem de greenwashing. A empresa achava que era uma temática importante, que estava fazendo o bem e sem maiores preocupações soltava disclosures ESG sem o devido cuidado”, diz.
No Brasil, por ora, ele diz que ainda não há uma tendência de processos sancionadores nesse sentido por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas que o cenário tende a mudar.
A CVM está trabalhando numa nova resolução para modificar a Instrução 480, que trata sobre a divulgação de informações ao mercado e está incorporando as questões ESG e climática. O Banco Central também está alterando a regulação para instituições financeiras.