Antes de chegar trincando de gelada no seu copo, a cerveja passa por um trabalhoso e rudimentar processo de seleção de grãos. Praticamente toda manual, e muito custosa, a análise e certificação dos cereais consome bilhões de dólares por ano no mundo todo.
A ZoomAgri, uma agtech fundada na Argentina, quer substituir o olhar humano por um processo totalmente digital, combinando processamento de imagens, inteligência artificial e internet das coisas.
Na última sexta-feira, a startup foi escolhida como vencedora da segunda edição da Aceleradora 100+, o programa da Ambev que busca negócios sustentáveis e inovadores.
A ideia da cervejeira é identificar e acelerar empresas que causem um impacto positivo nas quatro áreas que abrangem seus desafios de sustentabilidade: agricultura sustentável, gestão de água, embalagem circular e mudanças climáticas.
Nesta segunda edição, foram analisadas 742 startups, com 18 delas sendo escolhidas para passar pelo processo de aceleração. As sete mais promissoras participaram do demo day da cervejeira na sexta e foram avaliadas por um time diversificado de especialistas.
O negócio da ZoomAgri foi considerado o de maior potencial de gerar impacto e ser escalado. Qualidade da equipe e robustez do modelo de negócio também contaram pontos.
A tecnologia desenvolvida pela ZoomAgri se aplica a vários grãos, mas seu primeiro produto é justamente o ZoomBarley, para seleção da cevada que vai nas cervejas.
Para que o grão seja transformado em malte, é muito importante que haja pureza nas variedades de cevada, porque cada variedade se comporta de forma diferente no processo de maltagem.
Hoje, essa pureza varietal é determinada em testes que atualmente demoram até cinco dias. O dispositivo da empresa escaneia os grãos e executa o mesmo processo em cerca de 10 minutos, a um custo que pode ser até 20 vezes menor.
“A tecnologia detecta propriedades de cada matéria-prima, evitando um maior descarte de grãos. Com isso, há menos desgaste da terra e desperdício de água, além de diminuir a emissão de gases poluentes”, diz Carolina Pecorari, diretora de sustentabilidade e tecnologia em procurement da Ambev.
A startup já está presente em 14 países e atende a diversos clientes da indústria cervejeira, inclusive a própria Ambev e sua controladora ABInbev.
Mas o que mais pesou na decisão dos jurados foi o potencial que a tecnologia tem de ser extrapolada para outras etapas da produção agrícola, com um benefício ambiental ainda maior.
“Hoje a tecnologia é empregada na chegada do grão à fábrica. Mas entendemos que ela tem potencial para ser usada na colheita e até para a seleção de sementes para plantio, permitindo produzir em áreas menores e com menos água”, diz Paulo Bellotti, diretor da gestora de fundos de impacto MOV Investimentos, um dos jurados.
Em parceria com Ambev e AB InBev, a empresa já está desenvolvendo soluções para facilitar processos como a determinação de qualidade e peneiramento de grãos, além de implementar em seu hardware recursos específicos para soja, milho e trigo.
A empresa recebeu a quantia de R$ 100 mil por ter vencido o programa, além da possibilidade de ter a Ambev como investidora e cliente.
Em segundo lugar, o lixo
A disputa foi acirrada e, no segundo lugar, os jurados optaram por declarar empate entre Boomera e GrowPack. As duas empresas honram a máxima de que o lixo pós-consumo é consequência de um erro de design de embalagens.
A também argentina GrowPack produz embalagens de comida biodegradáveis para delivery e take away utilizando palha de milho. Com um processo mecânico, que não utiliza produtos químicos, a startup transforma dejetos do milho em diversos tipos de embalagens, consumindo menos energia, menos água e causando menos emissões de gases em relação ao papelão e ao plástico.
A escalabilidade do mercado da empresa foi outro ponto a seu favor, já que a tecnologia permite fabricar embalagens para inúmeros produtos.
Em conjunto com a Ambev, ela desenvolveu o BioRing, um produto que se apresenta como uma alternativa verde aos engradados de latas de cerveja.
Atualmente, a empresa está captando sua rodada seed de US$ 1,2 milhão e deve, em breve, iniciar a produção em escala em uma planta em Vinhedo, no interior de São Paulo, e comercializar seus produtos a preços bastante competitivos.
Também focada na transição para a economia circular, está a Boomera, que criou a plataforma CircularPack, que ajuda empresas a implementarem e executarem projetos do tema em seus negócios.
Em termos simples, a Boomera transforma lixo em novos produtos, mas vai muito além disso.
A empresa atua em todas as etapas do processo, trabalhando na conscientização sobre o tópico, no desenvolvimento de estratégias de reciclagem, de logística reversa e até no design, produção e distribuição dos produtos resultantes de resíduos.
Com mais de 300 clientes, incluindo nomes de peso, como Nestlé, Unilever e Vale, a companhia retira anualmente 60 mil toneladas de lixo do meio ambiente que são transformados em suas fábricas em São Paulo e no Paraná