
A aceleradora de impacto Quintessa selecionou cinco iniciativas entre 150 candidatas para um novo programa voltado à inovação na área de restauração florestal, o Restoration ClimAccelerator. O objetivo é apoiar soluções para a cadeia de reflorestamento no Brasil.
Foram definidas cinco frentes prioritárias: regulamentação fundiária, sementes, monitoramento, mecanismos de financiamento e capacitação técnica. A ideia é desenvolver uma cadeia de fornecedores em torno do novo negócio de recuperar áreas degradadas.
Uma das metas do Brasil em sua NDC, o plano climático entregue à ONU, é recuperar 12 milhões de hectares até 2030. Para dar conta de uma área deste tamanho, maior que o território de Portugual, o setor vai ter que se sofisticar e se especializar.
Hoje, as companhias responsáveis pela restauração muitas vezes são obrigadas a fazer dentro de casa algo que poderia ser contratado de terceiros – mas eles não existem ou são pouco confiáveis.
“O país é visto como referência em restauração, dado nosso território e potencial de biodiversidade, mas não queremos ser reconhecidos apenas pela operação em campo”, diz Carolina Ochoa Koepke, sócia e líder da área de Uso da Terra no Quintessa. “É importante também mostrar que temos capacidade de oferecer soluções e inovações para essa cadeia”.
As selecionadas foram:
- Uirapuru, do Pará, que desenvolveu uma plataforma digital para regularização fundiária de pequenos produtores;
- IVG Tech, de São Paulo, empresa de biotecnologia com foco em melhoria genética de mudas de espécies nativas;
- Brigada de Incêndio de Alter do Chão, também do Pará, um programa dentro do Instituto Aquífero Alter do Chão, que oferece capacitação em manejo integrado do fogo às comunidades na Amazônia;
- Bioflore, de Minas Gerais, criou um sistema de sensoriamento remoto de biodiversidade e carbono;
- E Bluebell Index, de São Paulo, que tokeniza ativos ambientais.
As selecionadas receberão mentoria e apoio em áreas como gestão, logística e avaliação de impacto. O programa também conecta os empreendedores a potenciais clientes e investidores. A Quintessa não investe diretamente nos negócios.
Por meio de uma parceria com a Climate KIC – organização europeia que também faz aceleração de startups e negócios sustentáveis –, elas também podem ter acesso a investidores internacionais, segundo Koepke.
O próximo passo é ir a campo. “A ideia é testar as inovações em operações reais, aprender e passar o conhecimento para a frente. O aprendizado tem que ser compartilhado por todo o ecossistema”, explica Koepke.
O programa é financiado por doações de Amazon Investor Coalition, Fundo Vale, Instituto Itaúsa e Instituto Clima e Sociedade (iCS). “O investimento veio justamente do reconhecimento do valor de apoiar inovações e iniciativas que atacam gargalos específicos desse ecossistema”, disse Koepke.
Um exemplo é o Fundo Vale, responsável pela frente de recuperação de áreas da Meta Florestal 2030 da Vale, que quer restaurar 100 mil hectares e proteger 400 mil hectares até o final da década.
A seleção foi realizada pela Quintessa e pelo comitê formado pelos financiadores brasileiros.
Da ideia ao cliente
Uma das startups selecionadas é a Bioflore, que desenvolveu um sistema capaz de identificar árvores, mapear vegetação, calcular o carbono armazenado na biomassa de uma floresta. Outra solução da empresa é o monitoramento da biodiversidade, que combina sensores a laser (LiDAR), drones e imagens de satélite para escanear a floresta da copa ao solo.
“O programa da Quintessa vai ajudar o mercado a ganhar força, tanto para empresas que precisam das soluções quanto para nós, startups que temos a tecnologia”, afirma o CMO Bruno Nani.
A Bioflore foi fundada pelos engenheiros florestais Heitor Filpi e Danilo RA Almeida e por Guttardo Pereira, formado em ciência da computação. A tecnologia já foi aplicada em cerca de 40 projetos, incluindo parcerias com Re.green e Pachama, duas companhias que tentam transformar a restauração em negócio.
Segundo Nani, a empresa chegou ao programa sem ter captado investimentos nem recorrido a empréstimos. Os sócios não tinham experiência no mercado de startups, e a busca por aportes não avançou.
Assim, optaram por gerar receita com os projetos e trabalhos realizados, reinvestindo o lucro na empresa. Nani diz que o faturamento quadruplica a cada ano, desde que o negócio começou a faturar. Em 2024, o faturamento foi de R$ 2,5 milhões e, com o apoio da aceleração, a startup pretende encerrar 2025 com R$ 8 milhões.
Agora, com a aceleração da Quintessa, a Bioflore busca amadurecer sua operação e organizar a empresa para captar investimento no futuro. “O programa está nos ajudando a entender melhor nossas soluções no mercado, a comunicar nosso valor a investidores e a planejar o crescimento de forma sólida. A captação de investimento faz sentido no futuro, quando estivermos prontos para escalar o negócio”, afirma o CMO.
A Bioflore já passou por outras acelerações da Quintessa. Dessa vez, com o foco em restauração, Nani diz que o ponto forte é a conexão com os clientes e possíveis investidores. “Já somos competitivos com empresas estrangeiras, mas precisamos mostrar o nosso potencial aqui no Brasil, com a nossa tecnologia testada em em uma biodiversidade muito rica”.
O programa
Fundada em 2009 como um projeto filantrópico de Leo Figueiredo, um dos fundadores da corretora Hedging-Griffo, a Quintessa fez um redirecionamento estratégico nos últimos anos para se tornar aceleradora de impacto.
Agora, o plano é focar em temáticas específicas. Dentro da área de clima, criou uma unidade de negócio específica para “Uso da Terra”, que abrange bioeconomia e restauração e abriga o Restoration ClimAccelerator.
O programa foi idealizado durante uma formação da Climate KIC para atuação de aceleradores de impacto positivo na América Latina, realizada no ano passado.
“Fomos provocados a pensar qual seria o próximo programa de aceleração que faria sentido para o Brasil. Já existem iniciativas voltadas para startups de bioeconomia e agro, mas ainda não havia um programa específico focado em restauração”, conta Koepke, da Quintessa.
A primeira etapa de seleção envolveu um mapeamento de 150 inscrições, com 93 válidas. Entre as mapeadas, o faturamento médio era de R$ 1 milhão, com equipes de até 10 pessoas – 30% lideradas por mulheres e 25% por pessoas negras. Das inscrições válidas, 36 inovações já captaram investimento e outras 51 estão em processo1º Ciclo de Aceleração (2025).