O shake amazônico que atraiu Bela Gil e Alex Atala

Mazô Maná lança seu primeiro produto com ingredientes amazônicos e tem fatia acionária reservada para comunidades tradicionais 

Embalagens verdes do Mazô Maná, supershake da floresta amazônica.
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Por que dois chefs reconhecidos por militar a favor de comida de verdade e promover ingredientes brasileiríssimos associariam seus nomes a um shake de ingredientes processados daqueles que substituem uma boa refeição?

A foodtech Mazô Maná, com sede em Altamira, no Pará, acaba de colocar no mercado o seu super shake, feito de ingredientes amazônicos e com Bela Gil, do restaurante Camélia Ododó, e Alex Atala, do restaurante D.O.M., entre os seus conselheiros.

“Conhecer e consumir alimentos da biodiversidade brasileira é uma forma de apoiar os povos tradicionais que vivem da produção ou colheita desses alimentos, além de uma maneira ativa de ajudar a manter nossas florestas em pé”, diz Bela Gil, que acompanhou o desenvolvimento do produto desde a ideação do negócio.

O arqueólogo e especialista na evolução da Amazônia Eduardo Neves e os executivos Esteban Walther e Arturo Isola, da Amázzoni Gin, completam o quadro de conselheiros.

O produto da Mazô mistura açaí, babaçu, cacau, cajá, camu-camu, castanha-do-pará, cogumelos, cumaru, cupuaçu, graviola, murici, pimenta cumari e pupunha, todos originários da Amazônia. 

Leite de coco e semente de abóbora também estão na composição, mas por enquanto, são cultivados em outras regiões. Os ingredientes, processados e desidratados, são misturados, e o produto final é embalado na cidade de Valinhos, em São Paulo. 

O shake começa a ser vendido hoje no e-commerce da marca e também no Mercado Livre. O preço é salgado, mas em linha com concorrentes: uma embalagem de 480g custa R$ 189,90.

A empresa espera que o produto atraia principalmente adultos das classes A e B. “São pessoas com alimentação vegana, muito conectadas com a composição de seus alimentos e também as mais ativistas, ligadas à causa amazônica e à emergência climática”, diz o co-CEO Zé Porto, que conta com mais de 20 anos de experiência em marketing e negócios.

Se a clientela em potencial está no topo da pirâmide, a cadeia de fornecimento está sendo montada de forma a valorizar quem está na base de tudo.

E valorizar, neste caso, é algo que envolverá cifras de fato.

Em um arranjo inovador, a startup reservou 10% de seu capital para distribuir entre as associações dos povos tradicionais e cooperativas extrativistas da região que fizerem parte da sua cadeia de fornecimento.

“É, talvez, a maior inovação que estamos colocando na mesa”, diz Marcelo Salazar, idealizador da Mazô Maná e co-CEO. 

O objetivo é que o dispositivo funcione como um benefício adicional para os povos ribeirinhos e indígenas, que lideram o extrativismo, e abra a oportunidade para modelos alternativos de financiamento. Mas até se concretizar, deve ser um processo longo, diz Salazar. 

Por enquanto, as conversas ainda estão em estágio inicial, com a Rede da Terra do Meio, um coletivo que reúne comunidades próximas à foz do rio Xingu. A maior parte das reservas extrativistas e terras indígenas localizadas na região da Terra do Meio integram o grupo.

Salazar conhece bem o funcionamento da rede: vive em Altamira há 20 anos e, por 15, coordenou o escritório na região do Instituto Socioambiental (ISA), uma organização da sociedade civil que há quase 30 anos atua em defesa da diversidade socioambiental do país.

“A nossa meta é que todos os ingredientes venham de parceiros com os quais temos uma  relação próxima. Mas no começo não conseguimos ter 100% dos ingredientes das comunidades tradicionais com as quais a gente trabalha. O primeiro lote de açaí em pó vem da 100% Amazônia, que atua com comunidades no entorno de Belém, por exemplo.”

Cooperativas do Mato Grosso e na região da Transamazônica também fornecem parte dos ingredientes. 

Além de Salazar, são sócios da food tech Airan Correa, empreendedor social, e Raimunda Rodrigues, gestora da primeira miniusina da comunidade Rio Novo (PA) para processar produtos não-madeireiros para comercialização.

Serviços ambientais

A proposta da Mazô Maná se assemelha à de outra foodtech, a Mahta, que traz o chef Thiago Castanho entre os sócios. 

Não se trata de coincidência. Salazar e Airan chegaram a ser sócios de Max Petrucci, fundador e CEO da Mahta no início da jornada. 

“Desenvolvemos a fórmula-base juntos, mas não queríamos ter só o produto”, diz Salazar. 

Assim, a ideia na Mazô é que o supershake e outros produtos alimentares sejam apenas uma das fontes de receita da empresa. 

A startup já presta consultorias para empresas na Amazônia, como desenvolvedoras de projetos de créditos de carbono, e mira o pagamento por serviços ambientais (PSA) no futuro. 

O PSA foi regulamentado por lei aprovada em 2021 e tem como princípio remunerar, monetariamente ou via melhorias e serviços, comunidades que contribuem para a preservação de florestas e outros recursos naturais, como bacias hidrográficas, gerando benefícios para toda a sociedade. Os recursos podem vir do setor público e de parceiros privados.

“Quando falamos em pagamentos por serviços ambientais, é porque nós [comunidades locais] somos o primeiro olhar sobre a floresta. Nós fazemos a primeira camada de proteção. Se alguém entrar no nosso território, somos nós que vamos ligar para o ICMBio ou Ibama e avisar se tem algo diferente acontecendo”, diz a Raimunda Rodrigues. 

A decisão de incluir a comunidade entre os acionistas da empresa deverá ter determinante para o tipo de investidor disposto a aportar recursos na Mazô.

“Todas as conversas que tivemos com quem só queria fazer um investimento de impacto não foi para frente. Estamos buscando também esse novo investidor, que está disposto a usar uma nova régua, que queira participar da criação desse novo modelo de negócios para a Amazônia”, diz Salazar. 

A foodtech foi acelerada e recebeu investimento da Amaz, que foca em negócios de impacto na Amazônia, e passou pelo programa de desenvolvimento do Sinergia, voltado para negócios amazônicos.

*Foto: Divulgação/Felipe Morozini