CARBONO

NetZero inaugura as ‘franquias de remoção de carbono’

Startup franco-brasileira adota sistema para acelerar o uso do biochar, um insumo agrícola feito de resíduos orgânicos e que gera créditos de carbono

NetZero inaugura as ‘franquias de remoção de carbono’

Paris – A startup franco-brasileira NetZero vai inaugurar um modelo de franquias para acelerar seu negócio de biocarvão, um insumo para a agricultura que também gera créditos de carbono por meio da remoção de CO2 da atmosfera.

A primeira franqueada da companhia será uma grande empresa do agronegócio, cujo nome será divulgado em setembro, disse ao Reset Axel Reinaud, CEO e cofundador da NetZero (foto acima). A unidade que vai produzir o biocarvão, também conhecido como biochar, fica em Minas Gerais. 

A NetZero, que levou US$ 15 milhões em uma competição de startups financiada por Elon Musk, produz o biocarvão a partir do aquecimento sem oxigênio de resíduos agrícolas. Essa massa, que se formou com carbono retirado da atmosfera pelo processo de fotossíntese, é consolidada e fixada no solo pelo manejo do biocarvão nas plantações. O produto final ainda carrega a vantagem de intensificar a retenção de água na terra. 

Segundo Reinaud, a solução da empresa tem potencial para retirar 1 bilhão de toneladas de CO2 da atmosfera por ano. Cada tonelada equivale a um crédito de carbono, e o CEO vislumbra uma receita potencial de US$ 200 bilhões só com a comercialização desses ativos. Outros US$ 200 bilhões viriam da venda do biocarvão.

Números dessa magnitude, que também dependem da venda dos créditos a US$ 200 a unidade, estão num horizonte de longo prazo. A franquia inaugural da startup vai produzir 4 mil toneladas de biocarvão (cuja aplicação pode gerar cerca de 6 mil créditos de carbono) quando estiver operando em plena capacidade, o que deve levar alguns meses.

O plano é começar a construção de novas plantas ainda no segundo semestre deste ano, a partir da assinatura de três ou quatro contratos novos, explica Reinaud. Além do Brasil, há negociações em curso na Costa do Marfim, no Senegal e no Quênia. Em estágio mais inicial, na Índia e, no pipeline de mais longo prazo, México, Colômbia e Argentina.

As conversas com potenciais franqueados no Brasil continuam, envolvendo grandes empresas de cana-de-açúcar, arroz e café, entre elas a Atvos, antiga Odebrecht Agroindustrial, uma das maiores companhias sucroalcooleiras do país.

As duas empresas participaram no dia 26 de maio, em Paris, do Brazil Climate Summit, fórum de discussões sobre mudanças climáticas organizado pelo Brazil Climate Institute. 

Franquias de carbono

O sistema de franquias – único no setor, segundo Reinaud – foi o modelo escolhido para acelerar a implementação porque permite escala no impacto almejado e na redução de custos  das instalações. A etapa imediatamente anterior, negociação e aporte de investimentos, é lenta. 

O uso do biocarvão como solução climática ainda está dando os primeiros passos, bem como a venda de créditos de carbono como uma das principais maneiras de colocar de pé esse novo negócio.

Os interessados em usar a tecnologia da NetZero querem começar com acordos temporários para um período de testes e avaliação de métricas iniciais, para depois se comprometer. O investimento mínimo para ser um franqueado da NetZero varia entre US$ 3 milhões e US$ 10 milhões, a depender do tamanho da instalação.

Grandes produtores agrícolas podem investir aos poucos e adicionar módulos a uma operação já existente. Nesses casos, o aporte poderia chegar a US$ 20 milhões ou US$ 30 milhões. Quem entra no negócio a partir de agora pega o que Reinaud e equipe estão chamando de segunda geração do modelo: tudo é dimensionado e fornecido pela franqueadora, desde tecnologia e equipamentos até escritório, depósito de peças e vestiário para os funcionários.

One-stop shop

A cadeia de produção do biochar é extremamente fragmentada e vem sendo constituída pela Net Zero há quatro anos. A proposta é ser a famosa one-stop shop, uma loja que tenha tudo para operadores agrícolas que produzem grandes quantidades de resíduos e têm necessidade e interesse em participar da produção do biocarvão.

Reinaud afirma que esse modelo é conveniente para pequenas e médias cooperativas, como as de café, que têm a oportunidade de prestar aos fazendeiros afiliados um serviço complexo e caro se feito individualmente. E também para os grandes produtores, que são donos da terra e já operam em sistema industrial.

De acordo com Reinaud, a produção depende mais de tecnologia do que de pessoas. A preferência pela automatização no modelo de negócios se baseia em três motivos principais.

O primeiro é a segurança. As plantas utilizam gases inflamáveis e em temperaturas altíssimas, que podem chegar a 700 graus no reator de pirólise, onde os resíduos agrícolas são aquecidos para se transformar em biochar. Quanto menos manipulação humana nessa etapa, menor o risco para os trabalhadores.

A segunda razão é o custo e a terceira, a pressão sobre a equipe. Como as unidades funcionam 24 horas por dia, todos os dias da semana, com turnos nos fins de semana, o objetivo é ao menos operar sem equipe nos turnos noturnos a partir de 2026, levando em conta o aperfeiçoamento da tecnologia e das máquinas.

De todo jeito, a operação, ainda que altamente tecnológica, não é totalmente autônoma. Os equipamentos são conectados por satélite, monitorados e operados remotamente.  “O Brasil é o país com maior potencial de produção de biocarvão hoje. Estamos terminando a fase de proliferação e começando a de consolidação. Em seguida, virá a fase da industrialização. Precisamos sobreviver à seleção natural”,  diz o CEO.

Ele conta que há quatro anos essa indústria não existia. Hoje grande parte da produção está na Bolívia com uma planta em operação e outra em construção. Entre outros produtores estão Estados Unidos, Austrália, China e a Índia, neste último caso em pequena escala e de forma descentralizada.