Conheça a BYD, montadora chinesa de olho no Brasil

Fabricante de elétricos que superou a Tesla em vendas no ano passado estaria interessada em assumir fábrica da Ford na Bahia

Linha de montagem da fabricante chinesa de carros elétricos BYD
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Há alguns meses especula-se que a montadora chinesa BYD estaria interessada em assumir uma fábrica desativada da Ford em Camaçari (BA) para produzir carros elétricos no país.

Nada ainda é certo, e declarações desencontradas do primeiro escalão do governo indicam que também existe a tentativa de trazer de volta a montadora americana.

Mas o interesse da BYD no Brasil, que já importa alguns de seus modelos para o país, faz todo o sentido segundo alguns movimentos recentes.

Pouco conhecida fora da China, a empresa foi a maior vendedora de veículos elétricos do mundo em 2022, superando a Tesla, e está começando um movimento de expansão global.

A história da BYD, fundada como fornecedora de baterias para celulares em meados dos anos 1990, é o retrato fascinante de um setor que atravessa a maior transformação da sua história.

Ao mesmo tempo que suas antigas clientes Nokia e Motorola eram varridas do mapa pela onda dos smartphones, a BYD se metamorfoseou num conglomerado que inclui a montadora e também fábricas de ônibus e de trens urbanos elétricos.

Crucialmente, a BYD produz os dois itens mais importantes para a eletrificação dos transportes: a bateria e os semicondutores.

O sucesso doméstico foi baseado em modelos que colocavam o baixo custo e a praticidade à frente do design, mas a empresa agora também produz veículos mais luxuosos.

Em janeiro, Elon Musk cortou preços dos seus dois carros mais populares  na China, um movimento lido como sinal de que o competidor local estava começando a incomodar.

A BYD faturou cerca de US$ 62,3 bilhões no ano passado. O lucro cresceu 458% e chegou a US$ 2,5 bilhões, segundo dados preliminares registrados na Bolsa de Shenzhen no começo de fevereiro.

E tudo começou com aqueles celulares de tela monocromática, que só serviam para telefonar. 

Fábrica de cópias

Wang Chuanfu, formado em química e ciência de materiais, fundou a BYD em 1995, em Shenzhen, no sul da China. O plano de negócios era simples: tentar copiar as baterias recarregáveis inventadas pela Sony e na época produzidas por companhias japonesas.

O roteiro foi parecido em 2003, quando Wang comprou a Xian Qinchuan, uma pequena fábrica de carros estatal. (A Tesla foi fundada no mesmo ano.)

Sem condições de passar pelo longo processo de desenvolvimento de um carro novo, a empresa se dedicou à “engenharia reversa” do Toyota Corolla.

O sucesso inicial baseado em cópias de baixo custo e a estratégia de transição para os elétricos, atraiu em 2008 a atenção de um célebre investidor americano. 

Na época Warren Buffett comprou 10% das ações da empresa, e chegou a ter uma participação de 20%, mas vem se desfazendo dos papeis desde meados do ano passado – após embolsar um bom lucro. As ações subiram mais de 200% apenas nos últimos cinco anos.

Foi naquela época que a empresa começou a transição para os elétricos, inicialmente com os chamados híbridos plug-in, que têm tanque de combustível e também podem ser carregados na tomada.

Mas o futuro seria dos 100% elétricos, e o governo se certificou de que as empresas do país fariam parte dele. Estima-se que entre 2009 e 2022 o país tenha distribuído quase US$ 30 bilhões em subsídios e incentivos fiscais.

No ano passado, o último da ajuda oficial, foram vendidos 6,8 milhões de carros elétricos no mercado chinês (e 800 mil nos Estados Unidos). E a líder foi a BYD.

Verticalização total

Agora a companhia tenta ser a primeira a cumprir o desejo estratégico do Partido Comunista: criar uma marca chinesa entre os gigantes globais da indústria automobilística.

A BYD tem condições únicas para concorrer no futuro dos veículos elétricos. A escala do mercado chinês é só a primeira.

O maior gargalo para a eletrificação dos transportes são as baterias, a especialidade e grande diferenciador da empresa. Enquanto as outras montadoras dependem de fornecedores (na maioria chineses) para as células de íons de lítio, a BYD as fabrica dentro de casa.

A empresa também decidiu tomar um caminho tecnológico diferente. Suas células usam uma composição diferente, com ferro e fosfato (conhecidas como LFP) em vez de níquel, cobalto e manganês.

Isso significa uma importante redução de custos, ainda mais com a disparada do preço dos metais, mas traz consigo uma densidade menor de energia armazenada — ou seja, menos autonomia.

Depois de muita resistência, e com os avanços das baterias LFP, a própria Tesla começou a equipar seus modelos mais básicos com essa tecnologia, primeiro no mercado chinês e agora também nos Estados Unidos.

Outra vantagem da BYD em relação a toda a concorrência é a fabricação dos próprios semicondutores. Um elétrico típico leva cerca de 3.000 chips. Embora a situação não seja tão crítica como há dois anos, a oferta limitada do componente deve se traduzir em 3 milhões de unidades a menos produzidas este ano.

O próximo campo de batalha

Elon Musk continua dependendo dos chineses, tanto para os semicondutores como para as células de íons de lítio. Mas ele tem dois trunfos que a BYD só agora começa a desenvolver. 

O primeiro é uma rede mundial. Os carros da Tesla são fabricados em três países (Estados Unidos, China e Alemanha), e um quarto, o México, vai se juntar à lista.

É possível comprar um Model 3 em 30 países, ou seja, existe uma rede de concessionárias e de serviços espalhada pelo mundo.

A BYD vai construir sua primeira fábrica na Tailândia e mantém discussões também com os governos de Filipinas, Indonésia e Vietnã.

Além da possibilidade de assumir a planta da Ford na Bahia, a companhia também estaria interessada em comprar uma unidade da montadora na Alemanha que vai parar de produzir em 2025.

O reconhecimento da marca, acreditam os chineses, virá com o tempo. Os carros com motores de combustão interna made in China não têm a mesma reputação de alemães, americanos ou italianos.

Mas o negócio dos elétricos vai representar um recomeço e uma oportunidade única de ruptura em um dos setores que moldaram o século passado.

Diz a versão oficial que BYD é a abreviação de Build Your Dreams. Mas Wang, o fundador, já ofereceu uma leitura alternativa falando sobre o potencial da companhia para investidores – a sigla também poderia ser lida como “Brings You Dollars”.