Os padrões de reporte ESG, enfim, começam a convergir

Em comum, propostas mais recentes têm como base a TCFD, força-tarefa de divulgação de informações relacionadas às mudanças climáticas, escreve Mauricio Colombari, da PwC

Os padrões de reporte ESG, enfim, começam a convergir
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As últimas semanas foram marcadas por desdobramentos importantes para a evolução – e a convergência – dos padrões para reporte de temas ESG (ambiental, social e governança), que visam atender uma demanda crescente de investidores e partes interessadas por informações mais completas e padronizadas.

A SEC, agência reguladora do mercado de capitais americano, a IFRS Foundation, autoridade internacional em padrões de contabilidade, e até mesmo o GRI, atualmente o padrão mais utilizado para divulgação de informações não financeiras, estão trabalhando em novas iniciativas para o reporte ESG.  

Em comum, as propostas mais recentes têm como base o Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD), uma força-tarefa constituída pelo Financial Stability Board (FSB) para a criação de um padrão para divulgações de informações relacionadas às mudanças climáticas.

Sua estrutura – que abrange quatro áreas (governança, estratégia, gestão de riscos e metas e métricas) e visa avaliar a resiliência das organizações a diferentes cenários – tem sido utilizada e adaptada para outros temas ambientais, bem como para tópicos do pilar social.

O Banco Central brasileiro, por exemplo, ao propor em 2021 novas regulamentações aplicáveis às instituições financeiras sobre ESG, utilizou a estrutura proposta pelo TCFD, mas ampliou os requerimentos para a agenda socioambiental como um todo, em um movimento bem recebido pelo mercado, principalmente pela necessidade de que os temas sociais ganhem relevância semelhante à do pilar ambiental em países em desenvolvimento e no Brasil.

Exigências da SEC

Uma das propostas recentes que teve como base a força-tarefa veio da Securities Exchange Commission (SEC),  que regula o mercado de capitais nos Estados Unidos. 

Além dos quesitos nos quatro pilares do TCFD, a proposta cria requerimentos para as empresas divulgarem os efeitos esperados das mudanças climáticas nas demonstrações financeiras e informações sobre as emissões diretas e indiretas de gases de efeito estufa, tanto de forma absoluta quanto da intensidade das emissões.

A reação do mercado à proposta não foi uniforme. Vista como bastante ambiciosa, uma parcela dos envolvidos a considerou uma resposta adequada ao desafio das mudanças climáticas. Já outra parcela a considerou excessivamente disruptiva e questionou até que ponto novos requerimentos de divulgação contribuiriam para influenciar as práticas de negócios das empresas.

A proposta deve criar uma acirrada disputa políticas sobre os pontos propostos e não é possível prever, neste momento, até onde seria atenuada com base nas negociações para a aprovação do texto final.

Da contabilidade para a sustentabilidade

Outra iniciativa relevante e com alcance global foi a criação, em 2021, do International Sustainability Standards Board (ISSB) pela IFRS Foundation, a mesma organização responsável pela emissão dos pronunciamentos internacionais de contabilidade. 

Essa iniciativa tem um potencial enorme, considerando a capacitação e histórico da IFRS Foundation para a emissão de normas, assim como alcance global da organização, e se credencia, em teoria, para ser um consolidador dos padrões de reporte de informações não financeiras, principalmente voltadas ao mercado de capitais.

O ISSB lançou recentemente duas minutas para consulta pública. A primeira trata dos requerimentos gerais para a divulgação de termos de sustentabilidade, considerando uma abordagem baseada em riscos e oportunidades, e que servirá como base para a preparação de divulgações completas de informações não financeiras.

A segunda minuta trata das divulgações sobre os temas de clima nas organizações, levando em conta também a estrutura básica do TCFD de uma forma mais detalhada, e requerimentos de divulgações sobre os impactos das mudanças climáticas na posição financeira, na performance financeira e na geração de caixa. A minuta requer ainda a divulgação das emissões diretas e indiretas de gases de efeito estufa. 

Ambos os documentos contemplam uma lista extensa de perguntas aos participantes das consultas. Portanto, mudanças relevantes poderão ocorrer nos pronunciamentos finais.

Do shareholder para o stakeholder

Essas novas iniciativas objetivam a preparação e divulgação de informações financeiras com foco em criação de valor, e são voltadas principalmente ao mercado de capitais.

O Global Reporting Standards (GRI), o padrão mais utilizado atualmente no mundo para o reporte de informações sobre sustentabilidade, tem um propósito mais abrangente, voltado a informações para um público de partes interessadas mais amplo. Mas até aqui a convergência começa a acontecer.

Recentemente, o ISSB e o GRI divulgaram  um acordo de colaboração no qual se comprometeram a criar pilares para divulgação de informações sobre sustentabilidade, um sendo mais focado no mercado de capitais e o outro voltado a um público mais amplo, mas com uma compatibilidade entre eles.

Ainda existe um longo caminho para que essas diversas propostas sejam consolidadas e passem a ser adotadas pelas empresas. Esse conjunto de iniciativas indica quais são as tendências de reporte esperadas para o futuro próximo e representam um avanço considerável para que a lacuna de expectativa dos investidores e partes interessadas seja preenchida.

Mas, para além da transparência, é fundamental que esses novos padrões estimulem um número cada vez maior de empresas a refletirem sobre como os temas de ESG podem ser incorporados ao propósito, à estratégia corporativa e ao processo decisório da organização. O reporte, não nos esqueçamos, é o último estágio de uma estratégia de ESG.

* Mauricio Colombari é sócio da PwC Brasil