
O Banco Central Europeu (BCE) levantou uma série de preocupações com a proposta da Comissão Europeia de reduzir o escopo de empresas obrigadas a publicar relatórios de sustentabilidade. As mudanças sugeridas devem impactar negativamente a qualidade, disponibilidade e confiança dos dados de sustentabilidade, segundo a instituição financeira.
O documento de 44 páginas, assinado pela presidente do BCE, Christine Lagarde, vem em meio às discussões da Comissão Europeia de como simplificar a implementação das diversas diretivas publicadas nos últimos cinco anos sobre aspectos sociais, ambientais e climáticos que envolvem a operação de empresas.
A dificuldade das companhias em se ajustar à regulação, dos governos nacionais em se prepararem para a fiscalização e a ascensão da extrema direita na política europeia levaram à revisão das regras ESG. A Comissão argumentou estar recalibrando parte de suas leis para evitar que companhias europeias tenham sua competitividade prejudicada por encargos regulatórios excessivos.
As empresas já ganharam entre um e dois anos para se adequar às regras de due diligence e de relatórios, por exemplo.
No centro das críticas do BCE está a proposta de filtrar por tamanho as companhias submetidas à Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa (CSRD), que determina que empresas apresentem relatórios de sustentabilidade levando em conta a dupla materialidade.
Foco nas grandes empresas?
A Comissão sugere que apenas companhias com mais de mil empregados e um volume de negócios acima de € 50 milhões ou um balanço superior a € 25 milhões sejam submetidas à CSRD. Antes, todas com mais de 250 empregados seriam obrigadas a fazer a divulgação.
A alteração reduziria o número de empresas afetadas em 80% e seria uma resposta ao alerta feito por Mario Draghi, ex-presidente do BCE, sobre os impactos desproporcionais sobre pequenos e médios negócios.
Aquelas que ficarem de fora do escopo da diretiva poderiam publicar seus relatórios voluntariamente a partir de um padrão simplificado proposto pela própria Comissão.
Essa alteração pode limitar o acesso a informações importantes por diferentes partes interessadas e mascarar riscos financeiros ligados ao clima, alerta o BCE. Os impactos podem levar a um “enviesamento sistemático e não quantificável no cálculo de informações sobre sustentabilidade”.
O banco observa que tornar relatórios voluntários pode levar a um retrato incompleto: empresas que estejam performando bem em questões de sustentabilidade irão divulgar suas informações, enquanto as demais optarão por se abster.
Há ainda o risco de greenwashing, na visão da instituição. “As empresas podem divulgar informações seletivamente e, assim, transmitir uma imagem enganosa de seu desempenho em sustentabilidade.”
Os reportes voluntários também estariam isentos de qualquer tipo de verificação, como um parecer de auditor, ressalta o BCE. “A falta de dados sólidos e comparáveis pode limitar a capacidade das instituições de crédito de gerir de modo eficaz os riscos de sustentabilidade, levando a riscos para a estabilidade financeira e para a economia em geral.”
A proposta do banco é um meio termo: companhias com mais de 500 empregados estariam sujeitas à regra, mas com relatórios de sustentabilidade simplificados.
Due diligence
Outra proposta da Comissão é deixar instituições financeiras de fora da Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa (CSDDD), que impõe que companhias olhem para toda sua cadeia de valor e mitiguem os impactos negativos que causam na sociedade e no planeta.
No texto, o BCE argumenta que instituições financeiras não devem ser tratadas de forma diferente. “Para que o financiamento privado gerencie os riscos de forma eficaz e apoie a transição verde da economia real, é crucial que os requisitos regulamentares e legislativos sejam consistentes em todos os setores”, escreve Lagarde.
As propostas feitas pela Comissão Europeia ainda podem sofrer alteração, à medida que precisam de aprovação no Parlamento Europeu e no Conselho. Depois, devem ser ajustadas às leis nacionais dos Estados-membros para entrar em vigor.