Os carros elétricos são o futuro — disso quase ninguém mais duvida. Mas tudo indica que esse futuro passa, obrigatoriamente, pela economia circular.
Essa é a certeza de JB Straubel, o homem que, reza a lenda, convenceu Elon Musk de que o mundo caminharia para os veículos elétricos.
Depois de ter cofundado a Tesla e ter sido o seu diretor de tecnologia por 15 anos, Straubel deixou a empresa em 2019 e agora dedica seu tempo e fortuna a resolver o que considera ser o calcanhar de Aquiles da indústria de carros elétricos.
Sua startup Redwood Materials, fundada em 2017, desenvolveu uma tecnologia para fazer o que se chama de ‘mineração urbana’: ela recolhe baterias aposentadas de celulares e notebooks, pulveriza seus componentes para extrair minerais como cobalto, níquel e lítio, e devolve os materiais para a cadeia de fornecimento das baterias.
Na semana passada, a empresa recebeu um aporte de US$ 700 milhões, liderado pelo fundo de investimento T. Rowe Price, com a participação do Goldman Sachs, do fundo Breakthrough Energy Ventures de Bill Gates e do Climate Pledge Fund, da Amazon, para impulsionar sua produção.
São dois os problemas que Straubel quer resolver.
Um deles é a da escassez de materiais que está contratada. As jazidas de minérios em países como Congo, Austrália e Chile não darão conta de abastecer o mercado no futuro, conforme todas as montadoras do mundo correm para eletrificar o seu portfólio de produtos.
A outra dor que está na mira de Straubel é a da contradição ambiental dos carros elétricos.
Embora os carros tenham emissão zero de gases poluentes ao serem acionados, o processo de mineração, fabricação e descarte de baterias está longe de ser sustentável e pode se tornar um problema ambiental para a indústria conforme a tecnologia se torna dominante.
“Não é nada sustentável hoje, nem há realmente um plano iminente para tornar a produção sustentável”, disse Straubel em entrevista ao Financial Times. “Isso sempre me irritou um pouco na Tesla e se tornou mais aparente à medida em que escalamos tudo.”
(Há ainda uma questão geopolítica. Estabelecer uma cadeia de suprimentos doméstica desses minérios, a partir da reciclagem, é também estratégico para os Estados Unidos — vide a crise da indústria automobilística global com a interrupção do fornecimento de semicondutores em meio à pandemia. Hoje, a China já domina a cadeia de fornecimento de baterias.)
Périplo global
Além da mineração em si ser uma atividade que agride o meio-ambiente, os minérios dão múltiplas voltas ao mundo até chegarem, de fato, aos consumidores na forma de baterias.
O cobalto, por exemplo, é comumente extraído de jazidas no Congo e enviado para uma refinaria na Finlândia. O destino seguinte é a China, onde o minério é utilizado na produção dos componentes de baterias. A partir daí, viaja para os Estados Unidos ou para a Europa, onde a bateria é montada e finalizada. A viagem seguinte tem destinos diversos de acordo com a localização das montadoras que vão usar as baterias.
Ao longo dos últimos anos, a Redwood se tornou uma referência no negócio e atualmente é a maior companhia de reciclagem de baterias da América do Norte.
Todos os dias, a empresa recebe de dois a três caminhões que transportam 60 toneladas de sucata para ser separada e processada, resultando em 20 mil toneladas por ano de minério reciclado. Até hoje, já produziu o suficiente para fabricar 45 mil baterias de veículos.
É um processo intensivo em matéria-prima. Calcula-se que a produção de uma única bateria de um carro elétrico exige a reciclagem de 10 mil baterias de smartphone, por exemplo.
Para assegurar o seu fornecimento, a startup coleta materiais de diferentes fontes e está investindo num programa para que qualquer pessoa envie produtos eletrônicos abandonados para serem reciclados.
Por ora, a maior parte vem de parcerias estratégicas firmadas para facilitar a logística da chegada da sucata. Empresas como Amazon, Proterra (que fabrica ônibus elétricos), Specialized (de bicicletas) e Panasonic já separam o material.
Esta última recebe de volta da Redwood os minerais para produzir novas células de baterias que são usadas pela Tesla em seus carros.
Com o aporte da semana passada, que avaliou a companhia em US$ 3,7 bilhões, os planos são de triplicar o tamanho da fábrica em Carson City (próxima à Tesla) até o fim deste ano e, nos próximos dois anos, agregar 500 novos funcionários à equipe que hoje conta com 130 pessoas.
(Com edição de Vanessa Adachi)