O governo dos Estados Unidos quer impor limites mais estritos às emissões de poluentes de veículos leves, na prática forçando a indústria a acelerar a transição para os motores elétricos.
O novo padrão, apresentado hoje, começaria a ser aplicado nos modelos ano 2027 e representa uma das medidas mais ambiciosas do país rumo à descarbonização da economia.
Caso seja aprovada, a nova regulamentação terá um impacto sem precedentes na indústria automobilística americana, com reflexos no setor no resto do mundo.
O cálculo da Environmental Protection Agency (EPA), agência do governo responsável pela proteção ambiental, é que com a medida em vigor dois terços dos novos carros vendidos no mercado americano em 2032 seriam elétricos.
É um aumento significativo em relação à meta já anunciada do governo Joe Biden de que os elétricos sejam 50% das novas vendas no fim da década.
Considerando os números atuais, o salto é gigantesco: no ano passado, a porcentagem de carros a bateria não chegou a 6% dos novos vendidos.
Outra regra semelhante que se aplica a veículos de médio porte, como camionetes e ônibus, pode representar a conversão de metade dessa frota em 2032.
“Ao propor os padrões de poluentes mais ambiciosos de todos os tempos, estamos entregando a promessa de proteger a população e o planeta”, afirmou em comunicado o diretor da EPA, Michael Regan.
Atalho
As regras serão submetidas à consulta pública e devem ser concluídas somente no ano que vem. Elas não obrigam diretamente a eletrificação da frota, algo que está além do alcance da EPA.
A proposta gira em torno dos limites de poluentes emitidos pelos escapamentos dos veículos que queimam combustíveis fósseis.
A legislação que trata da qualidade do ar permite que a agência estabeleça tetos globais para a poluição emitida pelos total de carros vendidos a cada ano pelas montadoras. Com o aperto dos limites, a única maneira de cumpri-los seria com o aumento na proporção de carros elétricos.
É certo que o assunto vai envolver uma intensa disputa entre lobistas da indústria, representantes dos trabalhadores e políticos.
A Alliance for Automotive Innovation, uma entidade que representa os interesses das grandes montadoras, classificou o plano de “agressivo” ao ao New York Times.
Uma das críticas é em relação aos suprimentos de matérias-primas essenciais para a transição dos carros. Temores em relação ao desabastecimento de lítio, o ingrediente mais importante das baterias, levou empresas como a GM a investir em mineração.
A indústria ainda não está segura em relação à demanda por carros 100% elétricos, que ainda custam mais caro que os tradicionais, e também há dúvidas sobre a extensão da rede de recarga.
Menos empregos?
Outra questão ainda sem resposta é o futuro dos trabalhadores. A indústria automotiva emprega cerca de 1 milhão de pessoas nos Estados Unidos.
Como são mais simples mecanicamente, os carros elétricos exigem menos funcionários nas linhas de montagem. Pelo mesmo motivo, eles tendem a exigir menos manutenção e menos peças de reposição.
A ideia original da EPA, segundo o New York Times, era anunciar o plano em Detroit, a capital da indústria automobilística do país, exibindo carros elétricos made in the USA.
O plano foi abandonado porque a maior central sindical de trabalhadores da indústria não quis dar apoio público à ideia.
Entre a oposição republicana, a reação foi a esperada: enquadrar o assunto nos termos da guerra cultural que divide o país ao meio. “O governo Biden quer decidir que carros os americanos podem comprar e dirigir”, disse a senadora Shelley Capito ao Wall Street Journal.
Conciliar o impacto ambiental com os múltiplos interesses afetados por uma transformação tão profunda e tão rápida será o desafio dos próximos meses.
É difícil contestar o argumento climático. A proposta reduziria as emissões de gases de efeito estufa americanas em 10 bilhões de toneladas até 2055.
Isso equivale a duas vezes todas as emissões do país inteiro no ano passado, ou quatro vezes as do setor de transportes americano. A EPA também aponta a melhoria da qualidade do ar e uma redução de 20 bilhões de barris de petróleo importados.