O BTG Pactual acaba de criar uma área para investir no reflorestamento de áreas degradadas do Brasil e de outros países da América Latina. Batizado de Landscape Capital, o negócio está em fase de sondagem de mercado para levantar US$ 1 bilhão de investidores brasileiros e estrangeiros.
A nova estratégia faz parte do Timberland Investment Group (TIG), o braço de investimento em florestas do BTG, que está entre os maiores do mundo no segmento. Mas, enquanto a abordagem tradicional do TIG é a compra de áreas de florestas já plantadas para comercialização da madeira, o foco da Landscape Capital é a mudança climática.
O banco quer preencher um gap que identifica no mercado.
“A maior parte dos financiamentos na área climática hoje vão para energias renováveis e descarbonização do setor de transportes. Mas esses apenas evitam novas emissões, enquanto as florestas capturam carbono da atmosfera”, diz Mark Wishnie, que lidera a área de sustentabilidade do TIG e assumiu a nova divisão.
Especialista em reflorestamento de matas tropicais, ele esteve na ONG The Nature Conservancy nos últimos três anos liderando um programa global de florestas e mudança climática. Em abril deste ano retornou ao TIG, de onde havia saído em 2017, para colocar o novo projeto de pé.
“O nosso negócio tradicional é comprar florestas existentes, que têm menos risco, porque são ativos estabelecidos e que geram caixa. Mas sabemos, pela ciência, que a forma mais poderosa de entregar benefícios climáticos é aumentar a área de florestas”, diz.
Dentro da nova estratégia de investimento, o primeiro foco será comprar terras que já foram florestas um dia, mas que foram convertidas em pastagem. Os investimentos serão todos feitos na América Latina, e Brasil e Paraguai são apontados como dois mercados promissores. Em terras brasileiras, não só a Amazônia interessa, mas também os biomas do Cerrado e da Mata Atlântica.
A ideia é que cerca de metade das áreas seja reflorestada com as espécies nativas da região. “Essa é a melhor forma de assegurar impactos positivos sobre a biodiversidade e outros recursos naturais.”
Na outra metade das terras compradas, serão plantadas espécies exóticas, como pinus e eucalipto, com o objetivo de comercialização da madeira. Em grande medida, é isso que garantirá o retorno que o banco pretende dar aos investidores.
O objetivo, diz Wishnie, é entregar retorno financeiro e benefícios climáticos.
“Mas, enquanto nosso negócio tradicional é desenhado em torno da lógica de maximizar o retorno, dentro de um framework de gestão sustentável das florestas, na Landscape Capital estamos desenhando primeiro os benefícios climáticos e depois vamos inovar para encontrar formas de entregar o retorno financeiro.”
Ele não faz estimativas para o fundo, mas diz que no Brasil, hoje, a expectativa dos investidores em ativos florestais é de um retorno real entre 7,5% e 9% ao ano em moeda local.
As áreas de floresta nativa também entrarão na equação de retorno.
A ideia é gerar receita com a venda de compensação de carbono das florestas nativas e também das exóticas, conta que deve se expandir no futuro, na medida em que os mercados de créditos de carbono se desenvolvam. Wishnie vê ainda oportunidade de venda de outros serviços ambientais, como a melhoria da qualidade da água, embora com potencial mais limitado de receita.
Urgência e oportunidade
Mark Wishnie diz que a decisão de criar a nova área partiu da constatação de que existia uma convergência entre uma necessidade e uma oportunidade.
“A necessidade é justamente a urgência da mudança climática, com impactos mais tangíveis a cada dia. E isso vem sendo reconhecido não só por governos e sociedade, mas também pelos investidores.” Um exemplo é a Net Zero Alliance, que reúne 33 dos maiores fundos de pensão e seguradoras do mundo, com US$ 5 trilhões em ativos, e que se comprometeram a tornar seus portfólios neutros em carbono até 2050.
Nesse contexto, diz, tem crescido entre a comunidade científica a certeza de que a terra, especialmente as florestas, são uma parte relevante da mitigação da mudança climática. “Pesquisas recentes indicam que as terras e florestas bem manejadas podem responder por um terço das metas do Acordo de Paris pelo clima, mais que o setor de transportes.”
E, embora esteja cada vez mais claro que é crítico como parte da solução, historicamente o setor de florestas recebe parcos recursos.
Wishie diz que o desafio, do lado do investimento, é que há pouca oferta no mercado de soluções com retornos adequados ajustados pelo risco. “Muitas ofertas têm um grande impacto ambiental e social, mas em pequena escala.”
O BTG acredita que esse é um lugar que tem condições de ocupar. “Temos a oportunidade de alavancar a plataforma de investimentos florestais do BTG, que é o quinto ou sexto maior investidor em florestas do mundo. Temos a capacidade de destravar capital em escala para florestas, com nossa tecnologia e conhecimento da equipe.” Atualmente, o TIG tem US$ 3,5 bilhões entre ativos e capital comprometido e ainda não investido.
Cidades de madeira
A Landscape Capital também avalia fazer investimentos no downstream da cadeia, ou seja, em soluções inovadoras para aplicação da madeira de reflorestamento.
Wishnie é um entusiasta, particularmente, do chamado “mass timber”, sistema construtivo que utiliza placas, pilares e vigas de madeira no lugar dos tradicionais aço e concreto, para erguer edifícios de múltiplos andares. O sistema vem ganhando adeptos pelo mundo e o maior prédio com emprego dessa tecnologia começou a ser construído há poucos meses em Milwaukee, no Estado americano de Winsconsin, e terá 25 andares.
Wishnie diz que é uma grande oportunidade para descarbonizar o setor da construção civil. “Existem cálculos de que, até 2050, o número de construções no planeta terá dobrado. Então, encontrar formas de descarbonizar esse setor é muito importante.”
Além de a substituição do aço e do concreto reduzir as emissões de CO2 do processo construtivo em mais de 60%, segundo algumas estimativas, a madeira é um depósito natural do carbono que foi retirado da atmosfera durante o crescimento das árvores.
“Uma pesquisa na qual estou envolvido agora e que será publicada no ano que vem deve mostrar que, se você considerar também essa estocagem de CO2, o edifício pode se tornar positivo em carbono.” Ou seja, tudo somado faz com que o benefício ambiental ultrapasse o do simples cultivo das árvores.
Além do benefício ambiental, a estratégia também pretende entregar impacto social, diz Patrícia Genelhú, que lidera a área de investimentos sustentáveis e de impacto no BTG.
“Por meio do investimento nesses ativos, poderemos atingir comunidades não atendidas por serviços básicos e podemos criar parcerias para melhorar educação e saúde”, diz. Segundo ela, a Landscape vai usar o sistema de medição de impacto desenvolvido pelo Global Impact Investing Network (GIIN), chamado de IRIS+, para monitorar e reportar os impactos alcançados nos projetos.
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