Green bonds voltam à pauta e Rumo prepara emissão

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Com o mercado para emissão de dívidas começando a ficar um pouco menos nebuloso e o tema socioambiental ganhando relevância entre os investidores, as empresas nacionais voltam a se movimentar para a emissão de títulos verdes. 

A Rumo está preparando uma emissão para as próximas semanas, que deve contar com a certificação de ‘green bond’, segundo apurou o Reset. 

A concessionária de ferrovias controlada pelo grupo Cosan já levantou R$ 800 milhões em maio, numa operação com prazo de dez anos e cujos recursos serão usados na duplicação da Malha Paulista. 

Em tese, essa operação já poderia ter sido enquadrada como green bond, mas a empresa privilegiou a celeridade do processo num momento em que havia incertezas sobre o tamanho da janela de mercado. 

Na prática, a emissão da Rumo foi a primeira a inaugurar o mercado pós-pandemia para empresas carentes de liquidez ou com o balanço estressado em virtude da covid. Procurada, a empresa não quis comentar. 

Segundo especialistas de mercado, as empresas que começam a buscar a certificação verde estão mais concentradas em setores cujo core business tem efeitos sociais ou ambientais positivos — como é o caso de ferrovias, que naturalmente reduzem a necessidade de caminhões para o escoamento de carga. 

Fabricantes de papel e celulose, que já têm certificação para emissões desse tipo, podem acessar o mercado e sucroalcooleiras também estão no pipeline. A expectativa é que o mercado como um todo ganhe mais tração até o quarto trimestre. 

“Num momento de liquidez ainda apertada e investidores mais avessos ao risco, pouca gente quer sair com um emissão com o uso de recursos muito restritivo ou específico para uma parte do negócio”, diz o executivo que coordena a distribuição de títulos locais em um grande banco. 

A instituição está em discussão para operações de cerca de R$ 3 bilhões que podem levar o selo verde, ainda que os emissores não tenham batido o martelo sobre se vão de fato sair com a certificação. Num cenário otimista, o volume total emitido poderia chegar a R$ 5 bilhões no ano, um salto se comparado aos R$ 7,5 bilhões que foram vendidos até hoje no país.

Emissores também estão se movimentando para criar frameworks para os empréstimos ESG pós-fixados, que podem ser usados tanto para acessar o mercado de capitais quanto para financiamento bancário. Nessa modalidade, o pagamento de juros está condicionado ao atingimento de metas específicas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) específicas.

Neste mês, a Tereos, de açúcar e álcool, fechou um empréstimo sindicalizado de US$105 milhões e prazo de cinco anos, com um conjunto de sete bancos. 

O custo está atrelado a quatro metas: redução de emissões de gases de efeito-estufa, redução relativa do consumo de água na moagem de cana, aumento de certificação de matéria-prima e aumentar seu rating ESG, medido pela EcoVadis. 

O mercado para títulos com certificação verde estava aquecido no começo do ano, mas esfriou com a chegada da crise do coronavírus.

Neste ano, a Klabin captou US$ 200 milhões no mercado internacional, reabrindo uma emissão de notas anterior com vencimento em 2049, o banco BV levantou US$ 50 milhões em uma emissão externa e a Neoenergia e a Taesa levantaram outros R$ 300 milhões e R$ 450 milhões, respectivamente, em debêntures verdes. 

Em fevereiro, saiu a emissão da geradora solar Faro Energy, de R$ 15 milhões, e a FS Energia levantou R$ 210 milhões por meio de um Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) verde.

Debêntures incentivadas

Um estímulo às emissões verdes veio do governo. 

No começo do mês, foi publicado um decreto incluindo projetos com benefícios sociais e ambientais como aqueles que podem ser elegíveis para a emissão de debêntures incentivadas de infraestrutura, que contam com isenção de Imposto de Renda para investidores pessoa física. 

O setor mais óbvio na fila para acessar a oportunidade é o de geração distribuída de energia, solar ou de biogás. Na redação original, a regulação exigia que as empresas tivessem uma concessão, permissão ou parceria público-privada (PPI) junto ao governo para a emissão, o que agora não é mais necessário. 

“Com isso, abriram o conceito e estão trazendo para a mesa empresas que estavam fora do jogo antes”, diz o advogado Alexei Bonamin, sócio do escritório TozziniFreire. “O setor de geração distribuída é o que está mais ativo e se enquadra mais facilmente nessa definição.”

A lista de possíveis emissores, no entanto, vai além e inclui aterros sanitários e empresas de saneamento, especialmente agora com a aprovação do marco regulatório do setor. O decreto acelera ainda a aprovação dos projetos sociais ou ambientais, os submetendo a um fast track.

Além disso, pela primeira vez foram incluídos no decreto projetos sociais, voltados para “aglomerados subnormais ou áreas urbanas isoladas”, o termo usado pelo IBGE para designar favelas. 

O decreto é relativamente vago e o mercado ainda aguarda a divulgação das normas pelos ministérios competentes em cada segmento, que ficarão responsáveis pela efetiva regulamentação. 

“Precisamos ver como virão essas portarias, mas o investidor precisará ficar muito atento com o que tem impacto social ou ambiental e o que é green ou social washing”, diz Ana Luci Grizzi, sócia de direito ambiental do Veirano Advogados. 

Nesse sentido, o selo de certificadores independentes deve ser uma garantia relevante.

“Isso é uma demanda cada vez maior do investidor que privilegia monitoramento, reporte, transparência, quer métricas que já são testadas para green bonds”, diz Bonamin, do TozziniFreire.  

Explicando: os ‘green bonds’  ou ‘social bonds’ são aqueles que contam com uma certificação de avaliadores externos, que dão um selo garantindo que o uso dos recursos será voltado para projetos que geram benefícios ambientais ou sociais.

Trata-se aqui de um incentivo de mercado: os investidores têm uma garantia do uso dos recursos e se beneficiam de uma transparência maior. Ainda não há, no entanto, evidências de que o preço dessas emissões certificadas seja menor. 

Diversas emissões verdes certificadas feitas no país saíram como debêntures de infraestrutura, como é o caso de emissões de geradoras e transmissoras de energia renovável. 

Mais incentivo? 

Um outro projeto de lei, de autoria dos deputados Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) e João Maia (PL-RN), quer dar isenção fiscal também às empresas emissoras das debêntures de infraestrutura, como uma forma de incentivar a captação de recursos para esses projetos junto a investidores privados. 

A proposta é que 30% dos juros pagos nas emissões possam ser deduzidos da apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, um percentual que passaria a 50% para projetos com benefícios sociais e ambientais. 

O PL ainda está em fase preliminar na Câmara, mas desperta algum ceticismo no mercado, especialmente diante da necessidade de aperto fiscal e do discurso do governo que vinha querendo tirar incentivos de produtos como Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio. 

“Pela lei de responsabilidade fiscal, toda proposta de isenção fiscal precisa ser comprovada por uma receita equivalente”, diz um distribuidor. “Não é simples comprovar que os projetos com benefícios sociais ou ambientais tenham um resultado diferente dos demais.”

Advogados apontam ainda uma dificuldade técnica: boa parte das empresas de infraestrutura separam os projetos em Sociedades de Propósito Específico (SPEs), CPNJs distintos que investem na frente e demoram anos a ter efetivamente lucro para ser deduzido. 

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