No dia dedicado a discutir a transição energética do mundo na COP26, dois compromissos anunciados saíram com gosto amargo, levantando mais dúvidas sobre a capacidade dos países de fechar o tão esperado acordo sobre mercados de carbono nos próximos dias.
Um pacto para acabar com o uso do carvão como fonte de energia, que o anfitrião Reino Unido queria que fosse um dos símbolos do encontro em Glasgow, ficou sem a assinatura dos Estados Unidos, terceiro maior consumidor de carvão do mundo. Os americanos se retiraram de última hora e engrossaram a lista de grandes consumidores de carvão ausentes do acordo, que já contava com Índia, Austrália e China.
Sun Zhen, membro da delegação da China e também chefe do departamento de mudanças climáticas do ministério do meio ambiente do país, disse que, “em vez de focar na redução do uso de carvão, devemos nos concentrar em reduzir a emissão do carvão”, referindo-se a tecnologias de captura e armazenagem de CO2.
Segundo o Financial Times, o acordo assinado por 40 países determina que os países desenvolvidos abandonem o carvão durante a década de 2030, um retrocesso em relação à meta original de ter o ano de 2030 como prazo final. Já os países em desenvolvimento prometeram fazer a transição do carvão ao longo da década de 2040 (o Brasil utiliza muito pouco carvão em sua matriz energética).
Em uma frente paralela, um acordo de mais de 20 países para que cessem o financiamento de organismos públicos a projetos de carvão, petróleo e gás até o fim de 2022 contou com a presença americana, mas teve ausências também relevantes entre os signatários: China, Japão, Coreia do Sul e Espanha, que nos últimos dois anos destinaram US$ 32 bi para projetos fósseis. Como um pequeno prêmio de consolação diante das enormes ausências, a Itália aderiu ao pacto na última hora.
No quintal dos EUA
Se Joe Biden estipulou a meta de ter uma matriz energética livre de carbono até 2035, por que os Estados Unidos pularam fora do acordo do carvão?
Dentro de casa, o presidente americano tem enfrentando enorme dificuldade para aprovar no Senado seu megapacote de investimentos em infraestrutura (que carrega boa dose de medidas na frente de energias limpas) e, segundo analistas políticos, evitou tomar uma posição mais clara em Glasgow contra o carvão para não estressar as conversas com senadores de Estados americanos dependentes do minério.
As declarações de Biden pedindo que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) aumentasse a produção diária de petróleo — enquanto os negociadores ainda estão em Glasgow, também pegou mal.
Os preços dos combustíveis estão altos “porque a Rússia e os países da OPEP se recusam a produzir mais”, afirmou o presidente americano. O pedido foi recusado. A aliança anunciou nesta quinta-feira que a produção vai aumentar somente 400 mil barris diários, um volume que não deve mexer nos preços internacionais.
Uma das explicações para a resistência do cartel petroleiro tem a ver justamente com as pressões pela transição energética. Com a cotação do petróleo nos níveis mais altos em sete anos, graças à recuperação econômica global pós-pandemia, muitos países produtores estão aproveitando para fazer o caixa que vai bancar investimentos em fontes renováveis.