Está começando a sair do papel uma das principais apostas do governo para o financiamento climático do Brasil.
O Tesouro Nacional fará o primeiro leilão para que os bancos possam tomar uma linha de crédito subsidiada para financiar projetos da economia verde. Trata-se do primeiro passo concreto do EcoInvest, programa criado no primeiro semestre para atrair capital privado internacional para financiar a transição da economia do país para baixo carbono.
O processo foi aberto em julho e a entrega das propostas está marcada para 11 de outubro. Os lances mínimos são de R$ 100 milhões.
Trata-se um uma modalidade financeira conhecida como blended finance, em que o capital catalítico (filantrópico ou subsidiado) entra para reduzir custos ou mitigar riscos, atraindo recursos privados em maior escala.
O principal critério de seleção das propostas no leilão será justamente a capacidade dos bancos de alavancar o dinheiro subsidiado com recursos captados no exterior. Pelas regras, a alavancagem mínima tem que ser de seis vezes.
Ou seja, para ter direito a receber R$ 100 milhões, o banco terá que se comprometer a captar ao menos R$ 500 milhões no mercado externo, via emissão de título de dívida ou contrato de empréstimo.
A somatória de R$ 600 milhões terá que ser destinada ao financiamento de projetos que contribuam para a redução das emissões de gases de efeito estufa ou para a adaptação às mudanças climáticas, seguindo uma lista de setores e atividades que também foram definidos pelo governo.
A linha tem prazo de pagamento de até dez anos, com amortizações durante o período, e custará para os bancos 1% ao ano (taxa nominal, sem inflação). Como os recursos captados fora terão custo de mercado, quanto maior a alavancagem, mais o subsídio será diluído, encarecendo o custo do funding e a taxa para o tomador final.
“O custo dos recursos será atrativo para projetos que já estejam rodando, mas não para tirar novos negócios do papel”, avalia o executivo de um grande banco.
O Tesouro não informou qual será o valor total leiloado. Segundo um integrante da equipe do governo, no limite, há espaço para chegar a R$ 10 bilhões este ano, mas é pouco provável que se atinja essa cifra num primeiro teste e faltando poucos meses para o ano terminar. Igual volume está reservado para 2025.
Cada banco – ou consórcio formado por duas instituições – poderá fazer quantos lances quiser, com índices de alavancagem diferentes. A única limitação é que uma instituição não poderá levar mais do que 25% dos recursos leiloados.
Os recursos do Tesouro serão denominados em reais, portanto, sem risco cambial para os tomadores dos empréstimos. E ao menos 60% do dinheiro captado pelos bancos terá que contar com proteção cambial.
A linha será operada via Fundo Clima, com dinheiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e também das duas emissões de ‘sustainable bonds’ de US$ 2 bilhões cada, feitas pela República este ano.
Depois de receber as propostas, o Tesouro terá 20 dias para organizá-las e enviar para o comitê executivo para aprovação da alocação dos recursos.
Projeto de lei
A Medida Provisória que criou a linha de blended finance já caducou e agora um projeto de lei precisa passar pelo Congresso. A Câmara deu o aval na semana retrasada e o PL seguiu para o Senado.
A realização do leilão não depende da aprovação, mas ela precisa acontecer antes da homologação e divulgação dos resultados (45 dias depois do certame).
Apetite e aplicação
O Tesouro tem conversado ativamente com a Febraban, federação que reúne os bancos, e com instituições financeiras individualmente, tirando dúvidas e também ouvindo sugestões.
“Vai funcionar como um piloto para o Tesouro e para todo o mercado. Todos estão alinhados com o mesmo objetivo de aumentar o financiamento climático, agora vamos testar como funcionará na prática”, diz a executiva de um grande banco privado que deve participar do certame.
Depois de algumas dessas conversas houve a decisão de reduzir o lance mínimo, previsto inicialmente em R$ 500 milhões, e também de adiar a data-limite para entrega das propostas de 9 de setembro para 11 de outubro.
“A redução do tamanho do lance vai permitir a participação de mais instituições”, comenta um executivo.
Além de captar os recursos, os bancos terão trabalho para originar a carteira de projetos verdes. O governo deixou de fora os setores de energia solar e eólica, por considerar que já existe bastante capital para ambos. Apenas a geração distribuída está contemplada.
A lista de 19 setores elegíveis vai de biocombustíveis a produtos florestais, passando por indústria de baixo carbono, agropecuária sustentável, edifícios resilientes e captura de carbono. Para cada um desses, há um detalhamento das atividades que podem ser financiadas.
“Para este primeiro leilão, estamos varrendo a carteira de clientes para ver quais têm projetos que se enquadram. Nos próximos, novos clientes devem ser atraídos”, diz o executivo de um banco.
A ideia é que os próximos leilões sejam para setores específicos da lista.