Como o Will Bank quer chegar ao pódio da baixa renda

Dando acesso a quem nunca teve um cartão de crédito, banco chegou a R$ 8 bi em transações em 2021

A mão de uma pessoa negra segura um cartão amarelo do Will Bank
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O Will Bank é a fintech mais bem-sucedida de que você nunca ouviu falar.

Com seus 2 milhões de cliente conquistados em menos de quatro anos – a maioria mulheres e 61% negros – o Will está provando que não só é possível dizer “sim” para a enorme massa de pessoas à margem do sistema financeiro como também ganhar dinheiro.

A fintech deve fechar 2021 com R$ 8 bilhões em transações no seu cartão de crédito amarelinho e um faturamento de R$ 850 milhões.

O Will opera no azul desde 2019 focando nos desbancarizados, um segmento enorme, que passou a fazer sentido econômico com um olhar inovador e uma disposição de aprender algo novo a cada dia.

O principal produto da fintech são os cartões de crédito, algo que 40% dos seus clientes nunca tinham tido na vida. O passo seguinte é avançar na oferta de outros serviços, como as contas digitais, crédito pessoal e até mesmo investimentos.

O público pode ter renda baixa, de mais ou menos três salários mínimos, mas isso não quer dizer que ele não poupe.

A área de pesquisa do banco – que conta com antropólogos, economistas e engenheiros – descobriu que 70% dos clientes têm algum tipo de economia. Mas metade vai para a poupança e metade para debaixo do colchão.

“O mercado financeiro cria produtos para si mesmo, não para as pessoas”, diz Felipe Félix, fundador e CEO do Will Bank.

Para levar adiante seu projeto de inclusão financeira, a fintech recebeu um aporte de R$ 250 milhões, em julho, do fundo de private equity da XP e da Atmos Capital – o que, somado ao patrimônio anterior de R$ 100 milhões, a deixa, por ora, numa posição de capital confortável, que comporta certa alavancagem.

A partir deste mês, novos clientes que contratarem um cartão de crédito terão acesso também ao serviço de conta digital e alguns produtos de investimento, como CDBs, o que também vai turbinar o funding do banco para continuar emprestando.

A ideia é expandir o acesso para toda a base ao longo do primeiro trimestre do ano que vem.

“As pessoas não precisam entender o que é CDI, Selic, LCA. Se a gente for esperar fechar o gap educacional, que está associado ao gap social, vai demorar dezenas de anos”, diz Félix. “Em vez de dizer que o rendimento é de 8%, dá para falar “a cada R$ 100 investidos, você recebe mais R$ 8.”

Uma empresa de dados

Essa atenção com a linguagem deixa clara a diferença entre o Will Bank e startups como Nubank e Inter. Esses bancos digitais cresceram fisgando o cliente insatisfeito com os Bradescos e Itaús da vida, oferecendo aplicativos mais amigáveis e taxas mais baixas.

O Will olha para as pessoas que muitas vezes nem sequer conseguem passar pela porta dos bancões. Outra diferença diz respeito ao marketing. A empresa não investe em branding tradicional.

Todo o investimento de publicidade é feito em redes sociais, o chamado “marketing de performance”. Mas a maior ferramenta de aquisição de novos clientes, segundo Félix, é o boca a boca.

As instituições financeiras costumam vender a imagem de solidez e confiança. No caso do Will, o sentido é inverso: é o banco que dá um voto de confiança ao cliente.

O motor do negócio são os modelos proprietários de concessão de crédito. Tradicionalmente, eles se baseiam em informações históricas. Como isso não existe para o público que quer alcançar, a fintech desenvolveu algoritmos que levam em conta centenas de outras informações.

Mais que uma fintech ou uma companhia de tecnologia, o Will Bank é uma empresa de dados.

Retrato da marginalização

O Will Bank nasceu em maio de 2017, com outro nome: Pag!

Félix, um paraibano de 32 anos formado em engenharia naval pela Universidade de São Paulo (“mas não sei construir navios”), trabalhava na Avista, uma administradora de cartões voltados para a população de baixa renda do Espírito Santo.

A Avista criava produtos para que varejistas ou supermercados oferecessem crédito ou vantagens para seus clientes. Era um instrumento importante de inclusão, mas não atacava o problema maior: a desbancarização.

Mas, com uma experiência de 20 anos no mercado de crédito, a família Piana, dona da Avista, decidiu criar a Pag! com o engenheiro. Enquanto Félix é o CEO, Giovanni Piana é o presidente do conselho do banco. 

A marca adotada inicialmente mudou no ano passado. A ideia é que Will, um apelido de William, torna a marca mais pessoal.

Hoje, 60% dos clientes do Will estão no Nordeste, e 55% deles em cidades pequenas. Não foi uma decisão deliberada. A boa performance na região foi detectada quando o serviço já estava lançado. 

Aos poucos, a fintech começou a atingir uma parcela da população que, mesmo com acesso fácil a agência bancária, simplesmente estava fora do sistema financeiro. Às vezes até tinha uma conta poupança com cartão de débito, mas nunca um cartão de crédito.

Félix atribui o sucesso em boa parte ao relacionamento com pessoas que tiveram experiências ruins, ou já ouviram histórias de terror, envolvendo negativação e mau atendimento.

“Ninguém dá crédito melhor que o Itaú, que tem 50 milhões de CPFs”, disse Félix numa entrevista recente ao podcast Kritike. “Mas o problema não é lidar com a inadimplência, e sim o custo operacional.”

O gasto médio do cliente do Will Bank no cartão é R$ 700, e o limite típico é de R$ 1.100. “Para os grandes, esse valor não justifica a abertura de uma conta”, afirma o fundador.

Assista à entrevista de Felipe Félix no podcast Kritike


E o risco? A fintech não revela números exatos de inadimplência. Afirma só que está abaixo de 5%. No ano passado, o índice do Nubank foi de 3,7%.

Como o número de inadimplência tende a ser mais ‘nervoso’ por causa do seu modelo, a fintech precisa segurar um pouco o ritmo com que coloca novos clientes para dentro, diz uma pessoa com conhecimento do negócio. “Ainda assim, deve crescer 50% ao ano nos próximos anos e estar no pódio da baixa renda.”