A chamada economia azul, que dedica recursos para preservação de recursos hídricos, está crescendo – e tem o Brasil como um dos expoentes. Impulsionado pelos investimentos em saneamento a partir das concessões do serviço ao setor privado, o país é o maior emissor de ‘blue bonds’ acima de US$ 100 milhões, de acordo com novo relatório da Sustainable Fitch, braço de sustentabilidade da Fitch Ratings
Os blue bonds, ou títulos de dívida azuis, são uma parte do universo dos green bonds, os títulos de dívida que têm seus recursos carimbados para projetos com benefício ambiental. No caso dos azuis, o dinheiro necessariamente envolve projetos ligados à água, como conservação da biodiversidade marinha ou melhoria na infraestrutura de captação ou tratamento da água.
O mercado ainda é pequeno: desde que surgiram até junho deste ano, foram US$ 12,3 bilhões em dívidas emitidas com esse rótulo, segundo relatório da agência de rating Fitch – menos de 1% de toda a dívida ESG.
Governos de diferentes esferas e instituições financeiras eram os maiores emissores até 2022, mas o cenário vem mudando desde o ano passado, quando companhias passaram a ampliar sua participação no segmento.
A empresa de saneamento brasileira Aegea foi um dos destaque pela Fitch. Entre títulos com recursos carimbados para os projetos e atrelados a sustentabilidade (SLBs, na sigla em inglês), a empresa emitiu mais de US$ 1,1 bilhão em 2023.
Neste ano, a Aegea fez emissões similares que somam US$ 692 milhões, acompanhada pela Sabesp – que emitiu US$ 437 milhões para financiar a gestão sustentável da água – e pela Sanepar, que fez uma captação de US$ 124 milhões para projetos relacionados ao tratamento da água.
Uma operação da BRK Ambiental em 2022, de US$ 378 milhões, para gestão sustentável de água, também contribuiu para colocar o Brasil no topo da lista.
As travas do mercado
Na avaliação dos analistas da Fitch, para que empréstimos, dívidas e outros instrumentos da economia azul ganhem escala, é preciso que haja uma maior clareza dos parâmetros e definições.
Projetos ligados à água doce têm critérios melhor desenhados, que abrangem principalmente fases do saneamento básico e tratamento da água. O mesmo não ocorre com iniciativas em área marítima ou oceânica, o que limita a atração de recursos, na opinião dos analistas.
“Uma gama mais ampla de atividades relacionadas ao oceano ainda não está incorporada nas taxonomias [sustentáveis] regionais, como a da União Europeia ou a Climate Bond Taxonomy. Essa omissão pode ser atribuída à ambiguidade técnica e ao estágio inicial da compreensão do potencial impacto ambiental, dificultando a avaliação da elegibilidade das atividades oceânicas”, escrevem.
A Fitch analisou as taxonomias da UE, Climate Bond Initiative, China, Ásia-Cingapura e Associação das Nações do Sudeste Asiático. Elas mencionam, por exemplo, a maior oferta de água e de produtos ‘ocean-friendly’. Já projetos ligados à poluição marinha são incluídos apenas na taxonomia chinesa, enquanto a adaptação e a resiliência climática em áreas costeiras e o turismo sustentável marinho ou costeiro não aparecem em nenhuma delas.
Diversificação do portfólio
Um número maior de emissões corporativas de blue bonds pode contribuir para a diversificação do portfólio de investidores, avalia a Fitch. Eles seriam uma ferramenta para aumentar a exposição a economias emergentes, como a América Latina.
Mas dar escala é um desafio, já que ainda faltam projetos prontos para receber investimentos em ambiente marinho e a confiança do mercado precisa ser conquistada.
A Fitch afirma que há um número crescente de gestores de ativos que buscam incorporar blue bonds em suas estratégias de renda fixa “como uma forma de diversificar ativos, ao mesmo tempo em que contribuem para o impacto ambiental e social de um ecossistema sustentável de água e oceanos”.