Como Marina Feffer já mobilizou US$ 840 milhões em doações de herdeiros

Herdeira da Suzano fundou o Generation Pledge, uma comunidade que reúne novas gerações de famílias de elevado patrimônio no mundo todo

Marina Feffer, da família controladora da Suzano, é fundadora do Generation Pledge, comunidade que reúne herdeiros do mundo todo que se comprometem a doar parte do patrimônio para a filantropia estratégica
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Há seis anos, Marina Feffer, a filha caçula do controlador da Suzano, David Feffer, fundou uma comunidade para reunir herdeiros de diversos países dispostos a assumir o compromisso de doar uma parte relevante de suas heranças para o que ela chama de filantropia estratégica.

Desde então, o Generation Pledge, como foi batizada a iniciativa, já conseguiu a adesão de 93 pessoas, de 24 países diferentes. “O Brasil tem 33 famílias e representa 35% da comunidade. E, no total, já temos comprometida a mobilização de US$ 840 milhões”, diz Feffer, que não revela quem são os associados. 

Além dela própria, sabe-se que também aderiu ao compromisso o cofundador da iniciativa e seu amigo de muitos anos Sid Efromovich, herdeiro da família que controla a aérea Avianca. 

O compromisso funciona assim: herdeiros que já receberam ou que receberão ao menos US$ 10 milhões como herança se comprometem a doar pelo menos 10% do valor para a filantropia nos primeiros cinco anos a partir do recebimento dos recursos. 

“Não uma filantropia bobinha, mas uma filantropia estratégica”, diz Feffer. É uma referência à mobilização de capital privado em escala para soluções que aumentem o bem-estar e reduzam o sofrimento das pessoas de forma geral e também combatam os riscos ambientais e sociais a que o mundo está exposto.

“Se a gente continuar fazendo as coisas do jeito que fazemos, não é que a gente corre riscos de um futuro muito pior: é garantido que teremos um futuro drástico. E não para os meus netos, mas para os meus dois filhos”, diz ela, que tem 35 anos. “A pergunta que tenho me feito todos os dias é: estamos confortáveis em falhar, de forma contínua, perante o futuro?”

E continua: “O capital privado é o maior pool de capital disponível no mundo. Então, não só ele vai influenciar mercados e soluções, como vai determinar se a gente vai conseguir ou não fazer as coisas que a gente quer. E não tem bala de prata.” 

Ela sabe que só a filantropia não dará conta do enorme recado de moldar um futuro diferente, combatendo desigualdade e crise climática. Assim, quem adere ao movimento assume um segundo compromisso, de mobilizar o que ela chama de ‘policapital’ ou ‘cinto com ferramentas’. 

Policapital? 

Um deles é o capital econômico propriamente. “É investimento, empresas, para aqueles que ainda têm as empresas operantes, e filantropia.”

O segundo é o capital social. “Que é como a gente usa a nossa voz, o nosso posicionamento na mídia. E como que a gente consegue se conectar a redes e tentar mobilizar essas redes de uma forma muito deliberada.” 

O terceiro capital é o político, que contempla fazer advocacy e tentar influenciar as políticas públicas. 

O quarto e último capital do cinto de utilidades é o de carreira. “Muitas pessoas que vêm desse ambiente [de famílias de elevado patrimônio] têm uma educação fantástica, mas não direcionam para impacto. Então, como você usa os seus hard skills e também os seus soft skills para tentar mobilizar as suas próprias carreiras [a favor do impacto positivo]?”, questiona ela.

Feffer diz que cabe a cada família em posição de privilégio identificar como quer atuar.

Ela identifica três perfis básicos de famílias. “Um perfil é o que chamo de lead market. Pessoas que vão olhar para diferentes mercados emergentes e soluções importantes e vão escolher um ou alguns para tentar tirar do papel e fazer com que se tornem mercados consolidados.”

Ela cita energia, sistemas alimentares, biodiversidade, cidades, transporte urbano como exemplos de setores que precisam ser impulsionados. 

“O segundo perfil é o que chamo de fast follower. São pessoas que talvez sejam menos arrojadas, mas que precisam estar conectadas ao que está acontecendo para aprender e não perder o bonde e que, quando encontram algumas oportunidades, se plugam e jogam o jogo.”

Por último, diz, há aqueles que acham que impacto e clima são uma subcategoria de investimento e optam por não fazer nada a respeito agora. 

“Mas, na verdade, não existe uma neutralidade [perante os desafios que existem]. Se a pessoa escolhe não fazer, ela está fazendo. Está gerando externalidades negativas. Especialmente em clima, muitas vezes a gente ainda lida como se fosse uma ficção. Eu não consigo nem muito entender como a gente tem essa defasagem intelectual.”

Marina Feffer conta que, desde muito nova, sentia um interesse genuíno pelos outros e que buscou a formação em psicologia para canalizar o que entendia ser sua vocação. Cresceu desconectada da realidade de herdeira e, até certo ponto, mantendo uma distância intencional. 

Até que experimentou uma espécie de ‘revelação’ que a levou a trilhar o caminho atual. 

Tinha 23 anos quando, junto da irmã Gabriela, estava estudando o que significava se tornar uma futura acionista. “Naquele momento eu percebi que ser de uma família com patrimônio elevado era talvez a maior alavanca que eu tinha, era talvez a maior plataforma que eu tinha e eu estava completamente desconectada desse universo. Então, fui estudar, fui trabalhar no mundo corporativo e foi isso o que me levou para trabalhar com famílias de alto capital”, conta. 

Banco do bem?

Além de obter o compromisso dos herdeiros, o Generation Pledge busca apoiá-los no planejamento e execução. Para isso, este ano foi criado um instituto para oferecer educação e consultoria de impacto para as famílias e também para os profissionais que as apoiam e que, na maioria das vezes, não têm informação a respeito. 

Para o futuro, Feffer revela planos ainda mais ambiciosos. “Em uns três anos queremos começar um banco privado para realmente poder apoiar as famílias, os indivíduos, na montagem dos portfólios de impacto sem greenwashing.”