Uma nova gestora de fundos de private equity acaba de abrir as portas na Faria Lima, em São Paulo, com uma tese ainda rara: impulsionar a descarbonização dos negócios em que investe.
O investimento de estreia da W Capital, fechado na semana passada, ilustra como a ideia vai funcionar na prática. A gestora aportou R$ 65 milhões na holding Better Drinks, que tem um portfólio de bebidas como a cerveja Praya, numa estrutura do tipo mezanino, que mistura características de dívida e de capital.
O aporte, voltado a financiar a aceleração das vendas, é atrelado a metas de redução das emissões de gases de efeito estufa e de eletrificação da frota de distribuição das bebidas da Better Drinks.
“Caso as metas não sejam cumpridas, a empresa terá uma penalidade financeira, em que ela tem que pagar um juro mais alto na dívida”, diz o fundador da gestora, Gui Waetge, um advogado que migrou para o mercado financeiro, com passagens por Pinheiro Neto, Moelis e Bela Vista Investimentos.
A penalidade é de 1% sobre o valor da dívida, mas os recursos não engordam o retorno dos investidores e nem a remuneração da gestora: são usados para comprar offsets de carbono e compensar as emissões que deixaram de ser abatidas.
“Todo mundo fala em ESG no mercado, mas ninguém se compromete com nada. Tentamos criar algo que pudesse ser medido, que fosse obrigatório e universal, para ser aplicado ao portfólio inteiro”, diz Waetge.
O chamado ‘step up’ de taxa de juro é um mecanismo que tem sido usado em emissões de bônus e empréstimos bancários atrelados a metas de sustentabilidade, inclusive no Brasil, mas o uso na estrutura de remuneração de um fundo é novidade por aqui.
O aporte na Better Drinks foi fechado antes que as metas fossem definidas – embora a existência delas esteja prevista no contrato de investimento. Segundo Waetge, a consultoria WayCarbon, especializada no assunto, está fazendo a auditoria das emissões da cadeia de valor da empresa e vai ajudar no plano de descarbonização da frota de distribuição, que terá metas anuais. Como a frota é terceirizada, a holding de bebidas terá que trabalhar junto aos prestadores de serviço para que a eletrificação aconteça.
Para que a tese da W Capital faça sentido, nos demais investimentos a gestora também vai olhar para segmentos em que o ‘capim é alto’, ou seja, com pegada de carbono significativa. “Provavelmente, nosso portfólio vai ser composto por empresas que transacionam mercadorias, e não pelos setores de serviços.”
O foco da gestora é o chamado middle market; empresas com faturamento entre R$ 100 milhões e R$ 300 milhões, para cheques de R$ 50 milhões a R$ 100 milhões. “Nós não disputamos com as gestoras grandes de private equity, que miram empresas maiores.”
One deal, one fund
A W Capital começou num esquema ‘um fundo, uma transação’. Os R$ 65 milhões foram captados com três investidores institucionais brasileiros, entre fundos de fundos e fundos hedge, e 100% aplicados na holding de bebidas.
O próximo passo, diz Waetge, é captar um segundo nos mesmos moldes para só então levantar um fundo maior para investir em vários negócios. A meta é atrair recursos de organismos multilaterais, como IFC e BID, que têm orçamento carimbado para investimentos climáticos, mas que, por regra, não podem aplicar em fundos estreantes.
No mercado local, a tese climática não fez qualquer diferença na captação, admite Waetge. Os investidores foram atraídos pelo potencial de alto retorno com risco controlado, proporcionados pelo engenhoso desenho financeiro.
Waetge explica que não existe limite para a rentabilidade máxima, que é atrelada à valorização do capital (equity) da empresa, ao mesmo tempo em que existe uma garantia de retorno mínimo, graças a uma estrutura de garantias que é acionada caso o crescimento da empresa decepcione.
“Com isso conseguimos uma dispersão de retorno menor do que fundos de private equity, em que você tem negócios com ganhos astronômicos e outros com perda total.” Segundo ele, a expectativa é obter uma rentabilidade entre 25% e 40% ao ano, em reais.
Antes de fundar a W Capital, Waetge passou os últimos quatro anos como sócio da gestora de private equity Bela Vista Investimentos. A ideia de abrir a própria casa com uma tese ligada à sustentabilidade veio da constatação de que as principais tendências no mercado de consumo estão ligadas a questões como rastreabilidade da cadeia e saudabilidade.
“Claramente é uma mudança de mentalidade e acredito que, assim como as pessoas estão mudando a forma como consomem, em algum ponto também vão querer investir assim.”
A ideia inicial foi abrir uma gestora com produtos ESG, mas, depois de ouvir críticas sobre a ausência de compromissos concretos no mercado financeiro, optou por começar pela pegada de carbono.
“Agora tenho ouvido críticas de que o carbono pode ser pouco. Mas a tese da W Capital vai evoluir ao longo do tempo. O fato é que hoje considero que estamos na vanguarda.”