Os Estados Unidos e a União Europeia estudam fazer uma espécie de consórcio internacional para taxar aço e alumínio produzidos com mais intensidade de carbono e, ao mesmo tempo, promover incentivos para aqueles produzidos com técnicas com menos emissões de gases de efeito estufa.
Ainda em fase inicial de negociações entre as duas economias, trata-se de mais um movimento na direção de um comércio internacional pautado por restrições a produtos considerados mais poluentes — e vem num momento em que os Estados Unidos estão adotando estímulos mais agressivos para incentivar a economia verde no país.
O mecanismo, conhecido como “ajuste de fronteira”, já vem sendo adotado pela União Europeia.
O bloco anunciou no ano passado uma taxa de carbono que deve incidir sobre produtos importados – a princípio aço, alumínio, fertilizantes e cimento — de países que não tenham rigor para enfrentar as mudanças climáticas.
Nesta semana, os europeus também aprovaram uma regra que visa banir a importação de commodities que tenham sido originadas em áreas desmatadas a partir de 31 de dezembro de 2020 ao redor de todo o globo.
É a primeira vez, no entanto, que os Estados Unidos consideram uma tarifa sobre importação que leve em conta a questão climática, no que marca uma nova abordagem da maior economia do mundo em relação a sua política comercial.
A taxação das importações deve provocar uma ampla discussão sobre protecionismo e até que ponto os países emergentes devem pagar a conta frente aos desenvolvidos — cuja economia cresceu em grande medida às custas de energia suja.
Clube dos verdes
As restrições miram principalmente a China, apesar de o país não ser citado diretamente no documento.
Segundo o New York Times, que teve acesso a documentos preliminares nos quais diplomatas europeus e americanos vêm trabalhando, a ideia é fazer um acordo em que os países-membros concordariam em impor de forma conjunta uma série de tarifas contra metais produzidos de forma prejudicial ao meio ambiente.
A proposta é de um sistema de tarifas progressivas, que começam em zero para os produtos mais ‘limpos’ dos países membros, e aumentam de acordo com o carbono emitido na produção dos tipos de aço ou alumínio. Sobretaxas adicionais seriam aplicadas a produtos vindos de países de fora do consórcio.
O documento afirma que os países que quiserem fazer parte precisam assegurar que o aço e o alumínio são produzidos de acordo com certos padrões de emissões, se comprometer a não produzir os metais em “excesso” para puxar os preços para baixo e a limitar a atividade de empresas estatais – vistas como uma forma de “exportar” subsídios. Tudo aponta para as práticas do país asiático.
Os Estados Unidos, por sua vez, têm uma produção siderúrgica muito baseada no reaproveitamento de sucata, o que garante uma pegada de carbono menor para o aço produzido no país.
Não se sabe também quais seriam os critérios para admitir os países dentro do consórcio comercial. Segundo a Bloomberg, que ouviu fontes diplomáticas americanas e europeias, outros países mostraram interesse em se juntar às conversas, mas provavelmente o novo acordo não vai incluí-las num primeiro momento.
Racha entre europeus e americanos
As negociações em relação ao comércio de aço e alumínio mais limpo vem num momento em que as duas economias estão em atrito por conta do Inflation Reduction Act, de Joe Biden, que inclui um pacote de US$ 370 bilhões em subsídios para atividades mais sustentáveis.
Alguns especialistas já começam a falar em guerra comercial entre União Europeia e Estados Unidos.
No centro do debate estão subsídios a veículos elétricos e baterias fabricadas no país. Bruxelas teme que o pacote provoque uma fuga de empresas do continente em busca de incentivos em território americano.
Em visita a Joe Biden, no começo do mês, o presidente francês Emmanuel Macron alertou que qualquer desequilíbrio causado pela lei – junto com o Chips Act, voltado para impulsionar a indústria de semicondutores americana – pode trazer rusgas entre os aliados.
Na semana passada, Ursula von der Leyen, presidente do braço executivo da União Europeia, disse que o bloco poderia retaliar com subsídios próprios para evitar a perda de empregos.
A fabricante de baterias para veículos elétricos sueca Northvolt, por exemplo, já disse que vai usar um subsídio do pacote americano para realocar parte da sua produção para os Estados Unidos.
Bruxelas teme que o pacote dê às companhias americanas uma vantagem injusta e provoque uma fuga de empresas do continente em busca de incentivos.
À Bloomberg, uma fonte da diplomacia americana afirmou que é pouco provável que essa tensão afete as negociações sobre o consórcio internacional.
Nos Estados Unidos, se por um lado o acordo pode agradar as siderúrgicas e ambientalistas, deve enfrentar resistência de grupos que defendem o comércio livre e que esperavam que a administração de Biden rompesse com o protecionismo que marcou a era Trump.
Em vez de desmontar a sobretaxa do aço e do alumínio chinês que Trump introduziu em 2018, na prática, o esforço o reposicionaria com um novo sistema baseado em preocupações ambientais.