Os investimentos em negócios de impacto feitos no Brasil somaram pelo menos R$ 1 bilhão em 2020, segundo uma pesquisa divulgada ontem pela Aspen Networks Development Entrepreneurs (Ande).
Dos 47 gestores que responderam ao levantamento, 38 tinham ativos sob gestão destinados a negócios brasileiros de impacto naquele ano. Somados, eles totalizaram R$ 4,4 bilhões em ativos sob gestão.
A expectativa era de um aumento significativo nos recursos captados em 2021, chegando a um total sob gestão de R$ 6,1 bilhões, ou um crescimento de 38%.
Como os dados foram apurados no segundo semestre do ano passado, a entidade acredita que o total deva ter sido alcançado.
A sinalização do interesse crescente por essa modalidade de investimentos é uma ótima notícia para o setor, segundo o relatório que detalha a pesquisa.
O entendimento do que é – e do que não é – investimento de impacto ainda está evoluindo no mundo e também no Brasil. Mas todos os sinais apurados pelo levantamento são positivos, diz Cecília Zanotti, responsável pelo capítulo brasileiro da Ande.
“Vemos um aumento consistente nos valores investidos e no número de transações”, afirma ela.
Por sua própria metodologia, a pesquisa não pretende ser um retrato completo do segmento, mas sim uma indicação de para onde sopram os ventos.
As respostas foram voluntárias (202 gestores foram convidados a responder), e os valores destinados ao microcrédito foram segregados para evitar uma figura distorcida.
Se considerados também esses “outliers”, os números seriam multiplicados várias vezes: R$ 13,1 bilhões em investimentos feitos no ano e R$ 11,5 bilhões em ativos sob gestão (alguns gestores têm mais de um ciclo de empréstimos por ano, o que explica mais deals que ativos).
Passando a régua
Um dos avanços observados pela Ande foi o aumento das medições de impacto por parte dos investidores brasileiros. Na versão anterior do levantamento, somente pouco mais da metade deles fazia esse tipo de mensuração. Em 2020, a proporção atingiu três quartos.
No exterior, esse acompanhamento minucioso é prática de nove entre dez gestores.
Um dos motivos é a complexidade – e a multiplicidade – das métricas de avaliação. À pergunta sobre as ferramentas utilizadas para medir impacto, 59% responderam usar metodologias próprias ou menos conhecidas que padrões de renome, como IRIS+ ou B Impact Assessment.
Essa baixa adoção de sistemas padronizados, aponta o estudo, tem a ver com o processo de amadurecimento dos gestores e também com os custos.
A questão das métricas também apareceu em uma das áreas definidas como prioritárias pela Ande e que foi uma das novidades da pesquisa de 2020: igualdade de gênero e diversidade.
A maioria dos que responderam à pesquisa não coleta ou não tem acesso a dados relativos à composição dos conselhos de administração ou da alta gestão de suas investidas.
Com as informações disponíveis, fica claro que ainda há um longo caminho pela frente: somente 2 entre 53 conselheiros e 18 de 124 líderes são negros.
A disparidade é um pouco menos gritante no que diz respeito às mulheres: 19 conselheiras de um total de 84, e 40 líderes entre 182.
Filtros de equidade racial ou de gênero também são raros nas políticas de investimentos: 55% dos gestores não levam essa informação em conta em suas análises.
Outra novidade no novo levantamento foi a questão ambiental. A Ande perguntou se os gestores acompanham os riscos da mudança climática, contabilizando, por exemplo, as emissões de seus portfólios.
Dos investidores sediados no Brasil, somente um em cada 10 faz essa gestão, de acordo com o levantamento. Como no caso das medições, essa é uma preocupação mais presente entre os baseados no exterior.
Apesar disso, as empresas de tecnologias verdes receberam a maior parte dos recursos aportados (43%), seguidas por saúde (15%), finanças (12%) e cidades inteligentes (8%).
Mais bolsos
Acessar mais fontes de recursos é um dos desafios para fazer crescer o segmento dos investimentos de impacto no Brasil. Sete em cada 10 investidores no país são indivíduos de alto patrimônio.
Comparando os dados do país com a média mundial, apurada pela Global Impact Investing Network (GIIN), algumas diferenças saltam aos olhos.
Globalmente, 60% dos gestores recebem algum dinheiro de fundações, contra apenas 22% dos brasileiros. A diferença também aparece quando se trata de fundos de pensão (38% ante 8%) e seguradoras (25% contra 0).
Em parte, trata-se de uma evolução natural, diz Fernanda Camargo, CEO e fundadora da Wright Capital, uma gestora de fortunas familiares que nasceu pensando em impacto.
“A primeira coisa é educar as pessoas, explicar que são investimentos de longo prazo, dizer que a gente acredita num impacto que pode atingir milhões de pessoas, mas que vai demorar para mostrar isso”, afirma Camargo.
A Wright Capital exige que 1% dos recursos de seus clientes sejam destinados a impacto. O que era uma novidade sete anos atrás hoje é mais bem compreendido, diz a gestora. “Já vimos uma grande mudança dos nossos clientes e também do mercado.”