Um banco que não visa o lucro em primeiro lugar? Sim, temos.
Criado no fim do ano passado, o brasileiro Impact Bank chegou ao mercado com a mensagem de que quer dividir os ganhos de seus produtos e serviços com os clientes.
O modelo tem semelhanças com o inglês Charity Bank e o americano Good Money, que pregam o conceito de ‘bancos do bem’ e visam uma clientela cada vez mais preocupada com os caminhos percorridos por seu dinheiro.
“Somos uma empresa com fins lucrativos. Mas o conceito é ter uma margem menor do que bancos convencionais. Antes do lucro, o foco é o impacto em primeiro lugar”, diz o CEO Gabriel Ribenboim.
Biólogo por formação, antes de fundar o Impact Bank, Ribenboim vinha se dedicando a prestar serviços de captação e gestão de recursos para ONGs por meio da Welight, empresa da qual é CEO. Ao conhecer a rotina das ONGs de perto é que surgiu a ideia de criar um banco que azeitasse os processos financeiros dessas entidades.
“Percebemos que, no trabalho das ONGs de repasse de doações, um tanto do dinheiro fica no meio do caminho, nos intermediários financeiros que processam remessas internacionais, pagamentos, boletos e cartões. Pensamos que precisávamos de eficiência para captar melhor e entregar mais dinheiro para quem de fato está fazendo a diferença”, diz Ribenboim.
Nas suas contas, algumas ONGs chegam a desembolsar R$ 75 mil por mês em tarifas. “Ninguém está olhando para as necessidades do terceiro setor, nenhuma fintech, nenhum banco. E é um setor chave para alavancar impacto e trabalhar com problemas significativos da humanidade.”
Durante a fase de planejamento, ficou claro que, já que iriam criar uma instituição financeira diferente do zero, havia também outros dois nichos a serem contemplados: negócios de impacto e indivíduos que buscam uma relação bancária que ele chama de mais justa.
A engrenagem
Para distribuir lucro e entregar o impacto a que se propõe, o banco se apoia em dois pilares.
Um é um fundo para o qual é destinada parte da receita com operações com cartão de crédito feitas nas maquininhas do Impact Bank. São doados ao fundo R$ 0,10 por transação. Com os recursos, o Fundo de Transformação apoia iniciativas com foco nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, da ONU.
O segundo pilar é o que Ribenboim chama de “arranjos financeiros inclusivos” — e é nele que o impacto deixa de ser uma ação filantrópica e passa a integrar a forma como o Impact Bank se propõe a operar seu negócio.
Nesse pilar, a ideia é que, na relação com ONGs ou negócios sociais ou de impacto, o banco consiga reduzir o custo de operação financeira para esses clientes. Ou gerar novas receitas.
“A gente acredita que consegue reduzir esse custo ao criar um ecossistema dentro do mesmo arranjo, colocando, de ponta a ponta, todo mundo dentro do Impact Bank”, diz.
Ele exemplifica com o caso hipotético de uma ONG: o Impact Bank processaria desde a remessa de recursos de um doador externo para o Brasil, abriria a conta-mãe dessa ONG, teria como correntistas os beneficiários dos programas dessa entidade e também os fornecedores dela.
“Estamos plugados, por exemplo, com fintechs que fazem câmbio mais barato e rápido para trazer o dinheiro de fora. Assim, a cada dólar, chegam mais reais aqui”, diz ele.
Ao trazer para dentro do banco todo o seu ecossistema, a ONG passa a receber rebates sobre as tarifas cobradas nas operações.
Ribenboim diz que há outra vantagem em concentrar todos os agentes conectados à ONG dentro do mesmo ecossistema.
“É possível fazer um acompanhamento via blockchain que garante que o dinheiro chega onde deveria chegar. O sistema tem ‘flags’ antifraude. É um conforto para o financiador e para a ONG.”
Para negócios sociais e de impacto, a proposta é que as empresas troquem a maquininha de cartão tradicional por uma do Impact Bank, “que apoia causas importantes”, uma vez que parte da taxa é doada ao fundo filantrópico já mencionado.
Além das ONGs
Com uma proposta de valor clara para ONG e projetos filantrópicos, o Impact Bank tem planos também de oferecer taxas mais baixas para pequenos, médios e grandes negócios — onde a concorrência é muito mais acirrada, tanto por parte de bancos quanto de outras fintechs.
A receita é simples: oferecer taxas justas e sem pegadinhas.
Hoje, no Impact Bank, na tarifa chamada de ‘mar aberto’, para aquele cliente que chega pelo site sem fazer uma negociação específica, é cobrada taxa de 1,99% sobre as operações de débito e 2,65% no crédito.
“Isso é a taxa total, sem asteriscos no contrato. Ela é abaixo ou muito próxima da de mercado. Nas pesquisas que fizemos, percebemos que ninguém sabe as taxas de verdade. Não é raro um empreendedor fechar um acordo de 2% que dura dois meses e, de repente, a taxa pular para 5%.”
Para microempreendedores, a ideia é criar soluções para gerar receita nova, viabilizando a oferta de serviços bancários por meio da maquininha, como crédito para parcelamento das compras e recarga de celular — e com isso receber rebates do banco.
Há também conversas com empresas maiores para que comecem a usar o Impact Bank como arranjo de pagamento de fornecedores e funcionários. “A ideia é que entrem nessa trilha de uma ressignificação da circulação do dinheiro, gerando valores ambientais e sociais ao longo dessa circulação financeira.”
Banco só no nome
Apesar de ter nome de banco, o Impact Bank é uma empresa de arranjo de pagamentos, com algumas limitações em relação a produtos e serviços que pode ofertar.
O negócio é uma joint venture da Welight com a Digital Bank. A primeira é uma organização que trabalha fazendo a conexão entre fundos de filantropia, empresas e doadores com organizações do terceiro setor. Faz captação do dinheiro, a gestão de recursos, o acompanhamento da destinação e avaliação dos impactos.
Já a segunda é uma empresa de ‘bank as service’. Com sócios egressos de instituições como Itaú e Safra, é quem aporta a inteligência bancária à empreitada. “Nós somos loucos, mas nem tanto”, diverte-se Ribenboim.
Na fase pré-operacional, a equipe apresentou o projeto para gente do mercado financeiro e para pessoas envolvidas com negócios ESG para colher feedbacks e fazer ajustes. “O projeto parece sólido e bem intencionado”, comenta um gestor de recursos.
Toda a estruturação jurídica do negócio está a cargo do Tozzini Freire, sob os cuidados do sócio Alexei Bonamin.
O negócio começou com capital semente de uma holding chamada Booma Dream, que desenvolve ‘negócios regenerativos’, da qual Ribenboim faz parte com outros nove investidores.
“Fizemos a opção de lançar o negócio e começar a demonstrar esse potencial de receita para depois sair para nova rodada de captação”, diz ele, completando que há conversas iniciais com ao menos dois fundos de impacto.
Ele conta que o projeto já estava no forno quando os sócios ouviram falar do americano Good Money, que tem um modelo parecido, de subsídios cruzados. Mas o Good Money ainda vai além e distribui parte de suas ações aos clientes.
O Impact Bank também pretende transformar clientes em acionistas? A legislação brasileira não permite, mas Ribenboim deixa no ar a possibilidade de caminhar para isso, caso algo mude nesse front.