Pioneiro na indústria de venture capital e considerado o papa dos investimentos de impacto, Sir Ronald Cohen acredita que o mercado financeiro está diante de uma oportunidade única.
“Temos hoje uma oportunidade histórica para trazer o impacto para o centro do nosso sistema econômico. E para fazer isso precisamos medir esse impacto”, disse hoje a uma plateia virtual de mais de 500 pessoas no evento Impacta Mais ON.
Ele cobrou urgência e defendeu que os governos passem a exigir que as empresas comecem a divulgar os impactos sociais e ambientais das suas operações num prazo de até dois anos.
Para Cohen — que nos anos 1970 fundou a Apex Partners, uma das maiores firmas europeias de venture capital e private equity —, a situação atual é similar ao crash da bolsa de valores de 1929.
Naquela época, depois do colapso dos mercados, o governo tomou a dianteira e organizou esforços para exigir uma padronização na mensuração dos resultados financeiros, além de passar a exigir auditorias externas.
“Os investidores se deram conta que vinham investindo até então sem saber qual era efetivamente o lucro ou o prejuízo das empresas”, disse.
“A covid nos trouxe uma escolha parecida. Desta vez, os investidores que já alocam US$ 33 trilhões em estratégias ESG é que se perguntam: estamos mesmo investindo em companhias baseados somente no lucro, sem medir o impacto que elas criam?”
Sir Ronald faz outra comparação com a década de 1930. Na ocasião, houve dois caminhos: o dos governos populistas, que criaram divisão social, e o do New Deal, seguido pelos Estados Unidos e alguns países europeus.
“Estamos numa bifurcação parecida. Se optarmos pelo caminho do New Deal, uma parte importante é medir o impacto e trazer o sistema econômico, que hoje cria os problemas, para criar as soluções.”
Avanços na mensuração
Cohen afirma que, como aconteceu no processo de convergência contábil após 1930, o processo de padronização será longo.
“Vamos encontrar desafios, superá-los, refinar o sistema e em alguns décadas — ou até antes disso — teremos um sistema sofisticado de métricas”, pontuou.
Mas já foram dados os primeiros passos.
Numa das iniciativas mais promissoras de padronização, a Harvard Business School vem desenvolvendo métricas de contabilidade financeira que levem em consideração o impacto. O grupo acaba de publicar um estudo fazendo uma avaliação inicial do impacto ambiental de 2500 empresas mundiais.
A iniciativa, batizada de Impact Weighted Accounts Initiative, tem o apoio da Global Steering Group for Impact Investing (GSG), organização que reúne 32 países e é presidida por Cohen. O Brasil é representado na GSG pela Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, dirigida pelo Instituto de Cidadania Empresarial (ICE).
“Empresas como Exxon Mobil criam US$ 38 bilhões por ano em danos ambientais, a Shell cria cerca de US$ 22 bilhões por ano”, diz ele. “Esses não são números que todos deveríamos saber quanto tomamos decisões de investimento ou quando decidimos nos juntar a essas companhias?”
Coronavírus e o Brasil
Na avaliação de Sir Ronald, o investimento de impacto terá um grande papel na recuperação pós-covid, já que os governos estarão muito endividados.
Para as questões mais urgentes, ele reforçou a importância de se manter o capital filantrópico na ajuda aos mais vulneráveis. “Não podemos cortar os capitais filantrópicos que estão sendo alocados para eles — e esses capitais estão sendo cortados.”
Ele reforçou ainda o uso de instrumentos como contratos de impacto social (os ‘social impact bonds’), com remunerações atreladas aos resultados sociais trazidos pelas iniciativas em financiamentos.
“Temos fundos de bilhões de dólares começando na África e na Índia, mas deveria haver um no Brasil também”, diz.
Aqui, pondera, temos uma grande vantagem estratégica em relação a outros países com problemas parecidos: grandes bancos, com grandes fundações, que podem entrar no lugar do governo como pagadoras desses títulos.
“Na minha última visita ao Brasil, fiquei impressionado ao falar com os líderes dos grandes bancos pelo desejo deles de ajudar o país diretamente”, disse.
Cohen é um dos criadores do Social Finance, primeira instituição a emitir contratos de impacto social, trazendo capital privado para ajudar a reduzir a reincidência entre a população carcerária na Inglaterra.
Ele deixou a Apex Partners no começo dos anos 2000 e passou a se dedicar ao então nascente movimento de investimentos de impacto. Começou assessorando o tesouro britânico a trazer a iniciativa privada para combater questões sociais e desde então esteve na gênese de diversas iniciativas globais.