Por que a Suzano investiu R$ 22 bilhões em nova fábrica baixo carbono

Maior linha única de produção de celulose do mundo, planta troca combustíveis fósseis por biomassa e está integrada a plano de conservação da biodiversidade

Projeto Cerrado, da Suzano
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O maior investimento nos mais de cem anos de história da Suzano acaba de entrar em operação a  100 quilômetros de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

O Projeto Cerrado levou R$ 22,2 bilhões em investimentos e três anos para ser construído na cidade de Ribas do Rio Pardo. A fábrica, maior linha única de produção de celulose do mundo, promete combinar novas tecnologias com descarbonização e preservação da biodiversidade.

No auge da operação, a planta vai produzir 2,55 milhões de toneladas anuais de celulose – o que representa um aumento de 20% da capacidade da empresa, de 10,9 milhões de toneladas ao ano para 13,45 milhões. 

A nova unidade também coloca a Suzano, que faturou R$ 39,8 bilhões ano passado, como uma das poucas empresas do setor ao redor do mundo a usar a tecnologia de gaseificação de biomassa, que transforma resíduos orgânicos em gás e permite a substituição de combustíveis fósseis nos fornos de cal. 

O óleo combustível e o gás natural que alimentam os fornos de cal e as caldeiras correspondem por cerca de 70% das emissões diretas de uma fábrica de celulose, diz Fernando Bertolucci, vice-presidente executivo de sustentabilidade e inovação da Suzano. 

“No momento em que conseguimos substituir esses combustíveis fósseis por combustíveis que vêm da madeira, o nível tecnológico da nossa fábrica se torna realmente o estado da arte”, afirma.

As fontes fósseis não serão eliminadas totalmente, mas ficarão restritas a usos eventuais, como retomadas de produção. A meta da companhia é reduzir a intensidade de emissões de gases de efeito estufa em 15% até 2030 para as emissões diretas (escopo 1) e ligadas a energia (escopo 2), tendo 2015 como ano de referência.

A fábrica será autossuficiente em energia elétrica, também gerada com biomassa. A tecnologia já existe em outras unidades, mas o Projeto Cerrado terá um excedente de 180 MW para vender ao Sistema Interligado Nacional (SIN), eletricidade suficiente para abastecer uma cidade com mais de 2 milhões de habitantes.

Nos arredores da fábrica, a empresa vai dar mais um passo em direção à meta de conectar 500 mil hectares de biomas fragmentados pelo Brasil – 130 mil deles no Cerrado. Para isso, a Suzano também recebeu um empréstimo atribuído a práticas sustentáveis (Sustainability Linked Loan) do International Finance Corporation (IFC), do Grupo Banco Mundial, para unir 35 mil hectares. 

Transição energética

Principais emissores durante o processo de fabricação da Suzano, os fornos de cal e as caldeiras de recuperação de químicos receberam atenção especial nesse projeto. 

Os fornos de cal serão alimentados pelo gás gerado a partir da biomassa de árvores plantadas pela própria empresa. Bertolucci diz que a estratégia foi “muito audaciosa”, mas não revela o valor do investimento na tecnologia. 

Dos R$ 22,2 bilhões investidos, R$15,9 bilhões se referem à parte industrial e R$ 6,3 bilhões, a recursos para atividades florestais e logísticas, por exemplo.

Já as caldeiras serão alimentadas pela lignina. “Na fibra celular, é como se a celulose fosse o tijolo e a lignina, o cimento”, explica o executivo. A molécula é então queimada nas caldeiras e produz o vapor que é capturado e usado para a geração de energia. 

“O que é peculiar neste projeto é que, dado seu tamanho e a tecnologia muito eficiente no uso da lignina, precisamos de menos bioenergia para manter a fábrica. Consequentemente, sobra muita energia para vender para o grid”. 

Mosaico florestal

Matéria-prima da Suzano, as árvores estarão próximas à fábrica – e vão compor uma paisagem mista, com florestas de eucalipto e de pequis, barus, copaíbas, carobinhas e outras vegetações nativas do bioma. 

O mosaico construído pela empresa deve reunir a proporção usada normalmente, de 60% para fins comerciais e outros 40% para preservação, entre áreas de preservação permanente, áreas de reserva legal e os corredores ecológicos, segundo Bertolucci .

A madeira vai percorrer cerca de 65 quilômetros entre a floresta e a fábrica. Metade da logística de transporte será feita por hexatrens, uma espécie de semireboques desenvolvidos pela Suzano para transportar 200 toneladas de madeira de uma única vez. 

Em todo o Mato Grosso do Sul, a base florestal da Suzano passará para 599 mil hectares, dos quais 143 mil serão destinados exclusivamente para a preservação da biodiversidade. São mais de R$ 85 milhões voltados para as unidades de conservação do Estado, informa a companhia.

Os rio-pardenses

No auge da construção, a empresa contratou quase 10 mil pessoas para levantar o empreendimento. “Na operação, vamos empregar 3 mil, sendo que 83% estamos contratando na região de Ribas do Rio Pardo”, afirma Bertolucci. 

“29% da população daquela região vive em situação de pobreza ou extrema pobreza. (…) Nós temos a meta de retirar 200 mil pessoas da linha da pobreza nas áreas em que atuamos e em Ribas do Rio Pardo, já o fizemos com 9 mil”. 

A empresa está investindo mais de R$ 300 milhões em infraestrutura e projetos sociais na região, diz o executivo, e está firmando parcerias para o desenvolvimento e o treinamento de profissionais a serem contratados e de fornecedores. 

O Projeto Cerrado deve levar nove meses para atingir sua capacidade máxima de  produção. “O principal impacto na geração de caixa vai ser com a celulose que, provavelmente, será exportada para todos os continentes”, diz Bertolucci.