Em meio à dificuldade de se verificar a credibilidade dos compromissos de net zero, investidores globais com US$ 40 tri sob gestão criaram um sistema que permite avaliar se as metas climáticas de empresas de dez dos setores mais intensivos em carbono estão entregando a sua parte para conter o aquecimento global.
No frigir dos ovos, a metodologia permite que investidores e gestores de ativos avaliem o alinhamentos dos seus portfólios ao Acordo de Paris e deve se converter num instrumento de engajamento e pressão sobre as investidas.
O framework foi desenvolvido ao longo dos últimos anos pela Transition Pathway Initiative (TPI), que reúne 120 investidores, entre fundos de pensão e gestores de ativos, como Pimco, Allianz, UBS, HSBC e Calpers.
Agora, o grupo reuniu seus aprendizados num relatório divulgado ontem, dando transparência para que outros investidores possam aplicar sua metodologia.
Os setores contemplados até agora são óleo e gás, cimento, eletricidade, aço, automóveis, aviação, mineração, mineração de carvão, alumínio, papel e celulose e navegação – e outros como bancário e alimentos serão lançados até o fim do ano.
São levados em conta três cenários possíveis de emissões, sendo os dois primeiros alinhados ao Acordo de Paris: o mais ambicioso limita o aumento da temperatura global a 1,5º C até 2050; o intermediário mantém o aquecimento global abaixo de 2 ºC; e o mais leniente leva em conta os compromissos de descarbonização assumidos pelos países até agora – e que, como se sabe, são insuficientes para cumprir o Acordo de Paris.
Em linhas gerais, o que o TPI fez foi desenhar, para cada um dos setores, três curvas (uma para cada cenário de temperatura) com os benchmarks esperados de intensidade de emissões de CO2, ano a ano, até 2050.
Em cada setor, a intensidade das emissões é calculada segundo métrica que faz sentido para aquela atividade específica (exemplo: no setor automobilístico são gramas de CO2 emitidas por quilômetro rodado), o que permite a comparação entre empresas.
“Em um mundo onde nos deparamos com múltiplas interpretações sobre o que deve ser a transição de baixo carbono (muitas vezes com a intenção de desacelerar em vez de acelerar a taxa de mudança, e muitas vezes para defender ações menos ambiciosas por parte das empresas), é imperativo que nós investidores tomemos decisões com base em análises com credibilidade e rigor, explicitamente focadas nas metas de net zero”, disse Adam Matthew, que preside o conselho do TPI e lidera a área de investimentos responsáveis do fundo de pensão da Igreja da Inglaterra.
Ferramenta online
Além dessa metodologia setorial, o TPI criou uma ferramenta, totalmente gratuita e online, que avalia a performance de emissões de carbono de 479 das maiores empresas de capital aberto do mundo todo, com um valor de mercado de US$ 10 trilhões.
Entre elas, várias brasileiras, como Klabin, Petrobras, Suzano, Vale, Usiminas, Gerdau e Azul.
Baseada em dados públicos, a ferramenta avalia a qualidade da gestão que as empresas fazem das suas emissões – considerando critérios como medição e divulgação de suas emissões, existência de metas de descarbonização, avaliação de riscos e oportunidades da transição para uma economia de baixo carbono e remuneração dos executivos – e também se a performance das suas emissões de carbono atuais e futuras estão alinhadas a Paris.
No setor de papel e celulose, por exemplo, há 26 empresas avaliadas, sendo duas brasileiras. Em termos de qualidade da gestão de carbono, na escala de 0 a 4, a Suzano aparece no nível 3, enquanto Klabin está no nível 4 (quanto mais alta a nota, melhor).
Já em intensidade de carbono, ambas as empresas têm uma performance muito melhor que a média setorial e cumprem com folga as metas de Paris.
A Gerdau é outra brasileira que aparece alinhada a Paris, enquanto Azul, Petrobras e Vale, todas em setores bastante desafiadores para a descarbonização de suas atividades, estão aquém do desejável.
(Crédito da imagem: Diana Polekhina/Unsplash)