A BHP quer que a Vale seja responsável por “50% ou mais” das indenizações que podem advir de um processo movido inicialmente apenas contra a empresa anglo-australiana na corte de Londres por conta do rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, em 2015.
O processo é conduzido pelo escritório Pogust Goodhead (PG), que afirma ter 720 mil reclamantes e estar em busca de indenizações que podem chegar à casa das dezenas de bilhões de libras.
A ação foi movida em Londres porque lá fica a sede da anglo-australiana da BHP. A empresa, contudo, está pleiteando que a Vale seja incluída na ação, já que a Samarco era uma joint-venture entre as duas companhias, com participação de 50% de cada.
O processo corre em sigilo, mas documentos que se tornaram públicos nesta semana na fase de audiências mostram que a BHP defende que a Vale fique com mais da metade dos eventuais passivos que possam advir do processo.
Fontes envolvidas no processo afirmam que por trás do pedido está a alegação de que a mineradora brasileira estava envolvida diretamente no dia a dia da Samarco — e principalmente pelo fato de que a Vale também depositava rejeitos na barragem de Fundão, mesmo que isso não estivesse previsto no arranjo original.
A alegação tem por base uma denúncia apresentada pelo Ministério Público no Brasil em 2016, quando foram feitas 26 acusações contra as mineradoras e pessoas físicas, como engenheiros e peritos que avaliaram a segurança da barragem.
Segundo laudos técnicos apresentados, cerca de 27% dos rejeitos depositados na barragem entre 2008 e 2015 vinham das operações da Vale e da Samarco e eles foram determinantes para que a unidade ultrapasse os níveis de segurança de operação.
Procurada, a BHP não comentou. A Vale afirmou que trata-se de “questão discutida judicialmente e todos os esclarecimentos vêm sendo oportunamente apresentados no processo”.
Próximos passos
O processo faz parte de uma nova fronteira da agenda ambiental, ao acionar a justiça do país-sede de uma das controladoras para requerer as indenizações.
Foram necessários mais de cinco anos para se decidir se a corte londrina aceitaria ou não o caso – e o percurso ainda promete ser longo. Até outubro espera-se que a Justiça britânica informe se a Vale será adicionada ou não ao processo.
O julgamento da responsabilidade da BHP (e eventualmente da Vale) está previsto apenas para outubro do próximo ano.
Além da jurisprudência, outra discussão importante nesse caso é entender se haverá duplicidade em relação às indenizações já pagas no Brasil.
Por aqui, Samarco, Vale e BHP firmaram um Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC) em março de 2016 para encerrar processos que corriam na justiça. Por meio dele, foi acordada a criação da Fundação Renova, com a qual as três companhias se comprometeram a indenizar tanto danos ambientais quanto as pessoas afetadas pela tragédia.
Até março deste ano, cerca de R$ 28 bilhões tinham sido pagos. Para este ano, a previsão é de desembolsos de R$ 8 bilhões.
No TTAC, não há presunção de culpa pelas acusadas e a premissa é que o acordo encerre outras disputas judiciais.
Em junho, o juiz Michael Procópio Ribeiro Alves Avelar, da 4ª Vara Cível de Belo Horizonte, que concentra as decisões sobre o caso, solicitou que o Poogust Goodman fornecesse informações sobre honorários e a duplicidade na lista de clientes que já foram indenizados no Brasil.
“As indenizações produzidas pelo Sistema Indenizatório Simplificado geram quitação definitiva em favor das empresas e da Fundação Renova”, afirma o juiz na decisão.
A ‘paternidade’ da empresa – e a fatia de cada uma das sócias na responsabilidade pelo acidente – é uma discussão que permeia toda a discussão da Samarco desde o rompimento da barragem de Fundão.
Com dívidas de mais de R$ 50 bilhões, a Samarco está em recuperação judicial desde junho de 2021.
(Atualizada em 14 de julho às 13h55 para incluir o posicionamento da Vale.)