O primeiro fundo da gestora Circulate Capital destinado à América Latina acaba de encerrar sua captação. Focada em economia circular, a gestora levantou US$ 75,8 milhões para dar escala a iniciativas voltadas ao combate à poluição por plástico e à circularidade do material no Brasil, Colômbia e México.
O Latam Impact Fund, iAlumbra, Heading for Change e Sea Forward investiram os US$ 10 milhões finais e, assim, se juntaram aos investidores corporativos que entraram no lançamento do fundo, em 2023, entre eles Danone, Dow, Mondelēz, Unilever e Chevron Phillips Chemical, além de institucionais como o BID Lab e Builders Vision.
O fundo de private equity começou o desembolso e hoje tem participação em quatro empresas de reciclagem de plástico na América Latina, sendo uma no Brasil. Cada uma é focada na reciclagem de um tipo do material.
Com a entrada do dinheiro novo, a Circulate pretende agora adicionar ao seu portfólio companhias com atividades de coleta, um grande gargalo nos países emergentes. Dos US$ 75,8 milhões, 65% ainda então disponíveis para investimentos.
No Brasil, o investimento foi feito na recicladora Cirklo, que processa o plástico PET, com capacidade para 115 mil toneladas por ano. A EB Capital também tem uma fatia da empresa.
“Agora temos olhado muito para coleta. Se decidíssemos com as recicladoras aumentar a capacidade em algumas milhões de toneladas, a gente não conseguiria garantir [a oferta de material]”, diz Patricia Cordeiro, sócia recém-chegada à Circulate após quatro anos na GK Partners, que se fundiu com a americana Just Climate este ano.
O foco da gestora é principalmente no chamado “growth equity”, empresas que já têm um faturamento grande e são líderes nos seus segmentos. Como empresas de coleta seletiva costumam ser menos estruturadas, a Circulate considera a possibilidade de fazer investimento por meio de dívida.
Na Colômbia, os investimentos foram nas empresas Recyclapet e Pelyrec, enquanto no México é na Omnigreen.
A Circulate Capital foi lançada em 2018 para investir em soluções para a crise do plástico nos oceanos no sul e sudeste da Ásia, região que também têm baixos índices de reciclagem. Foram captados US$ 200 milhões para a região, investidos em 20 empresas.
Retorno
Para o investidor corporativo, como Unilever e Danone, o principal interesse em fazer o aporte é poder incorporar a reciclagem às suas metas de circularidade, diminuindo seu impacto ambiental. Ao financiar a reciclagem, reduzem sua “emissão” líquida de plásticos.
“É bem importante poder mantê-las dentro da estratégia para trazer insights. Quem é um bom reciclador, por exemplo? Como deveríamos avaliá-los? É um ecossistema de ganha-ganha”, diz Nataly Acosta, gerente de relações com investidores da Circulate.
Há, ainda, outros benefícios. Segundo a executiva, Ayalumbra prioriza o impacto sobre os oceanos, a Heading for Change olha para impacto social de comunidades vulneráveis e o BID quer acompanhar a implementação de frameworks ESG no fundo.
A entrada do BID como investidor-âncora ajudou na captação, mas Cordero reforça que o retorno previsto é de mercado, sem qualquer característica filantrópica ou de blended finance. Apesar do risco cambial da região, o fundo tem entregado um retorno de duplo dígito em dólar, como previsto, segundo a executiva – o fundo não divulga a rentabilidade.
O veículo tem um mecanismo de performance que define metas de impacto. A principal é a quantidade de produção de plástico a ser evitada: seis milhões de toneladas.
Para aumentar o volume de reciclagem, a gestora conta com a ajuda da regulação contra o material na América Latina. Chile e Colômbia são países que aprovaram recentemente limitações ao plástico de uso único. No Brasil, a expectativa é que um decreto da Presidência da República aumente o volume da obrigatoriedade de plástico reciclado na indústria para 30%.
A emissão de créditos de plástico, que funcionam como créditos de carbono e podem ser comercializados entre as partes para cumprimento de metas, não faz parte da estratégia. “Não adianta a gente atingir a meta financeira se a gente não tiver a meta de impacto, de toneladas de plásticos que a gente evita que vá para o oceano”, diz Cordeiro.
Uma estratégia de saída para os investimentos do fundo pode ser a venda de participação para grandes companhias – o mandato do fundo é de 10 anos. Na Índia, por exemplo, um dos primeiros veículos de investimento do tipo possibilitou a verticalização, com aquisição da recicladora Lucro pela Unilever Índia.
Análise ambiental
A escolha de empresas aptas para os investimentos envolve um trabalho não só de diligência financeira, mas também técnica e ambiental.
Como o investimento inicial foi em operações industriais de reciclagem, o risco de contaminação estava no radar, assim como as práticas de uso de água. Quando processos inadequados foram encontrados, o fundo abordou a empresa e orientou como fazer as mudanças.
Uma das certificações valorizadas pela Circulate Capital é, por exemplo, a Zero Pellet Loss. Ela comprova que determinada indústria da cadeia do plástico não está deixando escapar a matéria-prima, que poderia ir parar em canais d’água. Das quatro investidas do fundo para América Latina, duas têm o selo.
Para o futuro, a Circulate considera incorporar outros materiais em sua tese de investimentos, mas vê benefícios em conhecer o segmento do plástico. “Nosso diferencial é o foco. Ele permite um conhecimento grande sobre as empresas, que a gente possa ajudá-las, conectando-as e fazendo os melhores investimentos por conhecermos o setor”, diz Cordeiro.
*Atualizada às 12h45 para ajustar informação sobre o Latam Impact Fund e sobre o percentual de recursos ainda disponíveis para investimento do fundo.